Ethos militarizado

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
Revisão de 18h45min de 14 de maio de 2020 por Palloma (discussão | contribs)

Autora: Renata Souza

ETHOS MILITARIZADO foi o conceito cunhado, em 2017, durante a elaboração da tese de doutorado “O Comum e a Rua: Resistência da Juventude Frente à Militarização da Vida na Maré” de autoria da mareense Renata Souza. O conceito significa a sujeição do cotidiano da favela à lógica militar. Nesse sentido, o ethos, palavra grega que qualifica sociologicamente os costumes, hábitos, valores e ética de um povo, é contaminado por uma lógica belicista, militar e letal. E isso se expressa na opção política por um modus operandi de segurança pública militarizada, seja por meio das generalizadas operações policiais ou mesmo pela naturalização da utilização das Forças Armadas do Brasil em favelas. A Maré, por exemplo, esteve sob o regime de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), medida constitucional que permitiu aos militares atuarem como força de Segurança Pública, de abril de 2014 ao final de junho de 2015. Uma ocupação que deveria ser apenas de três meses, como estratégia de segurança para a Copa do Mundo, durou mais de 1 ano. À época, a prisão de civis por crime militar na Maré tomou como base o artigo 9º (que trata de crimes militares em tempo de paz) do decreto-lei 1.001 de 21 de outubro de 1969, assinado pelo general Artur Costa e Silva, considerado o presidente da fase mais dura do regime militar, sucedido pelo general Emílio Garrastazu Médici. No período em que as forças armadas estiveram na Maré, toda e qualquer atividade cultural e comunitária, principalmente aquelas que ocupavam as praças e ruas da favela, deveriam ser precedidas de pedido de autorização ao Comando Militar da Força de Pacificação. Essa ação demonstra a aposta no controle e vigilância militar sobre a dinâmica e o cotidiano comunitário evidenciando esse ethos militarizado. Outro exemplo de como a lógica bélica e letal se impõe na vida concreta dos moradores de favela ocorreu no dia 19 de junho de 2017, durante um incêndio na sala de informática do Ciep Samora Machel na Maré. Para a surpresa de todos, o Corpo de Bombeiros chegou acompanhado por quatro caveirões da Polícia Militar. Iniciou-se uma intensa troca de tiros entre policiais e traficantes. Nesse ethos militarizado, a estrutura física da escola se transformou em trincheira e as pessoas da comunidade escolar tornam-se escudos.