Mônica Francisco (PSOL/RJ) - Borel - RJ

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

Mônica Francisco é uma mulher preta, periférica, evangélica progressista, nascida no Morro do Borel, na Zona Norte do município do Rio de Janeiro. Possui longa trajetória de atuação na vida comunitária da região de favelas da Tijuca, incluindo a participação em prol de iniciativas voltadas para o reconhecimento e difusão de memórias e histórias das favelas. Formada em Ciências Sociais, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), integrou a equipe do mandato da vereadora Marielle Franco, em 2017, e foi eleita deputada estadual com 40.631 votos, em 2018. Em sua carreira como parlamentar, pelo PSOL/RJ, atuou em defesa da vida das mulheres, combateu desrespeitos às leis trabalhistas, a precarização das/dos trabalhadores, o racismo e as discriminações. Engajada em diversas causas relativas aos direitos humanos, usa o seu lugar de fala para lutar em favor da garantia de direitos coletivos fundamentais para populações submetidas a situações de vulnerabilidade, como as mulheres, o segmento LGBTQIA+, as negras e negros, que sofrem intolerância religiosa, entre outras.

Autoria: Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco. Este verbete faz parte do relatório "Favelados no parlamento".
Mônica Francisco (PSOL/RJ) - Borel – RJ
Mônica Francisco (PSOL/RJ) - Borel – RJ

Biografia[editar | editar código-fonte]

Monica Francisco - Psol
Monica Francisco - Psol

A atuação da deputada Mônica Francisco é pautada por sua luta de 30 anos em defesa dos direitos humanos, na defesa da economia solidária, da agroecologia, no combate à violência contra mulheres, na promoção da igualdade de gêneros e contra o racismo.

Com uma vida forjada na luta e na fé, a deputada nascida e criada no Morro do Borel, na Zona Norte do Rio, chega aos 50 anos com uma trajetória construída no sobe e desce dos becos da favela, entre o trabalho como doméstica ou operária, os estudos, a família, a militância e a igreja, onde vive uma fé que se manifesta em defesa dos mais pobres e vulneráveis.

Na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, a deputada eleita com mais de 40 mil votos, é reconhecida pela capacidade de dialogar, a firmeza nas posições, a coerência na defesa do que acredita.

Formação e Entrada na Política Institucional

Ingressou em 2008 na UERJ para cursar Ciências Sociais. Foi por intermédio do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) que conheceu Marcelo Freixo, então pesquisador da ONG Justiça Global. Durante o mandato, acompanhou o trabalho de Marielle Franco, então assessora de Freixo. A capacidade de dialogar, a firmeza, a coerência e a disposição em acolher todas as pessoas são traços marcantes da personalidade de Mônica Francisco, que conduziu seu mandato centrado nos eixos: negritude, favelas, periferias, gêneros e direitos humanos.


Primeira fala da Mônica Francisco na ALERJ

Trajetória[editar | editar código-fonte]

1970

-Nasceu no Morro do Borel, onde começou sua militância.

1980

-As enchentes na década de 80 deixaram muitas famílias desabrigadas e Mônica fez mobilização para ajudá-las.

1990

-Foi empregada doméstica, auxiliar de serviços gerais e cozinheira.

-Na Rádio Comunitária do Borel organizou a programação e passou a apresentar o programa "Bate-Papo RCB".

2000

-Engajou-se no Movimento de Rádios Comunitárias, tendo feito parte da diretoria da Associação de Rádios Comunitárias no Rio de Janeiro.

-Participou das oficinas da Agenda Social Rio, através do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase).

-Atuou na criação da Rádio Grande Tijuca e do grupo de "Mulheres, as Arteiras" e como representante do Movimento de Economia Solidária dividido em dois segmentos: artesanato e alimentação.

-Integrou equipes de agentes comunitárias que atuaram no Posto de Orientação Urbanística e Social (Pouso), da Prefeitura do Rio.

2003

-Foi uma das articuladoras do Movimento “Posso me identificar” em apoio às mães de jovens mortos pelo Estado, após a chacina do Borel.

2004

-Participou do Fórum Social Brasileiro, em Belo Horizonte (MG).

2005 - 2007

-Participou do Mapeamento Nacional da Economia Solidária, coordenando o levantamento no Rio de Janeiro.

-Participou do Fórum Social Mundial, em Nairóbi, no Quênia, na África.

-Foi aprovada no vestibular da Uerj para o curso de Ciências Sociais.

2009

-Integrou a comitiva brasileira no Plano de Ação para Eliminação Étnico-Racial desenvolvido em parceria pelos governos do Brasil e dos Estados Unidos.

2011

-Organizou o "Ocupa Borel", ato cultural em resposta ao toque de recolher impetrado pela UPP.

-Foi uma das integrantes do Fórum Nacional, organizado pelo Instituto Nacional de Altos Estudos.

-Colaborou com o Plano de Favelas, tendo participado de diversas edições.

2013

-Trabalhou no desenvolvimento do projeto "Mulheres em Rede", patrocinado pela Petrobras em parceria com a Assessoria & Planejamento para o Desenvolvimento (Asplande).

- Organizou a Comunidade Apostólica Cristã Gileade, na Tijuca. Mônica Francisco é uma das pastoras.

2014

-Tornou-se colunista do Jornal do Brasil Online, coluna Comunidade em Pauta, espaço que ocupou até o final de 2017, dando visibilidade aos temas que permeiam o cotidiano das mulheres negras, faveladas e das relações com a sociedade e os direitos daqueles que vivem nas favelas e periferias do Rio de Janeiro.

2016-Foi convidada por Marielle Franco para integrar a equipe da vereadora. Integrou o grupo de favelas, colaborou com a construção do "1º Encontro Direito à Favela", na Maré.

2017

-Tornou-se apresentadora do programa “Palavra de Mulher”, do Portal Mulheres em Rede, também disponível no Youtube.

-Participou da Conferência Internacional “Fronteiras do Genocídio” e do "14º Encontro Feminista Latino Americano e Caribenho no Uruguai".

2018

-É uma das fundadoras e professoras do curso de extensão “Me Representa” sobre marcas e representatividade da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

-Elegeu-se deputada estadual com mais de 40 mil votos. Esta foi sua primeira candidatura.

Ocupando a Alerj[editar | editar código-fonte]

  • Presidente da Comissão de Trabalho, Legislação e Seguridade Social
  • Vice-presidente da Comissão de Combate às Discriminações e Preconceitos de Raça, Cor, Etnia, Religião e Procedência Nacional
  • Vice-presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito do Feminicídio
  • Membros das Comissões de Saúde, de Segurança Alimentar, de Assuntos Municipais e de Mulheres
  • Suplente das comissões de Constituição e Justiça, de Direitos Humanos, de Agricultura Pecuária e Políticas Rural, Agrária e Pesqueira, da Criança e do Adolescente.

Mônica Francisco foi assessora da vereadora Marielle Franco, que fora brutalmente assassinada em 2018. Antes, trabalhou no Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), organização criada por Herbert de Souza, o Betinho. O trabalho com projetos no Ibase despertou o interesse em estudar Ciências Sociais, curso que ingressou através da Política de Cotas, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em 2008. Além de cientista social, Mônica é pastora evangélica e segue defendendo o respeito e a diversidade, para que a vida seja melhor para todos.

Em 2017 tive a honra e o privilégio de integrar a equipe do mandato da minha amiga Marielle Franco, onde construímos políticas públicas para as mulheres, para o nosso povo preto e para a população favelada. Mari foi arrancada de nós por quem trabalha com uma política baseada no medo e na dor. Em 2017 tive a honra e o privilégio de integrar a equipe do mandato da minha amiga Marielle Franco, onde construímos políticas públicas para as mulheres, para o nosso povo preto e para a população favelada.

Trabalho e Desempenho eleitoral[editar | editar código-fonte]

No trabalho dela, Francisco tentou apoiar as comunidades carentes do Brasil. Desde que assumiu a posição dela, ela serviu nas seguintes comissões:

· Presidente da Comissão de Trabalho, Legislação e Seguridade Social

· Vice-presidente da Comissão de Combate às Discriminações e Preconceitos de Raça, Cor, Etnia, Religião e Procedência Nacional

· Vice-presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito do Feminicídio

· Membros das Comissões de Saúde, de Segurança Alimentar, de Assuntos Municipais e de Mulheres

· Suplente das comissões de Constituição e Justiça, de Direitos Humanos, de Agricultura, Pecuária e Políticas Rural, Agrária e Pesqueira, da Criança e do Adolescente.

Ela trabalhou para garantir os direitos das trabalhadoras domésticas, para dar cuidados de saúde às mulheres na comunidade LQBTQ, e para promover treinamento anti-racismo para funcionários do governo.

Ela também liderou a luta contra a pandemia COVID-19 no Brasil de maneira justa e equitativa, para que brasileiros pobres que vivem em favelas também tenham acesso a cuidados de saúde. Adicionalmente, ela lidera e participa de webinars públicos sobre questões e projetos importantes de seu trabalho. Isso incluiu uma discussão sobre as trabalhadoras domésticas que perderam seus empregos durante a pandemia. Ela também aprovou uma lei que exige que os edifícios residenciais e comerciais tenham anúncios sobre os serviços disponíveis para mulheres que estão sofrendo por causa de violência doméstica durante a pandemia.

Ano Eleição Candidata a Partido Coligação Votos % Resultado
2018 Estaduais no Rio de Janeiro Deputada Estadual PSOL Mudar é Possível

(PSOL, PCB)

40.631 0,59% Eleita
2022 Estaduais no Rio de Janeiro Deputada Estadual PSOL Federação PSOL REDE

(PSOL, REDE)

23.831 0,28% Não eleita

Combater o racismo é lei no Rio de Janeiro – Por Mônica Francisco[editar | editar código-fonte]

Combater o racismo é lei no Rio de Janeiro – Por Mônica Francisco
Combater o racismo é lei no Rio de Janeiro – Por Mônica Francisco

"Que seja a sexta o dia para quem quiser vestir branco. Que seja o domingo o dia de cultos e missas. Que haja giras e círculos de oração. Que haja fios de contas nos pescoços de uns e crucifixos nas mãos de outros. Mas, que nunca, jamais, haja sangue ou fogo."

Por Mônica Francisco *  1/6/2021

Enfrentar toda forma de discriminação e preconceito é responsabilidade de toda sociedade dita civilizada. Trago em minha trajetória o combate veemente às chagas que atormentam todes aqueles que fazem escolhas por este ou aquele segmento de fé. No âmbito do Legislativo, lugar que ocupo há pouco tempo, primamos (somos um coletivo) por criar legislações que promovam a inclusão e combatam as diversas formas de discriminações.

Recentemente, duas leis relacionadas às religiões de matriz africanas foram sancionadas; a Lei 9251/2021 que determina o tombamento por interesse histórico e cultural do Estado o Terreiro de Joãozinho da Goméia – construída em diálogo com as herdeiras/herdeiros espirituais de João Alves Torres Filho e com o Ministério Público Federal – e a Lei 9259/2021 que torna 27 de março Dia Estadual de Conscientização contra o Racismo Religioso — Dia Joãozinho da Goméia.

Antes da sanção, a jornalista Flavia Oliveira ao comentar (na Rádio CBN) o projeto de lei, aprovado na Alerj, que buscava estabelecer o dia 27 de março como o Dia Estadual de Conscientização contra o Racismo Religioso, destacou que a proposta, sobretudo em defesa dos povos de terreiro, que vêm sendo atacados de diversas formas e maneiras por evangélicos fundamentalistas e intolerantes, fora escrito por uma pastora evangélica. Eu, Mônica Francisco, mulher negra, de favela, pastora, ativista da diversidade e do respeito religioso.

Eu, que fiz minha escolha religiosa a partir da fé evangélica, reconheço a importância das religiões de matriz africana como marca fundamental na história de negras(os) descendentes de pessoas escravizadas nesse país.

Eu, pastora evangélica, reconheço a resistência e o conforto que nosso povo encontrou na manifestação da sua religiosidade, da sua fé ancestral, no reconhecimento dos seus antepassados que inspiravam (e inspiram) a luta pela sobrevivência – e mais do que isso, a luta por uma vida digna e plena, com todas as reparações históricas que nos devem, pela opressão, pelo açoite e pela chibata.

É inadmissível que no estado do Rio de Janeiro, como é inadmissível em qualquer lugar do país, que pessoas ditas evangélicas, aliadas a políticos que se denominam senhores da fé evangélica, junto com supostos pastores e líderes que impulsionam o ódio e a intolerância, ousem queimar terreiros, seus templos e imagens acreditando que isso significa vencer o mal e os demônios.

Esses ditos evangélicos, inclusive, desconhecem a própria história, quando católicos indignados com a presença dos crentes em suas cidades, desde o fim dos anos de 1800, incendiaram igrejas, expulsaram missionários, não permitiram enterros de não católicos em seus cemitérios e não reconheceram o matrimônio realizado pelos sacerdotes evangélicos, determinando que os filhos(as) dessas uniões fossem chamados de pagãos.

Talvez esses católicos acreditassem estar vencendo o mal, da mesma forma que certos “cristãos” fazem hoje. Demonizar a religião do outro por não se reconhecer nela é uma prova da barbárie que vivemos, distantes de um mundo mais justo e plural. O outro sempre visto como inimigo, para que se prevaleça sobre ele.

Volto a dizer, é inadmissível que terreiros sejam queimados. A influência do discurso de ódio travestido de neopentecostalismo sobre os comandos do tráfico de drogas, bem como sobre as milícias, não tem permitido a liberdade dentro de territórios e comunidades. A título de uma batalha espiritual – assim como nas cruzadas – impedem que as pessoas andem com seus fios de contas, com suas roupas brancas e façam seus rituais.

Ciente do que é ser filha da liberdade conquistada pelo muito sangue negro que mancha o chão do nosso país, eu – pastora evangélica – reconheço que somos todas(os) chamados à liberdade.

Por isso, com convicção da liberdade que me move apresentei na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, tanto o projeto que torna o dia 27 de março o Dia Estadual de Conscientização Contra o Racismo Religioso – Dia Joãozinho da Goméia – quanto o projeto de tombamento, como patrimônio histórico e cultural – o local onde funcionou o Terreiro da Goméia, onde Joãozinho foi pai de santo por 25 anos, e hoje é um legado para os seus descendentes.

Joãozinho nasceu na Bahia em 27 de março de 1914. Esse é o motivo para o Dia de Conscientização ser 27 de março. Ele veio para o Rio de Janeiro em 1951, onde se estabeleceu em Duque de Caxias, obtendo grande projeção pelos trabalhos que realizava no terreiro que abriu, o Terreiro da Goméia, e pelo seu posicionamento em defesa do povo negro.

A sanção significa uma vitória, que já nos é garantida pela Constituição Federal: a da liberdade religiosa, com o Estado protegendo a todas as expressões religiosas.

Que seja a sexta o dia para quem quiser vestir branco. Que seja o domingo o dia de cultos e missas. Que haja giras e círculos de oração. Que haja fios de contas nos pescoços de uns e crucifixos nas mãos de outros. Mas, que nunca, jamais, haja sangue ou fogo, para destruir o que é sagrado para o outro. É no respeito que vamos construir a democracia.

*Mônica Francisco é pastora, deputada estadual (PSOL) e vice-presidente da Comissão de Combate às Discriminações e Preconceitos de Raça, Cor, Etnia, Religião e Procedência Nacional da Alerj.

Entrevista - história de militância, os desafios para o exercício e o legado deixado por Marielle Franco.[editar | editar código-fonte]

Monica PSOL
Monica PSOL


“Vivemos um processo de desumanização de uma população que já vem morrendo ininterruptamente. E os que não morrem são encarcerados”

por Iracema Dantas *

Mônica Francisco é deputada estadual pelo PSOL-RJ, eleita com 40.631 votos, em 2018. Com uma agenda marcada pela liderança comunitária no Morro do Borel, Zona Norte do Rio de Janeiro, e pela participação no mandato da vereadora Marielle Franco, Mônica chega ao parlamento em um momento em que as forças conservadoras tentam impor todo tipo de retrocesso e perda de direitos: “Vivemos um processo de desumanização de uma população que já vem morrendo ininterruptamente. E os que não morrem são encarcerados ”- diz. Como pastora evangélica da área progressista, ela faz um alerta sobre a apropriação do Estado por parte dos fundamentalistas: "Enfocar apenas a intolerância religiosa religiosa é diminuir o perigo que estamos correndo".

Mônica é casada, tem 48 anos, um casal de filhos e um neto. Nascida em São Cristóvão, foi criada pela avó paterna. “Hoje moro na Tijuca, mas continuo ligada ao Borel para sempre. Não tem como nos separar. Toda minha história de vida e de militância está lá ”.

Como você se tornou uma liderança no Borel?

MF - Em 1988, quando houve uma grande chuva na cidade e o Borel foi muito atingido, eu acabei me envolvendo na ajuda a outras famílias. Naquele momento, ainda sem muita elaboração sobre formas de militância, percebi que eu fazia parte de um coletivo. Dali em diante, comecei a me envolver na luta pela moradia nas favelas. Mais do que uma liderança comunitária, meu envolvimento também significava a minha luta pela sobrevivência, por uma vida melhor, pelo saneamento básico, pela água na torneira dentro de casa.

Mas você fez parte da associação de moradores do Borel?

MF - Sim. Concorri a uma vaga de secretária, mas acabei não sendo escolhida porque não sabia datilografia, o que naquela época era fundamental para o cargo. Só que o presidente da associação gostava muito de mim e me chamou para trabalhar na Rádio Poste, um tipo de serviço de alto-falante. Também fizemos um jornal comunitário, o Formando Opinião. Com a chegada de programas como o Favela Bairro e o Pouso , também trabalhei com assistentes sociais da prefeitura que faziam o cadastramento das famílias envolvidas. Em 2001, houve uma mudança de gestão, resolvi sair da associação e fui trabalhar no Pouso como agente comunitária.

Como você se aproximou das ONGs e movimentos sociais?

MF - Lá pelo final dos anos 90, a associação fazia parte das discussões sobre a criação da Agenda Social Rio 2004, mas nos diziam que só a presidência podia participar. Só que houve a decisão de fazer algumas reuniões descentralizadas, inclusive no Borel. E foi assim, com essa proximidade, que eu e outras pessoas nos aproximamos da Agenda Social Rio 2004, dos movimentos sociais urbanos e mais ainda do Ibase.

De quê maneira o sociólogo Betinho influenciou sua trajetória?

MF - Mesmo antes de conhecer o Ibase, eu conheci a figura de Betinho. A imagem dele nos remetia imediatamente à luta contra a fome. Betinho despertou em mim a vontade de entender a sociedade e a relação com a favela. Por exemplo, sempre tive vontade de ser professora de história, mas dessa convivência veio a opção de cursar sociologia. Tanto o Ibase quanto a Agenda Social foram fundamentais para que aos 38 anos eu resolvesse transformar esse desejo em realidade, ingressando como cotista na Uerj no curso der Ciências Sociais. Também foi nesse espaço do Ibase que pude ampliar a luta do Borel com outras áreas da cidade, com o movimento de mulheres e com as redes de economia solidária e a luta pela moradia.

E mesmo depois da morte de Betinho, continuei mantendo e até ampliando minha relação com o Ibase. Tanto que minha primeira viagem para fora do Rio de Janeiro foi para o Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, em 2005, com o financiamento de um fundo criado pelos funcionários da organização. O Fórum era um espaço plural mas que não tinha muito a participação de pessoas de favelas. Foi ali que tivemos acesso às lutas mais internacionais dos movimentos e coletivos. Ouvir

(Eduardo) Galeano e (José) Saramago foi marcante para mim e para todo o grupo apoiado por esse fundo.

Em que momento as questões da segurança pública e da violência doméstica entram na sua atuação?

MF — Em 2003, houve uma grande chacina no Morro do Borel e isso me levou a entender o ativismo pelos direitos humanos de maneira mais ampla. Foi nesse momento que a temática da segurança pública se consolidou na minha vida e comecei a atuar contra a violência praticada pelo Estado. Nessa época, eu já era articuladora da Agenda Social Rio e atuava na rádio da Grande Tijuca e no grupo Arteiras

Paralelamente, também me aproximo mais do tema da violência doméstica. Até então, era algo que sabíamos que existia sim, mas não havia a dimensão correta do problema. No grupo Arteiras, discutíamos todos os temas relacionados às mulheres mas de forma incipiente. Nessa época também criamos o grupo de passadeiras comunitárias e fundamos a Associação de Mulheres Borel — Indiana.

E como você conheceu Marielle Franco?

MF — Primeiro, eu conheci o Marcelo Freixo. Foi em uma reunião de análise de conjuntura no Ibase e ele ainda era da Justiça Global. . Nos aproximamos por conta de sua atuação com a população carcerária e sua relação com as favelas. Depois, veio a sua candidatura e a aproximação com o mandato. A Mari era a representação do Freixo na Comissão de Direitos Humanos na Alerj e foi lá que nos conhecemos. Aos poucos nos tornamos amigas e ela se tornou minha referência em defesa de direitos.

Você fez parte da equipe da vereadora Marielle Franco?

MF — Sim. Logo depois da eleição municipal, fui surpreendida pelo convite para participar de seu mandato. Fui trabalhar fazendo a articulação do gabinete com os movimentos de favelas e também integrava a equipe que fazia o atendimento direto às mulheres que procuravam algum tipo de auxílio na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara de Vereadores do Rio. Outra função que tive foi a coordenação do grupo de trabalho responsável pelo relatório da Comissão de Acompanhamento da Intervenção Federal no Rio de Janeiro.

E como surge a sua candidatura?

MF — Em meados de 2017, eu e Marielle começamos a conversar sobre a possibilidade de eu me candidatar nas eleições municipais em 2020. Depois, houve algumas mudanças normais do processo e Marielle começou a falar sobre a possibilidade de eu vir como deputada federal. Ela viria como candidata à vice-governadora e Tarcísio como candidato a governador na chapa “Se o estado do Rio fosse nosso”.

De que maneira o fato de ser pastora evangélica influenciou sua indicação às eleições?

MF — Houve a desistência do pastor Henrique Vieira, mas essa nunca foi minha pauta ou militância. Minha relação de fé com sagrado é essa; apenas isso. Logo após a morte da Marielle, durante uma das homenagens que ela recebeu na Maré, percebi que não havia como deixar de lado essa caminhada. Era uma construção coletiva que precisava seguir.

Não tem medo de ser vítima das mesmas forças que mandaram matar Marielle?

MF — O medo é presente desde sempre, principalmente no meu caso que vim da favela e estou envolvida no enfrentamento à violência de estado. Ainda durante minha campanha eleitoral, vivi situações de risco. Recebi muitos sinais e avisos de que estava incomodando. Para mim, o fato mais grave, que até me levou a fazer o boletim de ocorrência na delegacia do meu bairro, foi a invasão da minha igreja. Nada de valor foi roubado, mas estava tudo revirado; nossos instrumentos de som usados no culto foram quebrados. Somos uma igreja pequena, que não arrecada grande volume de dinheiro em doações. Considero que esse fato foi mesmo um alerta para me atingir e me fazer parar.

Além disso, sou uma mulher negra e que carrega em seu mandato uma forte vinculação com o legado da Marielle Franco. Tenho um protocolo de segurança, mas a minha origem popular não me permite grande investimento nisso. Diferentemente de outros deputados e deputadas, não sou empresária, não tenho herança, minha família é humilde, não vim da classe média.

Acredita que os responsáveis pela execução de Marielle e Anderson serão julgados pela Justiça?

MF — Nossa esperança é que o clamor popular e o apoio de instituições como a Anistia Internacional e coletivos feministas não deixem que o caso caia no esquecimento. A própria família consanguínea vem atuando firmemente para que esse crime tenha uma solução e seus responsáveis sejam levados à justiça.

Existem muitas inquietações e dúvidas não esclarecidas. Embora ela fosse uma defensora dos direitos humanos, as linhas de investigação apresentadas não correspondem à atuação política do mandato da Marielle Franco. Desde agosto do ano passado, a Monica Benício, viúva da Marielle, vem solicitando a federalização do caso, algo que não aconteceu até o momento. Queremos saber quem matou Marielle, mas também qual o motivo.

Quais são os projetos que você pretende apresentar ao plenário da Alerj?

MF — Nossos projetos de lei serão sempre elaborados a partir dos quatro eixos que estruturam o mandato: direitos humanos, negritude, favelas/periferia e políticas de gênero. Há também temas que perpassam todos esses pontos, como o racismo religioso, a saúde da população LGBTQI+, a violência obstétrica e a violência doméstica.

Até o momento, já protocolamos o projeto de lei que versa sobre a adoção de linguagem não-sexista no âmbito do poder estadual, atendendo à luta política pela visibilidade das mulheres nessa esfera. Não é só um projeto de lei, mas algo que leva ao entendimento da necessidade e do reconhecimento da presença das mulheres em todas as áreas. Também estamos sistematizando as propostas que recebemos ao longo dos encontros temáticos que fizemos durante a campanha com coletivos de saúde, educadores e educadoras, com a população LGBTQI+ e o movimento de mulheres.

De que forma o fundamentalismo religioso tem influenciado os resultados eleitorais?

MF — Existe um inegável aparelhamento do Estado por grupos religiosos; e um verdadeiro desastre vem acontecendo graças a essa proximidade da religião com a política. Uma consequência direta é a criminalização de outros segmentos religiosos, além de aumentar os ambientes de intolerância religiosa. É preciso entender que isso tudo leva a um racismo religioso e até mesmo à morte de pessoas. Sua relação no sagrado não pode ser motivo de assédio no trabalho, como alguns funcionários públicos da prefeitura do Rio já relataram.

Mas é importantíssimo ressaltar que focar apenas na intolerância religiosa é diminuir muito o perigo que estamos correndo. Existe também a participação de empresas religiosas nas administrações do poder público. São empresas de música, de segurança e até bancos que se apropriam do estado e ampliam o poder dos fundamentalistas. Outro dado a ser levando em conta é a proximidade desses fundamentalistas com grupos para-militares que tentam legitimar seus representantes em cargos públicos.

E apesar desse setor fundamentalista perigoso, não devemos esquecer que o campo cristão católico tem uma enorme influência no mais alto escalão dos poderes — que é mais silenciosa e mais eficaz. Toda política de gênero vem enfrentando há muito tempo a resistência desse setor. São produzidos relatórios contrários ao avanço das políticas de gênero que tem tido sucesso no impedimento de pautas como a do aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Como você avalia a conjuntura política da cidade e do estado do Rio de Janeiro?

MF — Com muita preocupação. Chegamos a 2019 com a institucionalização do medo, da barbárie e da política do abate por parte daqueles que chefiam o Poder Executivo, seja no âmbito municipal, estadual ou federal. Vivemos um processo de desumanização de uma população que já vem morrendo ininterruptamente, a população negra e especialmente os mais jovens. E os que não morrem são encarcerados.

Em pouco tempo do novo governo estadual, já temos chacinas na Baixada Fluminense e no Centro do Rio. Alem disso, tivemos a Cidade de Deus metralhada por atiradores posicionados em helicópteros, materializando a política de snipers. Estamos vivendo a criminalização da pobreza.

No âmbito da educação, tanto no município quanto no estado, está sendo feita a diminuição das horas em sala de aula e também do momento de socialização, gerando uma diminuição na qualidade do ensino e da vida dessas crianças e jovens. Os hospitais estão funcionando precariamente, num processo de privatização da saúde e desmonte do SUS.

Nas favelas ainda se soma a tudo isso o quadro de abandono dos sistemas de alarme das chuvas, o que tem gerado medo e tragédias. Graças a essas políticas equivocadas e uma gestão ausente, tivemos sete mortes com as chuvas de verão. Infelizmente, o quadro é assustador e gera perplexidade. Mas também nos impulsiona a agir de forma contundente contra essa política de morte e descarte de corpos, principalmente jovens e negros.

*Iracema Dantas é jornalista e atualmente trabalha como consultora de comunicação no Ibase.

Leis Sancionadas em 2021[editar | editar código-fonte]

Lei 9469/2021 Inclui no calendário oficial do Rio de Janeiro o Dia Estadual de Luta pelo Fim do Feminicídio, a ser celebrado anualmente em 25 de março.
Lei 9201/2021 Cria o programa de combate à violência “código sinal Vermelho”, no qual a mulher em situação de violência mostra a mão com um X vermelho para pedir socorro. Construída em parceria com a AMAERJ.
Lei 9315/2021 nstitui o Programa Mulheres na Política no estado do Rio de Janeiro, uma forma de incentivar a participação feminina na atividade política e ampliar o número de mulheres nos espaços de poder e de decisão.
Lei 9300/2021 Obriga as unidades de saúde, públicas e privadas a realizarem o exame que identifica a doença falciforme no pré-natal. A doença não tem cura, precisa de acompanhamento a vida inteira e atinge mais a população negra.
Lei 9251/2021 Determina o tombamento por interesse histórico e cultural do Estado o Terreiro de Joãozinho da Goméia. O PL que deu origem a esta Lei foi construído em diálogo com as herdeiras/herdeiros espirituais de João Alves Torres Filho, o Joãozinho da Goméia, e com o Ministério Público Federal.
Lei 9259/2021 Torna 27 de março O Dia de Conscientização contra o Racismo Religioso – Dia Joãozinho da Goméia.
Lei 9259/2021 Torna 27 de março O Dia de Conscientização contra o Racismo Religioso – Dia Joãozinho da Goméia.
Lei 9326/2021 Orienta o governo do estado a criar curso telepresencial de formação para adolescentes e jovens em condições de vulnerabilidade.
Lei 9331/2021 Obriga as concessionárias de transportes públicos afixarem cartazes com os direitos das trabalhadoras do serviço doméstico nos veículos intermunicipais, de todas as modalidades.
Lei 9186/2021 Torna 10 de fevereiro o Dia Estadual de Mobilização para Enfrentamento à Covid-19 e seus Impactos nas Favelas! O PL que deu origem a esta Lei foi criado pela nossa mandata em parceria com movimentos sociais de favela.
Lei 9173/2021 Cria o selo “Empresa amiga da mulher”. A lei é de autoria da nossa mandata e das demais participantes da CPI do Feminicídio.
Lei 9171/2021 Determina que os requisitos para a concessão da tarifa social para energia elétrica sejam amplamente divulgados. A lei é decorrente da CPI da Light, o que torna as deputadas/dos autoras/res.
Lei 9175/2021 Trata da criação de linha de crédito especial para produção de alimentos de ciclo curto. É válida enquanto estivermos em emergência decorrente da pandemia da Covid-19.
Lei 9324/2021 Institui o “Programa Emergencial de Promoção à Saúde Integral” para quem vive e trabalha no campo.
Lei 9508/2021 Garante isenção de ICMS para produtos higiênicos que atendam às mulheres no período menstrual. É uma política pública para dar dignidade às milhões de mulheres e meninas que não têm condição de comprar produtos de higiene pessoal. A lei é de autoria da bancada do Psol na Alerj.
Lei 3705/2021 Que inclui no calendário oficial do Rio de Janeiro o dia 8 de março como o Dia Estadual do Movimento Charme – Lei Corello! A proposta parte de uma articulação da nossa #MandataQuilombo com os movimentos de baile charme e soul do Rio de Janeiro, em nome da valorização da cultura black do nosso estado.

Para saber mais clique aqui

Projetos aprovados e sancionados[editar | editar código-fonte]

Projetos aprovados e sancionados

Pandemia

Projeto de Lei 2055/2020 Que orienta o governo a prover renda mínima emergencial a trabalhadoras e trabalhadores informais e desempregados, residentes no Estado do Rio de Janeiro, em casos de emergência ou calamidade pública oficialmente decretados. Virou a Lei nº 8858/2020
Projeto de Lei 2058/20 Orienta o Poder Executivo a prorrogar a validade das receitas médicas e de outros profissionais habilidades em toda rede de Saúde, em casos de endemia e pandemia. Sancionado. Virou a LEI Nº 8.913
Projeto de Lei 2059/20 Orienta o Poder Executivo a entregar medicamentos de uso contínuo em quantidade suficiente para períodos superiores a 30 dias. A ideia é que as pessoas não precisem sair tantas vezes para ir buscar a medicação. Virou a lei 8.830/2020
Projeto de Lei 2205/2020 Orienta o governo do estado a prover renda mínima emergencial a produtores da Economia Solidária, dispensando estar no Cadastro Nacional de Empreendimentos Econômicos Solidários (CADSOL). Virou a Lei 8858/2020
Projeto de Lei 2288/20 Orienta o Poder Executivo a comprar produtos fornecidos pelos empreendimentos de impacto social, de empreendedores sociais radicados no Estado do Rio de Janeiro, em casos de emergência ou calamidade oficialmente decretados. Virou a Lei LEI 9016/2020
Projeto de Lei 2491/202 Determina que condomínios residências e comerciais a afixarem cartazes com informações sobre os serviços de atendimento às mulheres em funcionamento durante o período de isolamento social. Virou a Lei 8967/20
Projeto de lei 2519/20 Orienta o Governo do Estado a elaborar e executar campanhas de educação em saúde para os produtores rurais e publicização de protocolos de biossegurança na produção, colheita, armazenamento, beneficiamento, transporte e comercialização de produtos, durante a vigência da situação de emergência em saúde pública no Estado do Rio de Janeiro, com o objetivo de promover a prevenção e o enfrentamento ao COVID-19. Foi sancionado e virou a lei 9040/20.

Redes Sociais[editar | editar código-fonte]

Referências[editar | editar código-fonte]

https://monicafrancisco.com.br/

https://www.alerj.rj.gov.br/Deputados/PerfilDeputado/438?Legislatura=19

https://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%B4nica_Francisco

https://revistaforum.com.br/debates/2021/6/1/combater-racismo-lei-no-rio-de-janeiro-por-mnica-francisco-98144.html+

https://medium.com/trincheiras/entrevista-m%C3%B4nica-francisco-6841e259b1ec

https://tribunapr.uol.com.br/eleicoes/2022/candidatos/rj/deputado-estadual/monica-francisco-psol-50888/

Ver também[editar | editar código-fonte]