Olhares libidinosos contra a mulher preta e favelada: quando o olhar tira pedaço
Há várias formas de produzir violência contra as mulheres. Feminicídio, transfeminicídio, violências obstétrica, doméstica, física, moral e psicológica são apenas alguns exemplos das modalidades de subalternizar, ferir e exterminar as mulheres em sua diversidade, sejam elas pretas, faveladas, não brancas, indígenas, quilombolas, ribeirinhas, brancas e etc. Djamila Ribeiro afirma que “ser mulher é estar vulnerável a uma série de violências, é partir de um lugar social de não humanidade”. É amplo o espectro de práticas de violência contra a mulher. Confere-se destaque a um tipo de violência cuja gravidade é de difícil reconhecimento e responsabilização, além de ser visto como de baixo potencial ofensivo ou, talvez, como uma não violência. Trata-se dos olhares libidinosos, intrusivos, fixos e constrangedores que homens lançam sobre as mulheres em territórios favelados, no transporte público, nas ruas, em universidades, escolas ou hospitais. Eles partem de qualquer tipo de homem, sejam eles parentes, policiais militares, vizinhos, meros transeuntes, professores ou médicos. Mesmo sendo uma violência sutil, naturalizada e pouco evidente, o olhar libidinoso é um ato violento porque afeta a mulher, gera-lhe consequências, produzindo nela sentimentos de humilhação, desproteção e impunidade, pois não pode ser impedido de ser executado, já que envolve o sentido da visão. A prática, mesmo não envolvendo toque, não deixa de ser dotada de “tatilidade”, pois toca e fere a mulher em todas as instâncias do seu ser. A situação se agrava porque, geralmente, é acompanhada de outras formas de violência, tais como perseguição, assédio sexual (por envolver relação de hierarquia), importunação sexual ou até mesmo estupro. Em territórios favelados, ainda caracterizados por episódios de violação de direitos, a situação pode ganhar contornos ainda mais graves, dada a legitimação pública de violação do corpo favelado, sobretudo o de mulheres pretas, vistas como objetos de domínio público e que podem ser invadidas, o que constitui uma agressão a sua integridade.