Cidade de Deus (favela)

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

Cidade de Deus é um bairro da Zona Oeste do município do Rio de Janeiro. A região era um sub-bairro que pertencia ao bairro de Jacarepaguá, mas, por decreto municipal, foi desmembrada de Jacarepaguá e tornou-se oficialmente o bairro Cidade de Deus. No local, encontra-se uma das maiores favelas do Rio, que também se chama Cidade de Deus. Faz limite com os bairros de Jacarepaguá, Gardênia Azul, Freguesia e Taquara.

A Cidade de Deus apresenta indicadores sociais entre os mais críticos da cidade, embora esteja situada na vizinhança de bairros de maior poder aquisitivo da cidade: a Barra da Tijuca e a Freguesia. De acordo com o IBGE, a Cidade de Deus tinha, em 2010, 36.515 habitantes. Entre eles, há desigualdades: nos acessos, o cenário é de um bairro de classe média baixa; nas partes mais pobres, proliferam barracos de madeira erguidos ao longo de valões. Segundo o Instituto Pereira Passos, o Índice de Desenvolvimento Social da comunidade é 0,559, o que a deixa em 127º lugar na lista que compara a qualidade de vida de 161 bairros cariocas. A violência une todos os seus moradores, e, ao mesmo tempo, os separa cada vez mais do restante da cidade.

Autoria: Dicionário de Favelas Marielle Franco
Informações do verbete reproduzidas, pela Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco, a partir de outras fontes (ver Referências).

História da Favela[editar | editar código-fonte]

Foto da Cidade de Deus nos anos 1960

Habitada até o século XVI pelos indígenas tamoios, no final desse século a região passou a pertencer à sesmaria de Martim Correia de Sá. Posteriormente, a região continuou a ser ocupada por fazendas que produziam cana-de-açúcar, café etc. Ao longo da década de 1960, a região recebeu pessoas removidas de várias favelas da cidade pelo governador do então estado da Guanabara Carlos Lacerda, como parte da política de remoção de favelas de outras áreas da cidade. No bairro, então, foram construídos conjuntos habitacionais. Seguindo o nome do bairro, as suas ruas receberam nomes inspirados na Bíblia: Israel, Rubens, Jessé etc. Porém logo o crescimento passou a ser desordenado, com a população ocupando os terrenos às margens do rio Grande e de seu afluente Estiva.

Desde a década de 1980, surgiram, no bairro, várias associações de moradores, agremiações de samba, agremiações esportivas, grupos de teatro, revistas, cineclubes, igrejas atuantes, grupos de dança e movimentos negros. Mais sobre o tema pode ser lido na página sobre Associativismo na Cidade de Deus. Entre 1981 e 1985, a Cidade de Deus, assim como várias outras regiões de Jacarepaguá, se emancipou e passou a constituir um bairro próprio. Em 1981, a área tomada por vários blocos de prédios virou um bairro, por meio de um decreto da prefeitura. Em 1997, a inauguração da rodovia Linha Amarela dividiu o bairro em dois. Em 2002, o sucesso do filme Cidade de Deus colocou o bairro intensamente nos veículos de comunicação, reforçando o estigma de comunidade violenta e perigosa e favorecendo uma onda de preconceito e discriminação. A partir de 2003, vários processos confluíram, constituindo novas condições de organização e articulação tendo em vista a transformação da realidade da Cidade de Deus. Após um processo intensivo de discussões, surgiu, naquele ano, o Comitê Comunitário da Cidade de Deus, que veio a reunir diferentes entidades locais tendo em vista superar o isolamento e as divisões que pautavam a atuação dessas organizações. Em 2009, a favela passou a ser ocupada pela 2° UPP.  Em 2009, com a inauguração da UPP, investidores se juntaram às ONGs e aos estrangeiros que se interessaram pela favela na época em que o filme de Fernando Meirelles foi lançado. Dois anos depois, a Cidade de Deus recebeu um visitante ilustre: o então presidente americano Barack Obama, que andou pelas ruas da comunidade. Foram dias de esperança, que, aos poucos, perderam lugar para o pessimismo. A crise econômica do país enfraqueceu os negócios, e a retomada dos confrontos entre bandidos e policiais afugentou aqueles que viam a favela como uma oportunidade de negócio.    

Curiosidades[editar | editar código-fonte]

  • Em 20 de março de 2011, a Cidade de Deus recebeu uma ilustre visita, a do Presidente dos Estados Unidos Barack Obama, acompanhado do governador do estado, Sérgio Cabral Filho e do prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Eduardo Paes. Barack Obama jogou futebol com algumas crianças e assistiu a rápidas apresentações de dança, capoeira, grafite e futebol.
  • A judoca Rafaela Silva, nascida e criada na Cidade de Deus, levou a medalha de ouro para o Brasil no campeonato mundial júnior.
  • Uma das ações culturais que resistem na Cidade de Deus é a Poesia de Esquina, um sarau criado em 2011. A iniciativa, da antropóloga e produtora cultural Viviane Salles, de 27 anos. Algumas vezes foi suspensa: no ano passado, por exemplo, um evento teve de ser cancelado por causa da queda de um helicóptero da Polícia Militar usado durante uma operação contra o tráfico.

Dados gerais sobre o território[editar | editar código-fonte]

  • De acordo com o Censo 2010, há cerca de 180 estabelecimentos comerciais abertos no terrtório;
  • 9,77% dos domicílios vivem abaixo da linha da pobreza;
  • Há cerca de 1360 postos de trabalho no local, a maior parte categorizada como serviços gerais e comércio;
  • Há 14 autorizações da prefeitura para comércio ambulante na região;
  • Há 16 Equipamentos Municipais de Educação (10 escolas municipais, 4 EDIs, 1 CIEP e 1 creche), onde 1360 alunos estão matriculados (Data RIo, 2019);
  • Não há nenhum equipamento de cultura, esporte e lazer público na região (Data Rio, 2019).

Impactos do filme "Cidade de Deus" na favela real[editar | editar código-fonte]

Uma das questões mais marcantes em torno da produção cinematográfica é o fato de o elenco fazer parte do contexto de Cidade de Deus – bairro periférico do Rio de Janeiro que já chegou a ser considerado o mais perigoso do município –, inclusive parte da equipe técnica, como no caso do ator e diretor Luciano Vidigal, que começou no grupo de teatro Nós do Morro e se tornou cineasta em 2002. Para alguns destes atores, o filme representou uma oportunidade de mudar de vida, ter acesso a experiências e cenários que não conheciam antes, representando até um ponto de virada na vida de muitos a partir do audiovisual.

Cidade de Deus não criou o reality tour, mas o filme certamente fez com que o interesse nesse tipo de turismo aumentasse. Para quem não sabe, o termo se refere à prática de levar visitantes estrangeiros às favelas para “experimentar a realidade” desses lugares, em programas turísticos caríssimos que às vezes até incluem um papo com os chefes do tráfico de drogas da região. Embora existam desde os anos 1990, incentivados pela cobertura midiática sensacionalista da violência nas comunidades, o advento dos favela movies, influentes no Brasil e fora dele - chefe entre eles Cidade de Deus - popularizou a modalidade. Além de turistas, o longa atraiu também gente que veio a impulsar projetos sociais e ONGs nessas comunidades.

A organização, que hoje ministra cursos livres de cinema e outras atividades de formação para moradores de comunidades, nasceu a partir do workshop de elenco de Cidade de Deus. Mércia ilustra essa multiplicidade de interesses com a história de uma jovem britânica chamada Lilly - apaixonada pelo filme, ela visitou favelas e o prédio do Cinema Nosso durante os anos 2000, pouco antes de falecer em um acidente de carro. Em sua homenagem, os pais de Lilly financiaram a construção de uma sala de cinema na sede da organização.

Contudo, o filme não foi muito bem aceito por parte dos moradores, incluindo alguns atores, estes majoritariamente moradores da favela e conhecedores de seu cotidiano, afirmam que o filme apresentam muita ficção e um exagero negativo de violência, não representando o dia a dia da comunidade de forma verossímil, como diz Alexandre Rodrigues, ator que interpretou Buscapé no longa: “O que acontece é que tem esses indivíduos [envolvidos no crime] fazendo um escarcéu, e parece que eles são maioria ali dentro - só que não são! A maioria são pessoas de bem, que trabalham, que estão buscando uma melhora na vida. O filme não fala disso, então eu não posso dizer que ele mostra a realidade da favela”.

Se trata, portanto, de um filme com um legado complexo, importante para a história do audiovisual brasileiro, com impactos reais na favela e na vida de seus moradores, apesar das contradições e polêmicas envolvendo o longa metragem.

Mapa da Cidade de Deus[editar | editar código-fonte]

*Durante o projeto Tamo Junto, organizado pelo Dicionário de Favelas Marielle Franco, fizemos oficinas de cartografias conduzidas pela equipe de mapeamento do Banco Comunitário do Preventório. No caso da CDD, membros do movimento "Marginal" produziram intervenções no mapeamento da favela.

Referências[editar | editar código-fonte]

Ver também[editar | editar código-fonte]


Ligações externas[editar | editar código-fonte]