Paraisópolis

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

Paraisópolis é a segunda maior favela do Estado de São Paulo. Estima-se que mais de 100 mil pessoas morem na favela, que completou 100 anos em 2021. Surge a partir da ocupação de lotes abandonados no Morumbi, região considerada nobre na cidade. Em São Paulo, a favela só perde em tamanho para sua vizinha, Heliópolis.

Autoria: Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
Foto: VAN CAMPOS/ESTADÃO CONTEÚDO

História[editar | editar código-fonte]

Informações retiradas do G1/Globo.com

Segundo a União dos Moradores de Paraisópolis, a história da favela começa no ano de 1921. A área em que atualmente está situada a favela fazia parte da Fazenda do Morumbi, parcelada em 2.200 lotes pela União Mútua Companhia Construtora e Crédito Popular S.A.

A infraestrutura do loteamento não foi completamente implantada e muitas pessoas que adquiriram os lotes nunca tomaram posse efetiva, nem pagaram os tributos devidos. Com isso, eles foram abandonados. Dessa forma, tornaram-se um convite para a ocupação informal.

Esse processo começou por volta de 1950, protagonizado principalmente por famílias que a transformaram em pequenas chácaras, além de atuarem como grileiros.

Os anos 1960 vão encontrar essa região com roças e gado bovino. Havia poucas casas e alguns bares, porém com a implantação de bairros de alto padrão como o Morumbi, os cemitérios Gethsemani e Morumbi, e a abertura de vias de acesso, como a Avenida Giovanni Gronchi, a região passou a ser objeto de grande valorização, despertando o interesse econômico.

Nessa mesma década, foi elaborado o primeiro Plano de Desenvolvimento Integrado de Santo Amaro, que propunha a declaração da área como utilidade pública, visando uma posterior urbanização. Mas essa ideia não prosperou.

Em 1970 surgiram os primeiros barracos de madeira, ocasião em que se iniciou a ocupação do Jardim Colombo e Porto Seguro, vizinhas a Paraisópolis.

Ainda nos anos 1970, ficou definido pelo poder público que a ocupação ficaria restrita à habitação unifamiliar e de uso misto, criando condições para implantação de um plano especial de ocupação a ser elaborado em 5 anos.

Novamente as ações não se concretizaram e entre 1974 e 1980 intensificou-se o processo de ocupação da região. O crescimento do processo migratório acelerou-se ainda mais a partir de 1980.

Entre as diversas causas, a facilidade de emprego pelo crescimento acentuado dessa região, principalmente com a demanda crescente de trabalhadores para a construção civil.

Perfil de Paraisópolis[editar | editar código-fonte]

Informações retiradas do G1/Globo.com

  • Cerca de 100 mil habitantes
  • 85% nordestinos
  • 13 escolas públicas (estaduais e municipais)
  • 1 Centro Educacional Unificado (CEU)
  • 1 Escola Técnica (ETEC)
  • 3 Unidades básicas de Saúde
  • 1 Assistência Médica Ambulatorial (AMA )
  • 4 Agências Bancárias
  • 658 presidentes de rua
  • 31. 400 pessoas cadastradas no Emprega Comunidades
  • 1.500 empregos formais;
  • Potencial de consumo: R$ 578 Mi;
  • Lanchonetes representam 26%; Lojas de Roupa 15%; Mercados e Supermercados 14% e Salões de Beleza 13%;
  • 72% formalizados como MEI;
  • 1 Agência de Empregos
  • 1 Agência de Comunicação da Favela
  • Jornal Comunitário
  • Rádio Comunitária

Vídeos sobre Paraisópolis[editar | editar código-fonte]

A pandemia de Covid-19 em Paraisópolis[editar | editar código-fonte]

Considerada um dos exemplos de organização popular para combater a covid-19, a favela contou com estrutura de distribuição de alimentos e contratação de ambulâncias, bem como treinamento da população para enfrentar a pandemia e apoiar a organização do território.

Paraisópolis contrata médicos e ambulâncias, distribui mais de mil marmitas por dia e se une contra o coronavírus[editar | editar código-fonte]

Originalmente postado em G1/Globo.com

Mobilização surgiu diante da falta de políticas específicas para favelas em São Paulo. Dois médicos, dois enfermeiros e três socorristas se mudaram para Paraisópolis há 15 dias e estão em casa cedida pelos moradores. Por Paula Paiva Paulo, G1-SP

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Em uma estreita escada em um beco de Paraisópolis, socorristas suam para conseguir subir cada degrau transportando um paciente em uma maca. Em uma das maiores comunidades de São Paulo, a circulação de médicos, enfermeiros e socorristas se tornou comum nas últimas duas semanas, quando os moradores se uniram no combate ao coronavírus, e, por conta própria, contrataram uma equipe médica e ambulâncias que ficam 24h à disposição da população local.

Em dezembro, nesses mesmos becos, a comunidade vivenciou uma ação da Polícia Militar que resultou em 9 mortes durante um baile funk.

“A gente percebeu que o governo não iria lançar nenhum programa específico para as favelas, e nesse sentimento de abandono saiu a construção de um programa que é uma rede de solidariedade entre moradores de Paraisópolis”, explicou Gilson Rodrigues, presidente da União de Moradores, associação que representa a favela com mais de 100 mil habitantes.

Em uma parceria da União de Moradores com a Associação das Mulheres de Paraisópolis e o G10 das Favelas (instituição que reúne líderes de 10 grandes favelas no Brasil), surgiu o “programa de socorro” à comunidade na Zona Sul de São Paulo.

Foram escolhidos 420 “presidentes de rua”, voluntários que são responsáveis por zelar por trechos de vias predefinidos, cada uma com cerca de 50 casas. Os "presidentes" têm a missão de monitorar se algum morador de sua região tem sintomas da Covid-19 ou se precisa de atendimento médico. Outra tarefa é a de identificar as famílias que estão com a renda reduzida ou mesmo sem renda e que estejam passando fome.

Para o atendimento médico, a comunidade contratou uma equipe com três ambulâncias (sendo uma UTI móvel), dois médicos, dois enfermeiros e três socorristas, que se mudaram para Paraisópolis há 15 dias.

Mulher com sintomas de Covid-19 sendo socorrida em Paraisópolis, na Zona Sul de São Paulo — Foto: Reprodução/Redes sociais

Foi assim que o socorrista Diego Cabral, de 35 anos, deixou a casa onde mora com a esposa, na Vila Matilde, na Zona Leste, a mais de 25 km de distância para estar sempre disponível em Paraisópolis. No novo posto de trabalho, ele viu a demanda por atendimento crescer. “Na primeira semana acho que atendemos 28 casos. Nessa segunda semana já subiu para 51”.

Os profissionais de saúde estão em uma casa cedida por moradores. “Nós fomos muito bem recebidos pela comunidade, a comunidade se preocupou em nos ajudar e fazer a gente se sentir em casa”, disse o socorrista.  

A precariedade do serviço público de saúde na favela fez com que as equipes tenham que atuar também em atendimentos não relacionados com a Covid-19. “Como o Samu não chega nas casas, nós acabamos fazendo todo tipo de atendimento. Os líderes de rua acionam a ambulância e nós fazemos o atendimento de todos os tipos de problemas de saúde”.

“A gente está numa guerra e vamos viver como se fosse numa guerra. Se não fizer isso, vamos perder muita gente em Paraisópolis”, disse Emerson Barata, diretor da União de Moradores. Emerson costuma acompanhar os socorristas para indicar os caminhos e trajetos na favela.

Segundo ele, há seis casos confirmados de coronavírus em Paraisópolis. Entre eles, uma farmacêutica, uma funcionária de um grande hospital privado de São Paulo e uma diarista que teria sido infectada na casa da patroa. Procurada, a Secretaria Estadual da Saúde disse não comentar casos específicos.

Mais de mil marmitas por dia[editar | editar código-fonte]

Junto com a pandemia, veio também a diminuição de renda para alguns que já tinham pouco. Pensando neles, uma equipe de 15 mulheres prepara e distribui cerca de 1.300 marmitas por dia em Paraisópolis. “Muita gente que está desempregado, o gás acabou, está sem arroz, sem feijão, não está podendo se alimentar, a crise se agravou muito. Além disso, há pessoas acamadas, idosos. Estamos atendendo todo esse público”, explica Elizandra Cerqueira, presidente da Associação das Mulheres de Paraisópolis.

Antes da pandemia preocupar a favela, Elizandra gerenciava o Bistrô Mãos de Maria, o restaurante que agora está fechado e que oferece cursos profissionalizante para mulheres da comunidade. Hoje, ela se dedica a buscar doações de alimentos para o preparo das marmitas, que têm um custo de produção de R$ 10. "Elas sempre são bem caprichadinhas, aquela comida caseira”.

A atual estrutura com médicos, socorristas, e ambulâncias foi contratada para apenas um mês. E os moradores ainda correm para pagar o investimento que se soma aos custos dos salários das cozinheiras das marmitas, da compra de equipamentos de proteção individual (máscaras e luvas), além da compra cestas básicas .

“Então não temos o dinheiro ainda, estamos contando com a solidariedade das pessoas para poder pagar”, disse Gilson Rodrigues. Até o final da tarde desta segunda-feira (6), a campanha havia arrecadado mais de R$ 230 mil reais.

O presidente da União de Moradores também contou que pretende montar um espaço de quarentena em duas escolas públicas da região. Gilson quer que os espaços, que estão ociosos neste momento de recesso escolar, sejam usados para acolher pacientes com sintomas leves para o novo coronavírus. Ele diz estar em tratativas com o governo para isso.

Favela de Paraisópolis, na Zona Sul de São Paulo, e prédios do bairro do Morumbi atrás — Foto: Fabio Tito/G1

Nós por nós: união na periferia contra a Covid-19[editar | editar código-fonte]

Texto originalmente publicado no Blog Outras Palavras em maio de 2020. Escrito por Por Arthur Stabile e Gui Christ, na Ponte Jornalismo.

Ensaio fotográfico mostra a organização contra a pandemia em Paraisópolis, S. Paulo. “Presidentes de rua”, eleitos, são responsáveis pela entrega de cestas básicas e máscaras; e organizam brigadas de saúde e acolhimento. Cada um cuida de 50 famílias

“Nos sentimos abandonados, como se não fossemos brasileiros. Esquecidos”. A definição de Gilson Rodrigues, representantes dos moradores de Paraisópolis, segunda maior favela de São Paulo, na zona sul da cidade, é um desabafo. Faz questão de mostrar a falta de preocupação do poder público com a periferia em meio à pandemia do novo coronavírus. Mais do que reprovar, contudo, a comunidade de Paraisópolis se uniu. Mostrou que, mais uma vez, a favela vive por conta própria, na base de um lema antigo: ‘Nós por nós’.

União é a palavra que melhor representa o atual momento vivido ali. Seis meses após nove jovens terem morrido pisoteados em ação da PM durante um baile funk e de três jovens serem sequestrados e mortos na quebrada, Paraisópolis não quer ser notícia mais uma vez por causa de tragédias. Os moradores se mobilizaram para evitar um caos gerado pela pandemia.

A organização é simples: cada rua tem um representante, chamado de presidente. Ele é responsável por até 50 famílias, uma forma de o controle do que está acontecendo ser melhor administrado. São os presidentes que definem as entregas de cestas básicas, chamam ambulâncias para os doentes e encaminham quem precisa para as casas de abrigo — outra ação para atender quem precisa.

“Não é à toa que colocamos o nome do voluntário de presidente de rua. Temos nosso próprio presidente, com a ausência de um representante nesse tempo de pandemia”, afirma Gilson. “Tudo que fizemos veio da favela. Não vem nada dos governos. O estadual liberou apenas escolas para a gente, mais nada. Falta política pública. É uma tragédia que está sendo construída”, prossegue.

Para evitar a tragédia, Paraisópolis criou a entrega de marmitas, a produção e entrega de máscaras aos moradores, contratação de profissionais da saúde para atender os moradores em três ambulâncias, a elaboração de casas de acolhimento (que funcionam em escolas locais, cedidas pelo governo do tucano João Doria), além das cestas básicas entregue às famílias mais necessitadas.

Toda a mobilização gera um dia a dia de trabalho corrido. Na última quarta-feira (6/5), por exemplo, um grupo de 250 voluntários se formou para atuar como socorristas, ação feita logo pela manhã. Em seguida, quem estava ali foi direcionado para as demais atividades, que não podem parar.

O fotógrafo Guilherme Christ acompanhou por duas semanas o trabalho nos becos e vielas da favela. Chamou sua atenção o fato de não haver um só representante do poder público ali, prestando o que deveria ser a função governamental. “O que me impressionou mais foi a união, o poder que o Gilson tem de mobilização dentro da comunidade toda”, explica o profissional.

Suas imagens retratam essa atuação conjunta, uma espécie de empatia coletiva sobre o que está acontecendo. Ainda que nem todos respeitassem a quarentena. “Muita gente ainda não entende o que é a Covid-19. Fora o que o governo está fazendo para confundir a população, dizendo ser só uma gripezinha. Muita gente está brincando com o corona ou tinha vergonha de assumir, não avisavam vizinhos”, explica. “Parecia um tabu social”.

Sem ‘mistura’ na geladeira, cuidadora ajuda os demais[editar | editar código-fonte]

Empatia, de fato, é uma palavra importante para quem abraça a ideia e as ações locais. Sentir a dor do outro parece mais importante do que encarar as próprias dificuldades, mesmo sem saber como será o futuro. É o caso de Cláudia Regina di Silvério, 48 anos, 18 deles vividos em Paraisópolis, responsável por encaminhar cestas básicas, álcool em gel e máscara a essas pessoas.

Mãe de três filhos, de 9, 10 e 23 anos, ela é responsável por atender idosos na Rua Nova. Muitos deles contam apenas com a força dos vizinhos. Filhos, netos e outros parentes os abandonaram. Na pandemia, dependem da solidariedade de pessoas como Cláudia.

Natural de Santos, Cláudia chegou em Paraisópolis movida por uma paixão. “Encontrei um amor”, relembra. Agora, depois de quase duas décadas, vive de cuidar de crianças — além das suas. Das nove que atendia antes da pandemia e assim garantia o sustento dos seus próprios filhos, apenas uma segue sendo cuidada por ela, porque os familiares continuam trabalhando, mesmo com Codiv-19 e isolamento social. Os pais dos demais conseguiram se confinar. A renda de Cláudia sumiu.

“Eu recebi auxilio [emergencial, do governo federal] de R$ 1,2 mil. Disso, R$ 550 foi de aluguel, paguei umas contas, comprei algumas coisas e acabou. A nova parcela está prevista para o dia 25. É bem complicado”, confessa. Além de cuidadora, consegue complementar a renda vendendo bolos, poucos, já que não há festas durante o isolamento social. Ainda assim, consegue olhar para outras realidades além da sua.

“Tem uma família que atendo que tem o pai, sobrinho e três crianças, abandonadas pela mãe. Ele sai para trabalhar 4h30 e eles esperam os voluntários irem com marmita, não comem café da manhã”, conta. “É chorar de noite, viu. Lembro das pessoas… Fico bem emotiva”, diz Cláudia, sabendo que sua realidade também está longe de ser tranquila.

“Não tem mistura mais em casa. Meu filho mais velho teve o salário reduzido. Vamos empurrando e assim vamos indo”, admite. “Eu não sei nem explicar. Acontece tanta coisa que você vê que seu problema é tão pequeno”, diz.

Enquanto deixa seus problemas de lado, vê nas realidades de fora uma forma de ver a vida com um olhar mais otimista, humano. “Todos ajudam as famílias. São pessoas que ficam bem agradecidas. Os idosos ficam bem gratos, pois a maioria fica só, não tem neto, não tem filho, são sozinhos. É tão complicado querer ajudar mais e não conseguir…”, finaliza.

Veja o ensaio fotográfico[editar | editar código-fonte]

Voluntária atende moradora em Paraisópolis - Foto de Gui Christ - National Geographic
Doutor Ricardo Vieira da Silva é um dos que trabalha em Paraisópolis - Foto de Gui Christ - National Geographic
Atendimento das enfermeiras contratadas pela comunidade - Foto de Gui Christ - National Geographic
Idosa moradora da favela é uma que recebeu auxílio - Foto de Gui Christ - National Geographic
Retrato de morador, que se protege com máscara do vírus - Foto de Gui Christ - National Geographic
Treinamento em escola para os voluntários - Foto de Gui Christ - National Geographic
Fausto Viana em sua laje na favela - Foto de Gui Christ - National Geographic
Sala de escola virou dormitório para infectados - Foto de Gui Christ - National Geographic
Preparação das marmitas que são distribuídas em Paraisópolis - Foto de Gui Christ - National Geographic
Vista geral da favela de Paraisópolis, a segunda maior de São Paulo - Foto de Gui Christ - National Geographic


Este ensaio fotográfico foi financiado pelo Fundo de Emergência para Jornalistas da National Geographic Society