Indígena na favela

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

Indígena da Favela

Indígena da favela é aquele que resiste em meio à cidade, que carrega em si a ancestralidade de seu povo enquanto caminha pelas ruas de terra batida ou de asfalto quente, que enfrenta o apagamento e a invisibilização todos os dias, mas se reafirma na oralidade, no corpo, no gesto, na luta. São indígenas que, por diversas razões, migraram ou nasceram em territórios urbanos periféricos, onde a identidade indígena muitas vezes é questionada ou vista como algo que deveria ter ficado no passado. No entanto, seguem existindo, reivindicando espaço, cultura e pertencimento.

O indígena da favela não cabe na ideia romantizada de aldeia isolada, mas também não deixa de ser parte de seu povo por viver na cidade. Muitos vieram porque suas terras foram tomadas, porque o agronegócio avançou, porque os rios foram contaminados ou porque simplesmente buscaram condições melhores de vida. Outros já nasceram nesse contexto, aprendendo desde cedo a equilibrar duas realidades: a da metrópole que os cerca e a do pertencimento a um povo cuja história é muito mais antiga do que as ruas que pisam.

A favela, muitas vezes vista apenas como espaço de precariedade, também é território de resistência indígena. São casas que abrigam memórias de aldeias, quintais onde ervas medicinais ainda são cultivadas, encontros onde as línguas originárias ecoam entre paredes de tijolo cru. São corpos que carregam saberes ancestrais e que encontram formas de adaptá-los à vida urbana, mantendo rituais, comidas, formas de organização comunitária e modos de ver o mundo que escapam da lógica colonial imposta pela cidade.

No entanto, ser indígena na favela significa enfrentar desafios constantes: o questionamento da própria identidade, a dificuldade de acesso a direitos básicos, o racismo que não reconhece sua existência, a luta para manter vivas as tradições em um ambiente que, muitas vezes, exige adaptação para a sobrevivência. Apesar disso, seguem lutando, criando coletivos, reivindicando políticas públicas, ocupando espaços culturais, exigindo que suas vozes sejam ouvidas e que sua presença não seja reduzida ao exotismo ou à negação.

O indígena da favela resiste na cidade, mas nunca deixa de ser parte de sua aldeia, de seu povo, de sua história. É memória viva em movimento, é prova de que a ancestralidade não se limita ao espaço, mas se reinventa em cada novo território que ocupa.