Estudo sobre a distribuição das taxas de encarceramento nos estados brasileiros e principais variáveis associadas - Influências socioeconômicas e ideológicas (resenha): mudanças entre as edições

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
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NATASHA BACHINI PEREIRA &nbsp;é doutora em Sociologia pelo Iesp/Uerj, mestre pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais (PEPG<br>em Ciências Sociais) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP, Brasil) e graduada em ciências sociais pela PUC-SP.
NATASHA BACHINI PEREIRA &nbsp;é doutora em Sociologia pelo Iesp/Uerj, mestre pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais (PEPG<br>em Ciências Sociais) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP, Brasil) e graduada em ciências sociais pela PUC-SP.
== Resumo dos principais argumentos ==
== Resumo dos principais argumentos ==


O artigo parte de um diálogo com o trabalho de Jacobs e Carmichel (2021) para investigar que variáveis estão associadas ao encarceramento em massa nas unidades da federação no Brasil. As seguintes hipóteses são elencadas no texto:
O artigo parte de um diálogo com o trabalho de Jacobs e Carmichel (2021) para investigar que variáveis estão associadas ao encarceramento em massa nas unidades da federação no Brasil. As seguintes hipóteses são elencadas no texto:
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Para construção do argumentos do artigo foi elaborado um banco de dados sobre o punitivismo prisional brasileiro com variáveis socioeconômica e políticas. Os dados que utilizamos nesta pesquisa foram obtidos pelas seguintes fontes: Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA), IBGE (2013, 2014), PNUD, Ipea e FJP (2010), Waiselfisz (2014), Depen (2005, 2012, 2014), SGPR e SNJ (2015) e Coordenação de População e Indicadores Sociais. A metodologia quantitativa utilizada partiu de modelos de regressão linear múltipla e modelos lineares generalizados (na família gama). A inferência procurou fazer um diálogo entre a tradição clássica com o paradigma bayesiano.
Para construção do argumentos do artigo foi elaborado um banco de dados sobre o punitivismo prisional brasileiro com variáveis socioeconômica e políticas. Os dados que utilizamos nesta pesquisa foram obtidos pelas seguintes fontes: Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA), IBGE (2013, 2014), PNUD, Ipea e FJP (2010), Waiselfisz (2014), Depen (2005, 2012, 2014), SGPR e SNJ (2015) e Coordenação de População e Indicadores Sociais. A metodologia quantitativa utilizada partiu de modelos de regressão linear múltipla e modelos lineares generalizados (na família gama). A inferência procurou fazer um diálogo entre a tradição clássica com o paradigma bayesiano.
As taxas de encarceramento mais altas são explicadas por quatro regressores: a taxa de urbanização, o voto em Dilma, a proporção de jovens e a desigualdade social. A taxa de urbanização e a proporção de jovens estão associadas positivamente às taxas de encarceramento, e o voto em Dilma e a desigualdade, negativamente. Quanto ao aumento das taxas, fica clara a influência política dos governos de estado, prendendo mais os partidos mais à direita, em detrimento dos de esquerda, sem efeito, no entanto, para a dicotomia liberal/conservador.


Por exemplo, um estado que teve posição política igual a 2, teve um aumento médio em sua taxa de encarceramento de 2014 de exponencial (0,576+0,125*2) = 2,28 vezes a sua taxa em 2004. E um estado que teve posição política igual a -1 teve, em 2014, aumento médio de exponencial (0,576+0,125*(-1)) = 1,57 vezes a sua taxa de encarceramento de 2004.
Por exemplo, um estado que teve posição política igual a 2, teve um aumento médio em sua taxa de encarceramento de 2014 de exponencial (0,576+0,125*2) = 2,28 vezes a sua taxa em 2004. E um estado que teve posição política igual a -1 teve, em 2014, aumento médio de exponencial (0,576+0,125*(-1)) = 1,57 vezes a sua taxa de encarceramento de 2004.


As taxas de encarceramento mais altas são explicadas por quatro regressores: a taxa de urbanização, o voto em Dilma, a proporção de jovens e a desigualdade social. A taxa de urbanização e a proporção de jovens estão associadas positivamente às taxas de encarceramento, e o voto em Dilma e a desigualdade, negativamente. Quanto ao aumento das taxas, fica clara a influência política dos governos de estado, prendendo mais os partidos mais à direita, em detrimento dos de esquerda, sem efeito, no entanto, para a dicotomia liberal/conservador.
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Em conclusão, as principais variáveis explicativas e suas hipóteses apontam para duas características punitivistas do Estado moderno: a capacidade do<br>Estado de fazer valer as regras punitivas e a vontade/inclinação em resolver os conflitos inerentes da fase atual do capitalismo por vias punitivistas. No primeiro caso, os estados mais urbanizados, com maior desenvolvimento, os mais ricos, possuem maior capacidade de gerir um aparato punitivo cada vez mais caro e extenso (policiais, juízes, promotores, sistema prisional e toda estrutura correlata). Isso corrobora a posição weberiana de monopólio legítimo da violência, mas sob condições de capacidade do estado fazer valer as regras punitivas. No outro caso, a vontade punitiva é um dos fatores que aparecem na dinâmica do debate político como alternativa para tratar o crime e a violência, principalmente contra os mais jovens. A tensão aparece entre a capacidade de punir e a legitimidade de controle de parcela, cada vez maior e sempre seletiva, da população.
Em conclusão, as principais variáveis explicativas e suas hipóteses apontam para duas características punitivistas do Estado moderno: a capacidade do<br>Estado de fazer valer as regras punitivas e a vontade/inclinação em resolver os conflitos inerentes da fase atual do capitalismo por vias punitivistas. No primeiro caso, os estados mais urbanizados, com maior desenvolvimento, os mais ricos, possuem maior capacidade de gerir um aparato punitivo cada vez mais caro e extenso (policiais, juízes, promotores, sistema prisional e toda estrutura correlata). Isso corrobora a posição weberiana de monopólio legítimo da violência, mas sob condições de capacidade do estado fazer valer as regras punitivas. No outro caso, a vontade punitiva é um dos fatores que aparecem na dinâmica do debate político como alternativa para tratar o crime e a violência, principalmente contra os mais jovens. A tensão aparece entre a capacidade de punir e a legitimidade de controle de parcela, cada vez maior e sempre seletiva, da população.

Edição das 14h07min de 8 de outubro de 2021

Autor: Vinicius Pinheiro Israel

Referência

ISRAEL, V. P.; PEREIRA, N. B. Estudo sobre a distribuição das taxas de encarceramento nos estados brasileiros e principais variáveis associadas: Influências socioeconômicas e ideológicas. DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 11, n. 3, p. 385–411, 2018.


Breve contextualização

O artigo faz uma análise das principais variáveis correlacionadas com as taxas de encarceramento nos estados brasileiros. Pela primeira vez no país, estuda-se o impacto do posicionamento político dos governadores no punitivismo estatal. Metodologicamente, realiza-se uma abordagem inferencial que promove o diálogo entre a estatística clássica e o paradigma bayesiano. Modelos de regressão múltipla e lineares generalizados são testados e os melhores confirmam a associação significativa entre as taxas de encarceramento e a taxa de urbanização ou desenvolvimento, proporção da população de jovens, voto em Dilma  Rousseff e índice Gini.

VINICIUS PINHEIRO ISRAEL é professor do Departamento de Métodos Quantitativos da Escola de Matemática da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), doutor em Sociologia pelo Iesp/Uerj e doutor em Estatística pela UFRJ. Atua nas áreas de estratificação social, sociologia da punição, metodologia quantitativa, entre outras.

NATASHA BACHINI PEREIRA  é doutora em Sociologia pelo Iesp/Uerj, mestre pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais (PEPG
em Ciências Sociais) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP, Brasil) e graduada em ciências sociais pela PUC-SP.

Resumo dos principais argumentos

O artigo parte de um diálogo com o trabalho de Jacobs e Carmichel (2021) para investigar que variáveis estão associadas ao encarceramento em massa nas unidades da federação no Brasil. As seguintes hipóteses são elencadas no texto:

Hipótese 1: ameaça das minorias (racismo e xenofobia)

Hipótese 2: estratificação social

Hipótese 3: taxa de desemprego

Hipótese 4: ideologia (fatores políticos e religiosos)

Hipótese 5: as metrópoles

Hipótese 6: encarceramento de jovens

Na segunda parte do artigo, o objetivo é compreender a influência do posicionamento político dos governadores nas taxas de encarceramento nos estados (TAROUCO, MADEIRA, 2013; BRAGA, ROCHA, CALOMAGNO, 2015). 

Para construção do argumentos do artigo foi elaborado um banco de dados sobre o punitivismo prisional brasileiro com variáveis socioeconômica e políticas. Os dados que utilizamos nesta pesquisa foram obtidos pelas seguintes fontes: Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA), IBGE (2013, 2014), PNUD, Ipea e FJP (2010), Waiselfisz (2014), Depen (2005, 2012, 2014), SGPR e SNJ (2015) e Coordenação de População e Indicadores Sociais. A metodologia quantitativa utilizada partiu de modelos de regressão linear múltipla e modelos lineares generalizados (na família gama). A inferência procurou fazer um diálogo entre a tradição clássica com o paradigma bayesiano.

As taxas de encarceramento mais altas são explicadas por quatro regressores: a taxa de urbanização, o voto em Dilma, a proporção de jovens e a desigualdade social. A taxa de urbanização e a proporção de jovens estão associadas positivamente às taxas de encarceramento, e o voto em Dilma e a desigualdade, negativamente. Quanto ao aumento das taxas, fica clara a influência política dos governos de estado, prendendo mais os partidos mais à direita, em detrimento dos de esquerda, sem efeito, no entanto, para a dicotomia liberal/conservador.

Por exemplo, um estado que teve posição política igual a 2, teve um aumento médio em sua taxa de encarceramento de 2014 de exponencial (0,576+0,125*2) = 2,28 vezes a sua taxa em 2004. E um estado que teve posição política igual a -1 teve, em 2014, aumento médio de exponencial (0,576+0,125*(-1)) = 1,57 vezes a sua taxa de encarceramento de 2004.

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Em conclusão, as principais variáveis explicativas e suas hipóteses apontam para duas características punitivistas do Estado moderno: a capacidade do
Estado de fazer valer as regras punitivas e a vontade/inclinação em resolver os conflitos inerentes da fase atual do capitalismo por vias punitivistas. No primeiro caso, os estados mais urbanizados, com maior desenvolvimento, os mais ricos, possuem maior capacidade de gerir um aparato punitivo cada vez mais caro e extenso (policiais, juízes, promotores, sistema prisional e toda estrutura correlata). Isso corrobora a posição weberiana de monopólio legítimo da violência, mas sob condições de capacidade do estado fazer valer as regras punitivas. No outro caso, a vontade punitiva é um dos fatores que aparecem na dinâmica do debate político como alternativa para tratar o crime e a violência, principalmente contra os mais jovens. A tensão aparece entre a capacidade de punir e a legitimidade de controle de parcela, cada vez maior e sempre seletiva, da população.

Apreciação crítica

Este é o primeiro texto na sociologia brasileira que trata, quantitativamente, da influência ideológica dos governadores nas taxas de encarceramento dos estados. Além de fazer um diálogo com a literatura internacional sobre as variáveis socioeconômicas que estão associadas ao fenômeno do encarceramento em massa.

Outras referências

BRAGA, Sérgio; ROCHA, Leonardo [e] CARLOMAGNO, Márcio. (2015), “A internet e os partidos
políticos brasileiros”. Cadernos Adenauer, Vol. 16, nº 3, pp. 47-73.

JACOBS, David [e] CARMICHAEL, Jason. (2001) “The Politics of Punishment Across Time and Space: Pooled Time-Series Analysis in Imprisonment Rates”. Social Forces, Vol. 80, nº 1, pp. 61-91.

ISRAEL, Vinicius Pinheiro. (2016) “Macrossociologia sobre relações causais de encarceramento: Comparação entre países e estados brasileiros”. Trabalho  presentado no 10º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP), Belo Horizonte (MG).

SALLA, Fernando. (2003), “Os impasses da democracia brasileira: O balanço de uma década de políticas para as prisões”. Lusotopie, nº 10, pp. 419-435.

SINHORETTO, Jacqueline; SILVESTRE, Giane [e] MELO, Felipe. (2013), “O encarceramento em massa em São Paulo”. Tempo Social, Vol. 25, nº 1, pp. 83-106.

TAROUCO, Gabriela [e] MADEIRA, Rafael. (2013), “Esquerda e direita no sistema partidário
brasileiro: Análise de conteúdo de documentos programáticos”. Revista Debates, Vol. 7, nº 2,
pp. 93-114.