Celeste Estrela
Celeste Estrela é preta, poeta, favelada, atriz, compositora, rapper e integrante da velha guarda da Escola de Samba Unidos de Manguinhos. Natural de Minas Gerais, é moradora da favela de Manguinhos há mais de 40 anos. É autora do livro 'Coroação Preta', de 2019, que publicou aos 79 anos. O segundo livro de Celeste Estrela, intitulado 'Celeste', de 2023, da Editora Krauss, com ilustração de Suzane Lopes, é voltado ao público infantil.
Autoria: Douglas Luddens
Coroação Preta[editar | editar código-fonte]
'Coroação Preta' tem prefácio escrito por Conceição Evaristo, que compara a vida e escrevivência de Celeste Estrela à escritora, também mineira, Carolina Maria de Jesus. Para Evaristo, 'Coroação Preta' caracteriza-se pela “linguagem simples, em tom coloquial, marcada por uma gramática do cotidiano”, de afirmação da poesia como um “sentimento de pertença do ser humano.” 'Coroação Preta' é uma produção independente, financiada por meio de vaquinha online. O incentivo e colaboração para a primeira publicação veio principalmente dos amigos integrantes do Sarau de Manguinhos.
Vida[editar | editar código-fonte]
Natural de Minas Gerais, da cidade de Carangola, Celeste Estrela estudou em colégio interno, por determinação dos patrões da sua avó. Perto dos cinco anos, no colégio interno, conheceu o racismo. Num ambiente que conviviam meninas brancas e negras, segundo as suas memórias, tudo de ruim que acontecia era culpa das meninas negras. Lembra também que reconheciam o seu talento e por inúmeras vezes destacou-se em apresentações escolares. No entanto, ainda no elogio, o racismo persistia, quando diziam que “a Celeste é uma menina de ouro! Uma preta de alma branca.”
Aos 13 anos, Celeste Estrela veio para o Rio de Janeiro para morar com a mãe na favela do Caju. Tinha uma lembrança vaga da sua mãe, que veio para o Rio de Janeiro com o seu irmão alguns anos antes, por conta do falecimento da sua avó. Na nova cidade deixou de estudar, quando passou a trabalhar em “casa de família”. Sua família foi uma das removidas do Caju para a construção da Ponte Rio-Niterói, período em que foi morar em Manguinhos. Durante muitos anos trabalhou como doméstica, mas também como cobradora de ônibus na antiga CTC – Companhia de Transportes Coletivos do Estado do Rio de Janeiro. Em 1986, na antologia Nova Poesia Brasileira, publicou a sua primeira poesia.
Manguinhos[editar | editar código-fonte]
Celeste Estrela é atualmente uma referência artística da favela de Manguinhos. Seus livros são lidos nas escolas deste território e é frequente sua presença em oficinas literárias e encontros com estudantes. Em 2018, foi tema de um cordel produzido pelo coletivo Experimentalismo Brabo, com autoria de Leo Salo e ilustração de Tiago Carva. Fez parte também do documentário Manas (2022), do diretor moçambicano André Bahule.
Madrugada vida favela[editar | editar código-fonte]
Celeste Estrela
Madrugada triste na favela/ Sem batuque, sem cheiro de panela/ Sigo sempre a caminhar/ Passo a passo, sem ninguém me incomodar/ Levo susto, mas que chato/ É o barulho do sapato/ No telhado o gato mia/ Seu olhar me arrepia/ Afinal chego na pista/ No trabalho o tempo passa/ A coragem me arrasta/ Mas quando chego à tarde na favela/ Tem batuque e tem cheiro de panela/Sigo sempre a caminhar/ Vou sorrindo disfarçando meu cansaço/ Eu vejo a filha da vizinha fritar peixe na cozinha/ Molecada joga bola/ Seu José toca viola/ Chego em casa, que alegria/ Tudo bem com a família/ Bato papo com a vizinha/ Vou pra casa descansar/ Porque amanhã é outro dia. / Chego em casa, que alegria / Tudo bem com a família / Bato papo com a vizinha / Vou pra casa descansar / Porque amanhã é outro dia.
Em Manguinhos viemos morar[editar | editar código-fonte]
Celeste Estrela
Na década de dos anos 50, morávamos no Caju. / Homens medindo a favela diziam: / "Aqui não podem mais ficar / a obra da Ponte Rio Niterói / em breve irá começar." / Juntou-se uma comissão / À procura de um lugar. / Percorreram outros bairros / Mas quando chegaram a Manguinhos disseram: / "É aqui que vamos morar." / Naquele tempo tudo era diferente / Casa de tijolo nem pensar / Prefeitura dava as tábuas / Construindo nossos barracos. / Na minha infância, qualquer coisa estava bom / Pois pouco da vida entendia / Entre retalhos de couro e sapatos / E bagaços de cana, construíram nossos barracos. / Manguinhos era como um pasto, um curral / Um terreno baldio onde se criava animal. / Aqui cheguei menina, pisando em terra fofa / Pois a cada furada, uma água suja brotava / Nada disso importava / Porque em Manguinhos viemos morar. / Manguinhos das enchentes / Que me tirava da cama para dormir em outro lugar / Luz fraca, água carregada, nada disso importava / Porque em Manguinhos viemos morar. / Domingo era tradicional / Todo mundo assistia / O programa do Juvenal. / Cantava quem queria / Todo mundo distraía, era ponto de encontro / Namoros escondidos, namoro proibido / Era só alegria / O bloco foi crescendo / Passando para Grêmio Recreativo Manguinhos / Juntou-se o Amorim, Vila Turismo / E Nova CAP, e assim a escola nasceu. / Você cresceu, eu também / Você rejuvenesceu e eu envelheci / Nada triste quero lembrar / Só tenha a homenagear / Peço a Deus por toda a comunidade / E que alcance a melhor idade.