Pele alvo: a cor da violência policial (relatório)

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco


O boletim da Rede de Observatórios da Segurança trata de um racismo declarado que se pratica com a anuência de autoridades e a naturalização de boa parte da sociedade. O estudo Pele alvo: a cor da violência policial, com dados obtidos via Lei de Acesso à Informação, aponta que a cada quatro horas uma pessoa negra é morta em ações policiais em seis dos sete estados monitorados pela Rede: Bahia, Ceará, Piauí, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. O governo do Maranhão não acompanha a cor das vítimas da violência – uma outra forma de racismo institucional.

Autoria: Relatório elaborado pela Rede de Observatórios da Segurança.
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Sobre o relatório[editar | editar código-fonte]

Os dados obtidos são do ano de 2020 e mostram que mesmo em um contexto de crise sanitária mundial o racismo não dá trégua e, pelo contrário, mata ainda mais, tanto por vírus como por tiro. Foram 2.653 mortes provocadas pela polícia com informação racial nos seis estados da Rede e 82,7% delas são pessoas negras. Essa é a segunda vez que a Rede de Observatórios analisa os números das secretarias de segurança dos estados que monitora, a primeira edição da pesquisa aconteceu no ano passado.

Mais uma vez, o Rio de Janeiro é o estado que mais mata pessoas negras em ações policiais com 939 registros entre os 1092 mortos que tiveram a cor/raça informada. Porém é a Bahia que novamente apresenta a maior porcentagem de mortes de pessoas negras por agentes do estado com a polícia mais letal do Nordeste. Em Pernambuco, houve um aumento de 53% de mortes provocadas por ação de agentes do estado, com um salto de 93% para 97% de pessoas negras entre as vítimas de um ano para o outro.

Pela primeira vez, a Rede de Observatórios apresenta também os números das capitais. Surpreendentemente todos os mortos pela polícia em Recife, Fortaleza e Salvador eram pessoas negras. Teresina e Rio de Janeiro chegaram perto dessa marca, registrando respectivamente 94% e 90% de negros mortos pelas polícias, respectivamente.

A cor da violência em cada estado[editar | editar código-fonte]

Bahia[editar | editar código-fonte]

A cidade em que mais pessoas negras morrem em ações policiais no Brasil, fica na Bahia, é Santo Antônio de Jesus, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Não à toa, o estado ocupa a terceira posição entre os que possuem o maior número de mortos (595), ficando atrás apenas do Rio de Janeiro (939) e São Paulo (488), que é o estado mais populoso do Brasil. No entanto, a polícia da Bahia segue sendo a mais letal do Nordeste e entre todos os estados da Rede é a que apresenta o maior percentual de pessoas negras mortas em ações policiais, com 98%. Já na capital Salvador todas as vítimas da polícia são negras.

Ceará[editar | editar código-fonte]

No Ceará, negros tem sete vezes mais chances de serem mortos do que não negros. e a letalidade policial oscilou para cima na comparação entre 2019 e 2020 no que diz respeito aos números gerais. Quando observamos a cor das vítimas, notamos uma discrepância entre o percentual da população negra na população em geral (62,3%) no Ceará e no percentual de pessoas negras vítimas de agentes estatais (87,2%). Isso porque o estado é um dos que mais acumulam problemas com relação ao acompanhamento da cor das vítimas. São 106 vítimas incolores contra 39 com identificação racial. Na capital Fortaleza, 100% dos mortos pela polícia com identificação racial são negros.

Maranhão[editar | editar código-fonte]

No Maranhão, a cor das vítimas da polícia está estampada nos jornais enquanto o governo, que se diz progressista, sustenta um apagão de dados e simplesmente não acompanha a cor das vítimas policiais no estado. Mais é possível saber o número de pessoas que foram vitimadas por policiais no Maranhão no total e o número subiu de 72, em 2019, para 97, em 2020. A variação entre um ano e outro foi de 35%

Pernambuco[editar | editar código-fonte]

As mortes por intervenção policial mais que dobraram (53%) em todo o estado e aumentou também a proporção de negros mortos nessas ações que chega a 97%. No total, 113 pessoas foram vítimas de ações policiais no estado. Dessas, 109 eram pessoas negras, três brancas, e em um caso não foi possível identificar a cor da pele. No ano anterior, o total de pessoas mortas pela polícia em Pernambuco foi de 74 casos, e 93% eram negras. Quando se analisa o percentual de pessoas negras mortas pela polícia nas capitais dos estados, Recife mostra que todas as pessoas mortas pela polícia no município são negras. Isso mesmo, o percentual é de 100% das pessoas negras mortas pela polícia em 2020.

Piauí[editar | editar código-fonte]

No Piauí, 91% das vítimas da violência letal da polícia no estado do Piauí são negras. Nessa mesma direção, a capital Teresina ocupa o terceiro lugar das capitais monitoradas, com 94% de letalidade da população negra por atividade policial. Esse número expressa uma realidade preocupante. Destaca-se ainda que 73% da população declararam-se negros no Piauí. Tais dados reunidos configuram um genocídio negro em curso.

Rio de Janeiro[editar | editar código-fonte]

Assim como em anos anteriores, o Rio de Janeiro segue sendo o estado que mais produz mortes em ações e intervenções das polícias. Foram 1.245 mortes no ano de 2020, uma redução de 31% em comparação com o ano de 2019. Contudo, é importante frisar que mesmo nesse contexto, o valor é o terceiro maior registro de toda a série histórica. Entre os mortos pela polícia, 86% são pessoas negras. A capital carioca também é a que registrou o maior número total de mortes, com 415 registros. No município do Rio de Janeiro, 90% dos mortos em ações policiais são negros.

São Paulo[editar | editar código-fonte]

Foram 814 mortos pela polícia de São Paulo em 2020. Do total de homicídios, houve registro de raça das vítimas em 770 ocorrências. Em 63% dos casos, as vítimas eram negras. A proporção de pardos e pretos entre os mortos é quase o dobro do percentual desse mesmo grupo na população paulista (35%). A situação se inverte no caso dos brancos, que representam 64% da população de São Paulo, enquanto 36% entre os mortos pela polícia. Quando olhamos só para a capital o percentual de negros mortos pela polícia é de 69%, mas em número de casos, o município de São Paulo (317) só perde para o Rio de Janeiro (415).


Acesse o estudo completo neste link.

Relatório completo[editar | editar código-fonte]

Sobre a Rede de Observatórios[editar | editar código-fonte]

Após dois anos operando na produção cidadã de dados em cinco estados, a Rede de Observatórios, projeto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), com apoio da Fundação Ford, chegou ao Maranhão e ao Piauí no segundo semestre deste ano. A Rede de Estudos Periféricos, da UFMA e IFMA, e o Núcleo de Pesquisas sobre Crianças, Adolescentes e Jovens, da UFPI se unem a Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas (INNPD); Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop); Laboratório de Estudos da Violência (LEV/UFC) e ao Núcleo de Estudos da Violência (NEV/USP). O objetivo é monitorar e difundir informações sobre segurança pública, violência e direitos humanos.