Participação Comunitária em projetos Habitacionais: mudanças entre as edições

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
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'''Autor: Paulo Magalhães.'''
A incorporação do usuário em políticas públicas foi iniciada, no Brasil, na área habitacional. Foram implantados inicialmente projetos não convencionais de moradia, como o Profilurb (lotes urbanizados) João de Barro (mutirão) ainda no final dos anos 80, por influência das agências multilaterais de desenvolvimento – Banco Mundial e BIRD.
A incorporação do usuário em políticas públicas foi iniciada, no Brasil, na área habitacional. Foram implantados inicialmente projetos não convencionais de moradia, como o Profilurb (lotes urbanizados) João de Barro (mutirão) ainda no final dos anos 80, por influência das agências multilaterais de desenvolvimento – Banco Mundial e BIRD.
Esta concepção foi, desde então, largamente utilizada no país, tornando-se uma estrutura fundamental para qualquer ação no campo da moradia popular.
Logo foi nominada de participação comunitária e utilizada largamente pelas instâncias federais, estaduais e municipais em diferentes políticas, programas e projetos habitacionais.
O pressuposto básico era de que a participação do morador reduzia os custos da moradia e trazia satisfação ao usuário ou “beneficiário”, conforme categoria consagrada pelas iniciativas governamentais.
Nesse sentido, a emergência de projetos de urbanização de favelas e de outros “assentamentos precários” foi o campo considerado propício para a aplicação da noção de participação comunitária, já que necessariamente o morador, por ter construído seu local de moradia e sua casa e mesmo feito a urbanização inicial, era componente essencial para a ação.
A experiência mais elaborada dessa perspectiva foi implantada pela Prefeitura do Rio de Janeiro (Gestão Cesar Maia – 1993 |1997) e denominada de Favela Bairro. Mas esta iniciativa já vinha acumulando conhecimento desde a Gestão Saturnino Braga (1986|1988) com as ações de mutirão comunitário, mutirão remunerado, mutirão com assistência técnica, entre outras iniciativas. Portanto, o Programa Favela Bairro, que inspirou muitos outros Programas no Brasil e em outros países, foi produto de sucessivas experiências associando o mutirão, como prática social das camadas populares, e as concepções emanadas das agências multilaterais.
A categoria “universalizada” para a denominação dessas ações ficou conhecida como “participação comunitária”.
Assim, todas as políticas, programas e projetos emanados das instâncias governamentais estabelecem este “componente”, categoria pelo qual era conhecido. Mas, em verdade, esse componente era “imposto” como elemento essencial para a implantação da ação.
Estes processos desencadeados pela participação comunitária geraram diferenciados arranjos sócio políticos: desde a negociação política na presença de um sujeito coletivo organizado, passando por mera formalização da participação comunitária, pela cooptação e clientelismo político e também numa enorme diversidade de arranjos para negociação com o Estado.
Em última instância, a coletividade nas áreas em que foi implantada a urbanização de favelas, em sua singularidade, “organizou-se” para a ação. Desde a criação de organizações não governamentais para a oferta de mão de obra especializada – agentes comunitárias – até a criação de entidades locais para a mediação das relações entre a coletividade e o Estado.
Esses processos de mediação, principalmente no Rio de Janeiro, produziram uma hiper densidade de atores políticos locais, ocasionando, por intricados caminhos institucionais, uma menor importância das associações de moradores e mesmo dos organismos coletivos de representação das associações de moradores. A proliferação de ong’s de militância política ou de ativismo social nas favelas também contribui para o “inchaço” de representações que, longe de um fortalecimento do capital social local, representava importante fragmentação política que ocasionou, em largo prazo, na crise de representação por que passa atualmente as favelas. Pode-se afirmar que nos complexos de favelas, nas favelas “isoladas” e mesmo nos assentamentos precários, no Rio de Janeiro e no Brasil, “nenhuma instituição representa a favela e nem o conjunto de todos os atores pode falar pela favela.”
E a importância dessa mediação para a implantação das ações governamentais tornou-se essencial com o recrudescimento do chamado “crime organizado”, principalmente dos narcotraficantes. O controle físico territorial da favela e mesmo a profunda importância no plano político institucional (controle das entidades locais) dos narcotraficantes elevaram o significado atribuído ao Estado e pelos agentes privados aos mediadores locais – quer pessoas ou instituições.
Portanto, a participação comunitária como componente da política habitacional é, ainda hoje, um instrumento largamente utilizado, mas reinterpretado no processo histórico, tornando-se uma verdadeira panacéia com resultados os mais variados possíveis.


Autor: Paulo Magalhães.
Esta concepção foi, desde então, largamente utilizada no país, tornando-se uma estrutura fundamental para qualquer ação no campo da moradia popular. Logo foi nominada de participação comunitária e utilizada largamente pelas instâncias federais, estaduais e municipais em diferentes políticas, programas e projetos habitacionais. O pressuposto básico era de que a participação do morador reduzia os custos da moradia e trazia satisfação ao usuário ou “beneficiário”, conforme categoria consagrada pelas iniciativas governamentais. Nesse sentido, a emergência de projetos de urbanização de favelas e de outros “assentamentos precários” foi o campo considerado propício para a aplicação da noção de participação comunitária, já que necessariamente o morador, por ter construído seu local de moradia e sua casa e mesmo feito a urbanização inicial, era componente essencial para a ação. A experiência mais elaborada dessa perspectiva foi implantada pela Prefeitura do Rio de Janeiro (Gestão Cesar Maia – 1993 |1997) e denominada de Favela Bairro. Mas esta iniciativa já vinha acumulando conhecimento desde a Gestão Saturnino Braga (1986|1988) com as ações de mutirão comunitário, mutirão remunerado, mutirão com assistência técnica, entre outras iniciativas. Portanto, o Programa Favela Bairro, que inspirou muitos outros Programas no Brasil e em outros países, foi produto de sucessivas experiências associando o mutirão, como prática social das camadas populares, e as concepções emanadas das agências multilaterais. A categoria “universalizada” para a denominação dessas ações ficou conhecida como “participação comunitária”. Assim, todas as políticas, programas e projetos emanados das instâncias governamentais estabelecem este “componente”, categoria pelo qual era conhecido. Mas, em verdade, esse componente era “imposto” como elemento essencial para a implantação da ação. Estes processos desencadeados pela participação comunitária geraram diferenciados arranjos sócio políticos: desde a negociação política na presença de um sujeito coletivo organizado, passando por mera formalização da participação comunitária, pela cooptação e clientelismo político e também numa enorme diversidade de arranjos para negociação com o Estado. Em última instância, a coletividade nas áreas em que foi implantada a urbanização de favelas, em sua singularidade, “organizou-se” para a ação. Desde a criação de organizações não governamentais para a oferta de mão de obra especializada – agentes comunitárias – até a criação de entidades locais para a mediação das relações entre a coletividade e o Estado. Esses processos de mediação, principalmente no Rio de Janeiro, produziram uma hiper densidade de atores políticos locais, ocasionando, por intricados caminhos institucionais, uma menor importância das associações de moradores e mesmo dos organismos coletivos de representação das associações de moradores. A proliferação de ong’s de militância política ou de ativismo social nas favelas também contribui para o “inchaço” de representações que, longe de um fortalecimento do capital social local, representava importante fragmentação política que ocasionou, em largo prazo, na crise de representação por que passa atualmente as favelas. Pode-se afirmar que nos complexos de favelas, nas favelas “isoladas” e mesmo nos assentamentos precários, no Rio de Janeiro e no Brasil, “nenhuma instituição representa a favela e nem o conjunto de todos os atores pode falar pela favela.” E a importância dessa mediação para a implantação das ações governamentais tornou-se essencial com o recrudescimento do chamado “crime organizado”, principalmente dos narcotraficantes. O controle físico territorial da favela e mesmo a profunda importância no plano político institucional (controle das entidades locais) dos narcotraficantes elevaram o significado atribuído ao Estado e pelos agentes privados aos mediadores locais – quer pessoas ou instituições. Portanto, a participação comunitária como componente da política habitacional é, ainda hoje, um instrumento largamente utilizado, mas reinterpretado no processo histórico, tornando-se uma verdadeira panacéia com resultados os mais variados possíveis.
 
 

Edição das 22h26min de 1 de outubro de 2019

Autor: Paulo Magalhães.

A incorporação do usuário em políticas públicas foi iniciada, no Brasil, na área habitacional. Foram implantados inicialmente projetos não convencionais de moradia, como o Profilurb (lotes urbanizados) João de Barro (mutirão) ainda no final dos anos 80, por influência das agências multilaterais de desenvolvimento – Banco Mundial e BIRD.

Esta concepção foi, desde então, largamente utilizada no país, tornando-se uma estrutura fundamental para qualquer ação no campo da moradia popular. Logo foi nominada de participação comunitária e utilizada largamente pelas instâncias federais, estaduais e municipais em diferentes políticas, programas e projetos habitacionais. O pressuposto básico era de que a participação do morador reduzia os custos da moradia e trazia satisfação ao usuário ou “beneficiário”, conforme categoria consagrada pelas iniciativas governamentais. Nesse sentido, a emergência de projetos de urbanização de favelas e de outros “assentamentos precários” foi o campo considerado propício para a aplicação da noção de participação comunitária, já que necessariamente o morador, por ter construído seu local de moradia e sua casa e mesmo feito a urbanização inicial, era componente essencial para a ação. A experiência mais elaborada dessa perspectiva foi implantada pela Prefeitura do Rio de Janeiro (Gestão Cesar Maia – 1993 |1997) e denominada de Favela Bairro. Mas esta iniciativa já vinha acumulando conhecimento desde a Gestão Saturnino Braga (1986|1988) com as ações de mutirão comunitário, mutirão remunerado, mutirão com assistência técnica, entre outras iniciativas. Portanto, o Programa Favela Bairro, que inspirou muitos outros Programas no Brasil e em outros países, foi produto de sucessivas experiências associando o mutirão, como prática social das camadas populares, e as concepções emanadas das agências multilaterais. A categoria “universalizada” para a denominação dessas ações ficou conhecida como “participação comunitária”. Assim, todas as políticas, programas e projetos emanados das instâncias governamentais estabelecem este “componente”, categoria pelo qual era conhecido. Mas, em verdade, esse componente era “imposto” como elemento essencial para a implantação da ação. Estes processos desencadeados pela participação comunitária geraram diferenciados arranjos sócio políticos: desde a negociação política na presença de um sujeito coletivo organizado, passando por mera formalização da participação comunitária, pela cooptação e clientelismo político e também numa enorme diversidade de arranjos para negociação com o Estado. Em última instância, a coletividade nas áreas em que foi implantada a urbanização de favelas, em sua singularidade, “organizou-se” para a ação. Desde a criação de organizações não governamentais para a oferta de mão de obra especializada – agentes comunitárias – até a criação de entidades locais para a mediação das relações entre a coletividade e o Estado. Esses processos de mediação, principalmente no Rio de Janeiro, produziram uma hiper densidade de atores políticos locais, ocasionando, por intricados caminhos institucionais, uma menor importância das associações de moradores e mesmo dos organismos coletivos de representação das associações de moradores. A proliferação de ong’s de militância política ou de ativismo social nas favelas também contribui para o “inchaço” de representações que, longe de um fortalecimento do capital social local, representava importante fragmentação política que ocasionou, em largo prazo, na crise de representação por que passa atualmente as favelas. Pode-se afirmar que nos complexos de favelas, nas favelas “isoladas” e mesmo nos assentamentos precários, no Rio de Janeiro e no Brasil, “nenhuma instituição representa a favela e nem o conjunto de todos os atores pode falar pela favela.” E a importância dessa mediação para a implantação das ações governamentais tornou-se essencial com o recrudescimento do chamado “crime organizado”, principalmente dos narcotraficantes. O controle físico territorial da favela e mesmo a profunda importância no plano político institucional (controle das entidades locais) dos narcotraficantes elevaram o significado atribuído ao Estado e pelos agentes privados aos mediadores locais – quer pessoas ou instituições. Portanto, a participação comunitária como componente da política habitacional é, ainda hoje, um instrumento largamente utilizado, mas reinterpretado no processo histórico, tornando-se uma verdadeira panacéia com resultados os mais variados possíveis.