Cidade Estilhaçada: Reestruturação Econômica e Emancipações Municipais na Baixada Fluminense (livro)

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
Autoria: Manoel Ricardo Simões (2007).

Sobre o livro[editar | editar código-fonte]

A Baixada Fluminense sofreu intensas transformações econômicas, sociais e espaciais ao longo de sua história relacionadas ao papel que possuía em cada contexto e momento histórico. A sua divisão político-administrativa acompanhou a evolução destes processos se modificando de acordo com o peso e importância política que os diversos grupos e classes sociais da região possuíam nestes momentos.

Observando-se essa trajetória verificamos que determinados núcleos urbanos surgiram, se desenvolveram e colocaram sob a sua influência determinadas áreas, que tomaram formas jurídicas diversas: freguesias, distritos e municípios. Entretanto, as transformações econômicas fizeram com que muitos desses núcleos entrassem em decadência e perdessem o seu “status”, se transformando em áreas dominadas por outros núcleos emergentes ou simplesmente desaparecendo, literalmente, do mapa. Desse modo, lugares como Pilar, Estrela, Marapicu, Santana das Palmeiras e Iguaçu, se transformaram em lembranças vagas ou estão colocados num segundo plano, num cantinho dos mapas de Duque de Caxias, Magé, Queimados e Nova Iguaçu.

A dinâmica econômica que cria e destrói formas, funções, classes e relações sociais e modifica fluxos, também é responsável, dialeticamente, pelas transformações políticas, culturais, ideológicas e jurídicas e, conseqüentemente, espaciais. Esse livro tem como objetivo primordial acompanhar a evolução da malha administrativa municipal da Baixada Fluminense a partir destas transformações. Para tanto vamos delimitar o objeto espacial de nossa análise.

Conceitos de Baixada Fluminense e delimitações para esta análise[editar | editar código-fonte]

O objetivo deste trecho não é apresentar um conceito do que vem a ser a Baixada Fluminense, nem lhe dar os limites definitivos e sim delimitar o objeto de nossa análise. Partiremos das abordagens existentes sobre o tema para justificar o nosso recorte territorial e nos dedicarmos à análise do mesmo.

Não existe um consenso geral do que seja a Baixada Fluminense, quais os seus limites e os municípios que a compõem. A cada trabalho sobre essa região reabre-se o debate, pois cada autor se coloca de maneira diferenciada com relação à área a ser delimitada. Contudo, existem alguns consensos que devem ser ressaltados. Os municípios de Nova Iguaçu e Duque de Caxias são apontados, com unanimidade, como núcleos dessa região, assim como não há questionamento sobre a inclusão de seus “satélites” imediatos, como Belford Roxo, São João de Meriti, Nilópolis, Mesquita, Queimados e Japeri, que são incluídos como parte da Baixada Fluminense por todos os autores, mas nem sempre analisados com a mesma profundidade que o “núcleo duro”. Os problemas se encontram nos limites leste, oeste e norte. Dependendo dos autores, Magé e Guapimirim podem ser ou não inseridos na Baixada Fluminense, o mesmo ocorrendo com Itaguaí, Seropédica e Paracambi.

Nesse livro nos interessa apenas deixar claro os limites territoriais que serão analisados com mais profundidade neste trabalho, daí a necessidade de uma breve discussão inicial acerca da opção sobre estes, que norteará o desenvolvimento desse texto. Em trabalho anterior, havíamos feito uma opção de conceito e limite ao afirmarmos que “a despeito de inúmeras tentativas de delimitar esta região, geopoliticamente este é um termo (Baixada Fluminense) que cada vez mais se identifica com a área original do antigo município de Iguaçu, nome oficial de Nova Iguaçu até 1916” (Simões, 2004, 48), ou seja, o que chamaremos daqui por diante de “Grande Iguaçu”. Entretanto, a pesquisa realizada para esse livro tem trazido novas questões e nos impele a repensar se a Grande Iguaçu pode ser sinônimo de Baixada Fluminense.

Este conceito de Baixada Fluminense, enquanto Grande Iguaçu, está próximo dos limites adotados por Monteiro, no seu trabalho sobre Belford Roxo, onde afirma que

“municípios como Itaguaí, Paracambi e Seropédica também classificados como pertencentes à Baixada Fluminense nunca foram partes de Nova Iguaçu e não apresentam as mesmas características sociais desses sete municípios surgidos a partir de Nova Iguaçu. Na realidade assemelham-se mais aos municípios de Magé e Guapimirim “(2001, 18).

Essa abordagem se assemelha ao que Rafael de Oliveira (2004), chama de “Baixada Política”, embora este pondere que “considerando apenas os municípios que se desvincularam de Nova Iguaçu, limitaríamos por demais a região” (Oliveira, R., op cit, 29). Assim este autor incorpora os municípios remanescentes dos desmembramentos dos antigos municípios de Nova Iguaçu, Magé e Itaguaí.

Em contraponto a esta Baixada Política encontramos um conceito de “Baixada Histórica” presente nos trabalhos do IPAHB (Instituto de Pesquisas e Análises Históricas e de Ciências Sociais da Baixada Fluminense) que reconhece como tal a Grande Iguaçu e os municípios de Magé e Guapimirim, (Torres, 2004) que é muito semelhante à delimitação formulada por Prado (2000). Ambos deixam Itaguaí e Seropédica de fora, mas o segundo inclui Paracambi nesta região.

Concordamos, em parte, com Oliveira no que diz respeito à noção de Baixada Política mas insistiremos numa delimitação diferenciada e focaremos nosso trabalho no que chamamos de “Grande Iguaçu” e na extinta Estrela, ou seja num conceito que poderíamos chamar de “Baixada Geopolítica”. Portanto, à medida que não existe um conceito e uma delimitação única para a Baixada Fluminense, assumimos a responsabilidade de considerar neste trabalho, a partir de um conceito geopolítico, a Baixada Fluminense como sendo a parcela da Região Metropolitana que engloba os municípios e distritos que fizeram parte dos antigos municípios de Iguaçu e sua vizinha Estrela, ou seja, os atuais municípios de Nova Iguaçu, Japeri, Queimados, Belford Roxo, Mesquita, Nilópolis, São João de Meriti, Duque de Caxias e o distrito de Inhomirim do município de Magé.

Esta região tem em comum um passado histórico ligado aos portos fluviais e caminhos que ligavam o Rio de Janeiro ao interior do país e uma ocupação recente baseada nos loteamentos populares próximos aos ramais ferroviários e suas estações. Obviamente que estamos reduzindo processos extremamente complexos a estes poucos itens. Contudo o desenvolvimento do texto desse livro irá demonstrar estas complexas relações que se estabelecem a partir desses elementos articuladores que nos autorizam a tomar esse procedimento de caráter meramente didático. A chave para esta compreensão está no seu processo de produção do espaço e nas relações políticas que se estabelecem nestes contextos.

Iguaçu e Estrela estão hoje fracionados em nove municípios diferentes, fazendo parte da região Metropolitana do Rio de Janeiro ou como se diz popularmente, do Grande Rio. Iguaçu teria hoje aproximadamente uma área de1320 km2 e uma população de três milhões de habitantes (ver mapa 3 e tabelas nos anexos), sem contar os 500 km2 e 200 mil habitantes de “Estrela”. Para analisar o processo de fragmentação administrativa desses municípios é necessário, antes de tudo, resgatar o seu processo histórico de ocupação e modo como este espaço foi se diferenciando.

Considerações teóricas acerca do processo de ocupação do território[editar | editar código-fonte]

Os processos de ocupação e urbanização da Baixada Fluminense devem ser entendidos como manifestações locais e particulares de processos mais amplos que vão da inscrição material no espaço das relações sociais e econômicas do capitalismo em geral e no seu modelo brasileiro, até a inserção desta região no processo de metropolização do Rio de Janeiro. O objetivo deste trecho é analisar e articular estes diferentes processos em diferentes escalas a esta materialidade explicitada anteriormente que é o espaço urbano produzido na Baixada Fluminense, de maneira a deixar claro que este espaço é um produto social, fruto de múltiplas determinações. A primeira das determinações a ser analisada é a relação entre o modelo econômico e o processo de urbanização.

Modelo Econômico e Urbanização[editar | editar código-fonte]

A relação entre economia e espaço tem sido trabalhada por diversos autores de diversos matizes ideológicos e epistemológicos e em diferentes ramos da ciência que concordam em alguns pontos, a despeito das divergências em vários outros. Em primeiro lugar não existe uma economia descolada do espaço, nem um espaço que não expresse as atividades e relações econômicas sobre ele. Em segundo lugar é na cidade que essa relação se manifesta de maneira mais evidente. Desse modo podemos afirmar que as cidades são produtos da relação entre economia e espaço ao longo da história e a história do desenvolvimento econômico pode ser analisada através dos processos de constituição das cidades em cada contexto temporal e espacial.

Estes consensos nos permitem analisar o processo de urbanização à luz das transformações econômicas que ocorreram ao longo da história no território brasileiro de um modo geral e na Baixada Fluminense, de maneira específica. É claro que as relações entre economia e espaço não se estabelecem de forma direta e mecanicista, sendo mediadas, dialeticamente, por um semnúmero de condicionantes políticos, jurídicos e sociais. Todavia cabe aqui um esforço analítico no sentido de compreender esta relação e sua articulação com a materialidade do espaço construído.

Acesse o livro na íntegra[editar | editar código-fonte]

Arquivo:A Cidade Estilhaçada.pdf