Morro da Serrinha

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
Autoria: Gabriel Nunes.

A Serrinha é uma favela localizada no bairro de Madureira, próximo à divisa com Vaz Lobo, Zona Norte do Rio de Janeiro.

É conhecida por ser o berço das escolas de samba Prazer da Serrinha (extinta) e Império Serrano, sendo que esta última, apesar de não ser mais sediada na comunidade, ainda mantém com ela profundos vínculos.

A Serrinha é conhecida por ser também um dos tradicionais locais de prática de jongo, desde a época dos primeiros sambistas, no início do século 20.

História[editar | editar código-fonte]

Rua Balaiada, Morro da Serrinha, MADUREIRA..jpg

A favela da Serrinha nasceu com a abolição da escravatura, onde os escravos livres procuravam locais para moradia perto de onde viviam.


Antes da comunidade o morro era um conhecido ponto de passeio pelos moradores de Madureira, que subiam o morro no fim de semana em busca de sua vista privilegiada do bairro. Num desses passeios um grupo encontrou uma imagem de São José, logo, a exemplo do aconteceu em aparecida, começaria um culto ao redor do local, onde acabou nascendo a famosa igreja de "São José da Pedra", localizada no alto do morro, na sua face voltada ao centro de Madureira.

 

A serrinha também contava com uma comunidade de sírios em seu sopé, já no asfalto, vindos da segunda leva de imigrantes e aportando aqui nos anos 20. Uma comunidade grande que ficou conhecida por uma de suas mais famosas membras, a atriz do teatro de revista Zaquia Jorge, fundadora do primeiro teatro de Madureira, morta prematuramente num acidente nas águas da praia da Barra. Em sua homenagem foram compostos os famosos sambas "Madureira chorou" e "Estrela de Madureira".

 

 

 

O jongo e o samba[editar | editar código-fonte]

Autoria: Flávio da Silva França Alves, o Mestre Flavinho.
Tia Maria da Grota, uma das jongueiras mais antigas do Rio. Foto Cris Isidoro, Diadorim Ideias ..jpg

O jongo e o samba chegaram na Serrinha como resultado de políticas públicas excludentes. O jongo é um ritmo de um grupo étnico africano que foi traficado de sua terra natal para a realização de trabalho escravo no Brasil e que sobreviveu em meio aos sofrimentos das plantações. Nos canaviais e cafezais, os negros utilizavam do ponto do jongo para se comunicarem, uma vez que ele se utiliza de metáforas, podendo apenas ser entendido por quem é jongueiro.

Já o samba nasce após a abolição, com forte viés político—e é assim até hoje. Durante o período de políticas de segregação, os negros não podiam participar da grande festa do carnaval e então criaram sua própria festa, que tinha por base o samba. Não era apenas uma festa, mas sim um ato de resistência. No início do século XX, o samba era um ritmo marginalizado e criminalizado devido a essas origens africanas. Aliás, toda e qualquer expressão cultural de origem africana foi marginalizada ao longo da história—o samba de ontem é o funk de hoje.

Assim como o samba, eram criminalizadas as práticas religiosas de matriz africana. A Serrinha não teria suas origens musicais se não fossem os terreiros que fincaram as tendas no morro. Foram dias e noites de encruzilhadas sonoras, nos quais terreiros de umbanda e candomblé acendiam suas fogueiras melódicas em harmonia com o território.

Tia Eulalia, na escadaria do Morro da Serrinha em Madureira, precursora do jongo e fundadora do Império Serrano. 1992.png

Tudo isso transformou a Serrinha em um polo cultural. Andar pela Serrinha hoje é como uma aula de história. Passeando por suas ruas e becos, vemos presentes os artistas serranos que ali viveram. Entrando pela Rua Compositor Silas de Oliveira (o poeta por detrás de Aquarela Brasileira), chegamos à Casa do Jongo, que por sua vez está ao lado da Creche Vó Maria Joana, grande matriarca do Jongo. Um pouco acima, passamos pela Rua Mestre Darcy do Jongo e à frente, à esquerda, está a famosa Rua da Balaiada—que agora se chama Rua Tia Eulália. Assim como a Tia Ciata, Tia Eulália organizava os famosos pagodes com sambistas e jongueiros. E foi em sua casa que nasceu o Império Serrano. Não nos esqueçamos também do saudoso Mano Décio da Viola, que nomeia a rua paralela à Compositor Silas de Oliveira—os dois se uniram a Manoel de Ferreira para compor o hino Heróis da Liberdade para o carnaval de 1969 do Império Serrano.

A Serrinha hoje[editar | editar código-fonte]

Autoria: Flávio da Silva França Alves, o Mestre Flavinho.
Integrantes do Projeto Herdeiros, Foto Cris Vicente..jpg

Tanta história e cultura fortalecem as ações locais atuais. Exemplo vivo disso é a Casa do Jongo da Serrinha, que acolhe crianças locais com aulas de dança, instrumentos e cultura popular, além de abrigar o Projeto Herdeiros, do qual sou fundador e que reúne jovens que dão continuidade ao legado do samba, presente desde a fundação do morro, por meio de aulas de instrumentos musicais. Assim viabilizamos o treinamento de futuros ritmistas da nossa Sinfônica do Samba. O filme documental Herdeiros', em processo de finalização, retrata essa tentativa de ocupação do espaço e apropriação das narrativas para lançar um novo olhar sobre a cultura local e retomar nomes esquecidos na história da música, além de empoderar as futuras gerações, numa tentativa de criação de um sistema sustentável.

Outros bons exemplos das ações culturais locais são o Samba na Serrinha, tradicional roda de samba semi-acústica que também acontece na Casa do Jongo e aproxima a comunidade de suas raízes musicais, a Império do Futuro, a primeira escola de carnaval mirim do Rio e criada pelo Mestre Careca (Mestre que é uma escola de samba por si só e inclusive formou musicalmente os fundadores do Projeto Herdeiros), e o webshow “Fala Serrinha!“, pensado e dirigido pelo grandioso João da Serrinha e que transforma cada morador em protagonista da sua própria história.

Referência bibliográfica[editar | editar código-fonte]

RioOnWatch


 Jaime Gonçalves / favelatemmemoria.com.br (9 de fevereiro de 2005). «Relíquias do samba». Consultado em 3 de janeiro de 2014. Arquivado do original em 3 de janeiro de 2014

Ver também[editar | editar código-fonte]