Mobilidades: mudanças entre as edições

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
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Os próprios moradores do Alemão reclamam que o teleférico está parado há mais de um ano, pois ele era sim utilizado. Porém, outras questões como segurança, manutenção, acessibilidade e conectividade precisam ser levadas em consideração. Há pessoas no Complexo do Alemão que só foram visitar a Zona Sul com mais de 10 anos de idade. Já os mototaxis, considerados “salvadores da Pátria”, por um próprio motorista da moto, não são reconhecidos e precisam trabalhar sem nenhuma segurança. Nem lugares que são relativamente perto, como a Ilha do Fundão que fica a UFRJ, tem acesso direto, fazendo com que os moradores necessitem dar uma volta para alcançar o lugar. Isso sem falar na Zona Sul que também não conta com nenhum ônibus direto. O que acontece com a senhora que precisa subir o íngreme morro? Ou a dona de casa com diversas sacolas do supermercado? Ou o MC que quer descobrir e aprender com diferentes ritmos por todo o Rio de Janeiro? Ou a estudante de arquitetura da UFF em Niterói? Ou o trabalhador do Leblon?
Os próprios moradores do Alemão reclamam que o teleférico está parado há mais de um ano, pois ele era sim utilizado. Porém, outras questões como segurança, manutenção, acessibilidade e conectividade precisam ser levadas em consideração. Há pessoas no Complexo do Alemão que só foram visitar a Zona Sul com mais de 10 anos de idade. Já os mototaxis, considerados “salvadores da Pátria”, por um próprio motorista da moto, não são reconhecidos e precisam trabalhar sem nenhuma segurança. Nem lugares que são relativamente perto, como a Ilha do Fundão que fica a UFRJ, tem acesso direto, fazendo com que os moradores necessitem dar uma volta para alcançar o lugar. Isso sem falar na Zona Sul que também não conta com nenhum ônibus direto. O que acontece com a senhora que precisa subir o íngreme morro? Ou a dona de casa com diversas sacolas do supermercado? Ou o MC que quer descobrir e aprender com diferentes ritmos por todo o Rio de Janeiro? Ou a estudante de arquitetura da UFF em Niterói? Ou o trabalhador do Leblon?


Autoria: (Complexo do Alemão).
Autoria: Jean Legroux e Luciana(Complexo do Alemão).

Edição das 15h28min de 2 de março de 2018

“Mobilidade espacial não é uma lacuna, nem uma comunicação temporal neutra entre um ponto de origem e uma destinação. É uma dimensão estruturante da vida social e da integração social” (Kaufmann, 2002). A literatura científica verificou claramente ao longo das últimas décadas que a mobilidade social, ou seja a famosa “mobilidade vertical” na qual as pessoas possuem ou não capacidade para melhorar de vida, está intimamente ligada à mobilidade física. A mobilidade física implica na capacidade de satisfazer um desejo ou uma necessidade de se deslocar de um ponto a outro sem barreiras, sejam elas físicas, financeiras ou simbólicas. Nesse sentido, falar em mobilidade urbana não é apenas falar em acesso aos diversos recursos urbanos, mas também reconhecer como isso inflige e molda a experiência que o cidadão tem na cidade. É por isso que nesse verbete decidimos escrever sobre as mobilidades no plural, pois seria ilusório pensar que o conceito de aplica de forma homogênea para toda a sociedade. Não é possível começar a entender o que as mobilidades significam para o Complexo do Alemão sem antes se atentar para a realidade brasileira e, mais especificamente, carioca. As cidades brasileiras focaram seu desenvolvimento no bonde e nas redes de ônibus até o transporte privado, representado pelo automóvel, se tornar o principal transporte incentivado na década de 50. É nesse sentido que se fala do modelo rodoviarista das cidades brasileiras, na qual o foco e investimento em transporte público foi deixado de lado, o que aprofunda ainda mais questões de segregação e desigualdade social. A crescente liberalização da economia na década de 80 e 90 diminuiu ainda mais o papel do poder público em financiar políticas públicas de transporte, deixando empresas tomarem conta dos transportes públicos formais e cooperativas informais criarem alternativas como vans e mototáxis nas áreas consideradas de baixo interesse. O Rio de Janeiro não foi diferente, mas sofreu ainda mais com a inconstância do investimento público por deixar de ser a capital brasileira e por ser considerada uma cidade turística, na qual algumas áreas deveriam ser priorizadas e detrimento de outras. Nas últimas décadas há uma tentativa de retomada do poder público no investimento de transporte público, que ficou mais claro com os mega-eventos: Copa do Mundo e Olimpíadas. A denominada “Revolução dos transportes” pretendia, em teoria, democratizar o acesso e aumentar a mobilidade urbana. Porém, seu resultado se concentrou muito mais na Barra da Tijuca, no Centro, enfim, nos lugares valorizados ou em curso de revalorização. Porém, nesse mesmo período, territórios historicamente abandonados pelos poderes públicos, também foram alvos de investimentos importantes, com o PAC-1, programa federal que investiu mais de 1 bilhão de reais no Complexo do Alemão. As obras de saneamento e as obras viárias prometidas, alargamento das avenidas principais e criação de mais novas vias, não saíram do papel. Já o teleférico, que custou aproximadamente 240 milhões, fora as desapropriações para a construção do mesmo, foi considerado pelo poder público como uma grande e necessária modernização para o bairro, mas já se encontra parado há mais de um ano. O teleférico faz parte de um programa mais amplo de pacificação das favelas e espetacularização da realidade. Ao invés de enfrentar as questões importantes da mobilidade no morro, como a falta de ônibus ou a regulamentação das vans e moto-taxis, esse grande projeto de infraestrutura visível pretende garantir a imagem do poder público como atuante na região, além de oferecer grande oportunidade de obra para empresas. Não que o teleférico em si seja um problema, muito pelo contrário, ele pode sim vir a ser uma grande solução para os problemas de mobilidade no Complexo do Alemão, se conectado com diferentes modais, com tarifas sociais acessíveis, regulamentação dos meios informais etc. Os próprios moradores do Alemão reclamam que o teleférico está parado há mais de um ano, pois ele era sim utilizado. Porém, outras questões como segurança, manutenção, acessibilidade e conectividade precisam ser levadas em consideração. Há pessoas no Complexo do Alemão que só foram visitar a Zona Sul com mais de 10 anos de idade. Já os mototaxis, considerados “salvadores da Pátria”, por um próprio motorista da moto, não são reconhecidos e precisam trabalhar sem nenhuma segurança. Nem lugares que são relativamente perto, como a Ilha do Fundão que fica a UFRJ, tem acesso direto, fazendo com que os moradores necessitem dar uma volta para alcançar o lugar. Isso sem falar na Zona Sul que também não conta com nenhum ônibus direto. O que acontece com a senhora que precisa subir o íngreme morro? Ou a dona de casa com diversas sacolas do supermercado? Ou o MC que quer descobrir e aprender com diferentes ritmos por todo o Rio de Janeiro? Ou a estudante de arquitetura da UFF em Niterói? Ou o trabalhador do Leblon?

Autoria: Jean Legroux e Luciana(Complexo do Alemão).