Favela-bairro (programa)

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

Favela-Bairro foi um Programa da prefeitura do Rio de Janeiro que vigorou de 1994 a 2000. Seu nome oficial era Programa de Urbanização de Assentamentos Populares do Rio de Janeiro - PROAP-Rio e visava dotar favelas e loteamentos irregulares de infraestrutura e serviços sociais básicos, regularizá-los e integrá-los aos bairros. Além do Favela-Bairro, voltado às favelas, o PROAP-Rio incluía o Morar legal, de regularização de assentamentos.

Autoria: Este verbete foi elaborado a partir dos dados da pesquisa 'Observatório da Inovação Social' coordenada por Sônia Fleury com a participação das pesquisadoras Lenaura Lobato, Valeria Bicudo, Andreia Assis e Rosângela Alves.

O projeto[editar | editar código-fonte]

O PROAP foi financiado pelo governo municipal da cidade e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento e envolveu soma significativa de recursos - aproximadamente US$ 626 milhões. Seu objetivo era beneficiar ao menos 106 favelas do Rio de Janeiro e 24 loteamentos irregulares, atingindo uma população estimada em 580 mil habitantes.

O Favela-Bairro tinha concepção diferenciada de seus antecessores ao relacionar a exclusão social ao território-local – no caso a favela, e organizar de forma integrada um conjunto de ações urbanas e sociais sobre as condições daquele território. O objetivo final era fazer da favela parte integrante dos bairros onde estavam localizadas e, assim, fazer com que seus habitantes fossem considerados parte da cidade como outros.

Como política pública, o Programa Favela-Bairro foi fruto de uma nova mentalidade entre os administradores públicos municipais. A Constituição de 1988 incorporou os planos diretores e o planejamento urbano municipais como preceitos para o pleno desenvolvimento das cidades e bem estar de seus habitantes. A democratização fez crescerem as demandas das populações das favelas por direito à moradia digna e serviços sociais públicos e, paralelamente, registrava-se o crescimento da violência na cidade do Rio de Janeiro. Assim, uma nova concepção de política pública reconhecia que a. as favelas deviam ocupar lugar central na agenda pública municipal, passando a constar nos mapas e cadastros da cidade; b. a forte segregação existente no município deveria ser combatida buscando-se integrar as favelas à cidade, aumentando a presença do Estado e a oferta de serviços públicos; c. cada favela era formada por uma comunidade possuidora de uma história, valores e hábitos culturais que deviam ser respeitados pelas intervenções do poder público; d. a  integração das favelas à cidade exigia a intersetorialidade das ações públicas, buscando-se superar a fragmentação que vinha caracterizando as políticas públicas; e. o sucesso das intervenções públicas nas favelas dependia do envolvimento e da participação ativa da comunidade.

As etapas[editar | editar código-fonte]

A primeira etapa do Favela-Bairro (Favela-Bairro I) só compreendeu obras de infra-estrutura e saneamento. Já no Favela-Bairro II foram incorporadas ações sociais integradas às ações urbanísticas. Essas ações visavam principalmente proporcionar o desenvolvimento de crianças e adolescentes e gerar oportunidades de trabalho e renda aos seus habitantes (Prefeitura do RJ, 2000).

O Favela-Bairro II tinha três componentes: o urbanístico (infra-estrutura básica e serviços urbanos), o social (trabalho de atenção a crianças e adolescentes e incentivo à geração de trabalho e renda) e o institucional (assessoria e capacitação técnica e avaliação do Programa). O componente urbanístico era o centro do Programa. A área social incluía vários projetos, mas foi obviamente limitada diante das inúmeras demandas da população das favelas. Mesmo assim, houve uma inédita articulação das ações urbanísticas com as sociais.

Para a realização do Programa o governo municipal contou com parcerias estabelecidas com o governo estadual (para ações relacionadas à prestação de serviços de competência estadual), organizações não-governamentais (prestadoras dos serviços previstos no componente social) e empresas privadas (elaboradoras dos projetos urbanísticos para as favelas e executoras das obras).

O Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, aém de co-financiador, participou da definição de parâmetros para a execução do Programa, aprovação das contratações de firmas consultoras, das organizações da sociedade civil e técnicos individuais e também acompanhou os resultados das atividades de monitoramento e avaliação.

O Governo municipal foi o órgão responsável pela gestão do Favela-Bairro, contando com a participação integrada de várias secretarias. A Secretaria Municipal de Habitação, executora técnica das atividades dos componentes urbanístico e institucional e responsável pela contratação e supervisão de empresas privadas); a Secretaria de Fazenda (coordenadora financeira) e várias  outras secretarias e órgãos do governo municipal, responsáveis pelas inúmeras atividades de obras, urbanização e regularização, desenvolvimento social, trabalho e renda, meio ambiente, educação, esporte e lazer e limpeza urbana.

A execução[editar | editar código-fonte]

A execução do Favela-Bairro seguiu uma sequência de passos previamente definidos que, contudo, preservavam certa flexibilidade para se adaptar à realidade de cada localidade e às possibilidades da Prefeitura. A sequência em regra geral era:

1Seleção das comunidades a serem atendidas pelo programa;

2Estabelecimento de contato com organizações e líderes comunitários;

3Seleção de agentes comunitários entre pessoas da própria comunidade e capacitação dos agentes pelas secretarias executoras;

4Divulgação de edital de concurso público para a seleção da firma projetista responsável pela elaboração do projeto urbanístico de cada favela e elaboração de termo de referência para a preparação de proposta técnica a ser apresentada na licitação;

5Realização de diagnóstico a ser utilizado na elaboração da proposta técnica pelas firmas projetistas interessadas;

6Realização de reunião interna ao Programa para a apresentação da firma projetista, do fiscal da prefeitura para acompanhamento dos trabalhos da firma projetista e de representantes de todos os órgãos e secretarias que participavam da execução do programa na favela em questão;

7Realização de assembleia para esclarecer para a comunidade os objetivos do Favela-Bairro e apresentar os órgãos públicos e a firma projetista responsáveis pela execução do Programa;

8Realização de grupos temáticos com a comunidade para levantar problemas e definir demandas nas áreas de infraestrutura e política social;

9Elaboração do Projeto de Urbanização e Plano de Ação Social Integrada – PASI;

10Realização de assembleias para apresentação e aprovação do Projeto de Urbanização e PASI;

11Implantação das obras e das atividades sociais;

12Implantação do Posto de Orientação Urbanística e Social – POUSO;

13Elaboração de Projetos de Alinhamento, reconhecimento de logradouro público e assistência para a legalização fundiária dos domicílios;

14Transferência da responsabilidade pela prestação dos serviços urbanos e sociais sob responsabilidade do município para os órgãos setoriais da prefeitura.

Como se vê, o Programa incorporava a participação das comunidades, tanto na consulta às ações a serem implantadas quanto no seu acompanhamento, através de assembleias comunitárias em várias etapas do processo e pela incorporação de agentes comunitários contratados nas próprias comunidades. Por outro lado, previa a elaboração de um Projeto integrando ações urbanísticas e sociais (PASI) e a instalação do POUSO, um posto para acompanhar a continuidade das ações nas favelas.

Pela abrangência de seus objetivos, por envolver o trabalho coordenado de muitos atores e por estimular a participação dos beneficiários, o Favela-Bairro foi importante para o aprendizado da política pública para as favelas como parte da cidade.

Avanços e Limitações[editar | editar código-fonte]

Alguns elementos inovadores podem ser destacados, que indicam tanto avanços como limitações ao Programa. Entre eles destacam-se: a intersetorialidade na concepção e execução de ações/políticas sobre um mesmo território; a participação da comunidade e a sustentabilidade das ações após o término do Programa. Um quarto elemento seria a integração das populações urbanas residentes em favelas à cidade. Este seria o resultado final que se almejava, mas que não foi de fato alcançado. Menos pelas limitações do Programa e mais pelas condições de continuidade, em longo prazo, de uma política urbana ampla e integrada às necessidades de desenvolvimento da cidadania dos cidadãos da cidade do Rio de Janeiro.

Referência:[editar | editar código-fonte]

Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. PROAP II - regulamento operacional. RJ, 2000.

Ver também[editar | editar código-fonte]