Favela da Baixa do Sapateiro

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

A Favela da Baixa do Sapateiro é uma favela localizada no Conjunto de Favelas da Maré, no Rio de Janeiro. É uma das comunidades mais antigas da Maré, estabelecida a partir de 1947. Atualmente, a comunidade conta com cerca de 4.000 domicílios, com uma população estimada de 15.000 pessoas.

Favela da Baixa do Sapateiro (1965).
Autoria: Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco.

Origem[editar | editar código-fonte]

Ao contrário da comunidade do Morro do Timbau, cuja ocupação ocorreu em uma área elevada, com alguma organização, a da Baixa do Sapateiro, que lhe é adjacente, desenvolveu-se em uma área de baixada, alagadiça, sem maiores cuidados na organização.[1]

Foi formada por volta de 1947 a partir de um pequeno grupo de palafitas de madeira e originalmente conhecida como "Favelinha do Mangue de Bonsucesso". Atanásio Amorim, Genival Albuquerque e Teófilo Dias são alguns dos primeiros moradores, cujos nomes se sobressaem na história da Baixa do Sapateiro, quando a comunidade foi erguida.

Palafitas na Baixa do Sapateiro, década de 60-70. Fonte Museu da Maré.

Sobre o origem do atual nome da comunidade existem três versões:

  • haveria realmente um sapateiro na ocupação inicial da área;
  • seria uma alusão à Baixa dos Sapateiros em Salvador, na Bahia, uma vez que, na origem, a comunidade era integrada por vários migrantes nordestinos;
  • seria uma referência à vegetação de manguezal, onde predominava a espécie "Rhizophora mangle" (mangue-vermelho), denominada popularmente como sapateiro. Essa espécie era extraída para a produção de tamancos, um calçado popular entre a comunidade de origem portuguesa no Rio de Janeiro.

Charles Gonçalves, baiano de 62 anos, presidente da Associação de Moradores da Baixa do Sapateiro, defende a primeira versão: o nome se refere a um sapateiro que morava na Rua das Oliveiras[2]:

“A Baixa nasceu em torno da construção da antiga Rua Variante, atual Avenida Brasil. Além de sapateiros, a comunidade tinha muitas costureiras e também alfaiates. Com orgulho, a nossa associação de moradores foi a primeira em uma favela a ter o seu estatuto.”

Desenvolvimento[editar | editar código-fonte]

Favelas da Maré (2022).

Iniciada a partir das obras para a abertura da Avenida Brasil, a comunidade tomou impulso com a construção do primeiro grande aterro, promovido dentro do projeto de construção da Cidade Universitária da Universidade Federal do Rio de Janeiro, na Ilha do Fundão. Com a construção da Ponte Osvaldo Cruz, a região tornou-se trânsito obrigatório para quem ia e vinha da Ilha do Fundão. Por essa razão, moradores expulsos das ilhas aterradas e operários da construção iam erguendo os barracos à noite, com sobras de materiais de construção (madeira e latas), sobre palafitas de cerca de dois metros de altura.

A Guarda Municipal, utilizando-se de cabos de aço, puxados por tratores, cortava os esteios das palafitas, demolindo-as. Procurando organizar a luta e conquistar o direito de moradia, fundou-se a Associação de Moradores da Baixa do Sapateiro, em 1957.

As palafitas desapareceram gradualmente graças a aterros promovidos pelos próprios moradores ao longo dos anos. As últimas foram demolidas na década de 1980, por iniciativa do Projeto Rio, do Governo Federal, sendo esses moradores transferidos para os novos conjuntos então construídos: a Vila do João e, mais tarde, a Vila do Pinheiro.

Histórias de um lugar[editar | editar código-fonte]

Senhor Charles conta dos seus 50 anos de história na Maré, sempre na mesma rua. Ele viveu em palafitas, e passou pela carência do básico, como água e luz, e pelo aterramento do local:

“Eu lembro ainda do rola-rola [barril fechado com rolha e envolto em pneu usado para transportar água] e da balança, de ir desengonçado pegar água no bicão. A favela cresceu, veio o progresso, o saneamento, o asfalto, mas tudo conseguido depois de muita luta. Hoje a Baixa é melhor, mas ainda falta muita coisa, os governantes estão atrasados na oferta dos serviços. Até temos saúde e educação, mas com falhas”, reclama.

Praça do 18 (Baixa do Sapateiro).

Lindete Barbosa tem 56 anos; ela vive na Baixa do Sapateiro desde que nasceu e, por isso, conhece muitas histórias. Na infância, viveu na Praça do Dezoito, oficialmente batizada de Luís Gonzaga em homenagem ao Rei do Baião e ao grande número de mareenses com origem do Nordeste do Brasil.

Um antigo chiqueiro deu lugar à praça e o nome pelo qual ela é conhecida: 18 é o número do porco no jogo do bicho. Essa é uma das histórias narradas no livro Lendas e Contos da Maré: “Eu cheguei a ver um porco com cara de gente!”, conta Lindete.

Ela ainda recorda o tempo em que a favela era considerada uma área nobre: “Nós tomávamos banho na Praia da Maré! Quando a maré enchia muito, as águas vinham até o pé do morro”, conta.

Palafitas da Baixa do Sapateiro e Morro do Timbau (final da década 70).

Outro local importante da comunidade para Lindete é o Largo IV Centenário, antiga Rua União da Baixa do Sapateiro, que teve o nome mudado quando a cidade do Rio completou 400 anos de fundação.

“Eu vivi no Largo e, como a maioria dos moradores da Baixa, estudei na Escola Municipal IV Centenário. Minhas filhas também foram alunas de lá; é um colégio de geração para geração. São muitos anos vivendo aqui, mas sinto saudades do passado, pois hoje a favela é muito barulhenta e os moradores sofrem com os buracos nas ruas.”

Gastronomia[editar | editar código-fonte]

Vídeo sobre a gastronomia local da Favela da Baixa do Sapateiro e da Vila do Pinheiro, na Maré:

Fotos[editar | editar código-fonte]

Morro do Timbau e Baixa do Sapateiro..jpg
Folia de Reis (1994), Favela da Baixa do Sapateiro.
Rua Nova Jerusalém, Baixa do Sapateiro, 2003.

Ver também[editar | editar código-fonte]