Lutar não é crime

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
Revisão de 12h50min de 20 de agosto de 2019 por Hugo Fanton (discussão | contribs) (Lutar não é crime! Campanha pela liberdade imediata das/os presas/os da moradia em São Paulo! Liberdade para Preta, Sidney, Ednalva e Angélica!)
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Lutar não é crime! Moradia é direito!

Liberdade para Preta, Sidney, Ednalva e Angélica!

Na manhã de 24 de junho de 2019, a Polícia Civil do estado de São Paulo, sob o comando do governador João Doria, prendeu injustamente quatro lideranças de movimentos sem-teto que atuam no centro da cidade de São Paulo: Angélica dos Santos Lima, Janice Ferreira Silva, Ednalva Franco e Sidney Ferreira. Foram determinadas outras13buscas e apreensões contra lideranças de prédios ocupados pelos movimentos. Após cinco dias, as prisões temporárias foram convertidas em prisão preventiva. Também foi decretada a prisão temporária de Carmen Silva, liderança reconhecida internacionalmente pelo seu trabalho em defesa da moradia digna e já absolvida em primeira e segundas instâncias pelas mesmas acusações.

O caso foi assumido pelo Ministério Público de São Paulo que, para favorecer o mercado imobiliário que deseja expulsar a população pobre do centro da cidade, conduziu novo inquérito sem fundamento e persecutório contra essas e outras 14 lideranças. As prisões foram mantidas pela juíza do caso, Erica Soares de Azevedo Mascarenhas, que determinou outras seis prisões de lideranças sem-teto e medidas cautelares contra cinco militantes. A alegação é de que os movimentos, que há décadas lutam pelo direito à moradia, são invasores, cobram aluguel das famílias que ocupam prédios abandonados e ainda expulsam quem não deseja pagar. Essas afirmações são todas falsas, caluniosas.As prisões arbitrárias se inserem em um contexto de acirramento da disputa pela política urbana em São Paulo e no Brasil: de um lado, o governador Doria e o mercado imobiliário buscam se apropriar do espaço para favorecer a especulação e garantir o privilégio de poucos de morar em áreas com infraestrutura urbana. De outro, os movimentos de moradia lutam pelo direito à cidade, por moradia popular em áreas urbanizadas e pelo direito das classes populares viverem nas regiões valorizadas da cidade.

A ocupação de prédios e terrenos vazios, que não cumprem com a função social da propriedade, é a principal forma de luta político-social dos movimentos. A moradia é um direito social e humano negado a mais de sete milhões de famílias brasileiras, sendo milhares em São Paulo. Pela Constituição Federal Brasileira, a moradia é um direito e a propriedade, seja ela pública ou privada, deve cumprir a função social, de modo que as ocupações de prédios ou terrenos abandonados são formas de efetivar aquilo que está previsto constitucionalmente.

A despeito disso, o Estado de São Paulo, por meio de sua Polícia Civil e do Poder Judiciário, conduziu uma operação repleta de constrangimentos ilegais e baseada em falsas acusações para levar as lideranças à prisão. Alega-se que práticas de cobrança de taxa de manutenção dos imóveis ocupados são feitas de forma ilícita. De acordo com o Ministério Público, a investigação foi instaurada a partir de uma denúncia anônima realizada há cerca de um ano. Nos autos do processo, no entanto, fica nítida a inexistência de fundamento que embase as prisões. As ocupações mantidas pelas referidas lideranças realizam manutenção periódica e possuem infraestrutura validada inclusive pelas autoridades, além de possuírem estatuto, promoverem assembleias e prestação de contas.

As arbitrariedades do Poder Judiciário e do Governo Doria seguiram ao longo dos últimos dois meses, com a demora por parte da Justiça em aceitar a constituição dos advogados de defesa, impossibilitando o acesso aos autos do processo, um claro cerceamento do direito de defesa. Além disso, os novos pedidos de prisão doMinistério Público foram movidoscontra lideranças populares que sequer participam do dia a dia das ocupações. Isso mostra, mais uma vez, o objetivo político do Governo Doria e do Poder Judiciário brasileiro de atacar as organizações das classes populares para impor um projeto político-econômico autoritário e de austeridade, em benefício das minorias mais ricas.

Trata-se de mais uma evidência do avanço do fascismo em São Paulo e no Brasil. As prisões das lideranças sem-teto são mais um capítulo da investida contra a classe trabalhadora e seus representantes, um mesmo processo injusto que levou à prisão arbitrária do ex-presidente Lula, a partir de um conluio do Poder Judiciário, dos meios de comunicação tradicionais e do poder econômico para impor ao país um projeto anti-popular.

O direito à moradia tem sido alvejado com os cortes de investimentos e o desmonte das políticas públicas no Brasil. A isso se somam os ataques aos movimentos populares, que diariamente lutam pelo direito à cidade e à moradia digna. A presença dos pobres e trabalhadores nas ocupações da região central de São Paulo é um ato de resistência diária contra a especulação imobiliária e a segregação social. Os movimentos sem-teto possuem uma atuação histórica, democrática e transparente em mais de quatro décadas. Em todos esses anos de organização e luta, conquistaram milhares de moradias para famílias de baixa renda e contribuíram com a formulação de políticas habitacionais e urbanas, com suas várias formas de atuação, como manifestações de rua, ocupações de prédios e terrenos abandonados, reuniões com agentes públicos e participação em conselhos e conferências na área de habitação e política urbana.

Por isso, diversos movimentos populares, sindicais, partidos políticos de esquerdae organizações da sociedade civil conclamam a todas as pessoas defensoras da democracia e dos direitos sociais a se juntar na jornada de resistência contra a criminalização da luta e em defesa da moradia como um direito. Pela imediata liberdade de Angélica dos Santos Lima, Janice Ferreira Silva, Ednalva Franco e Sidney Ferreira, os presos políticos da moradia!