Festa na Laje: mudanças entre as edições
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Nas favelas cariocas a laje é local de sociabilidade desde a sua concepção, onde moradores se juntam para ajudar na construção desse | Nas favelas cariocas a laje é local de sociabilidade desde a sua concepção, onde moradores se juntam para ajudar na construção desse cômodo, até sua utilização como espaço para festas seja ela de diferentes matrizes, variando conforme o dono da casa. Podendo ser comemorações religiosas, churrascos, almoços, festas infantis, quinze anos e até comemorações de casamento. | ||
Autoria: Ludmila e Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco. | |||
== | == Sobre == | ||
As festas em lajes nas favelas do Rio de Janeiro são um fenômeno cultural significativo, que reflete a resistência, criatividade e celebração da vida nas periferias cariocas. Essas festas são realizadas nos topos de casas, comumente chamadas de lajes, e servem como espaços de convivência, lazer e expressão cultural para as comunidades. Mais do que simples eventos recreativos, as festas em lajes carregam um profundo significado social, sendo vistas como um símbolo de afirmação identitária e territorial, especialmente em um contexto de exclusão e estigmatização urbana. | |||
A música é um dos elementos centrais dessas festas, com gêneros como o [[Funk Proibidão - Música e Poder nas Favelas Cariocas|funk]], samba e pagode frequentemente presentes. O funk, em particular, é uma forma de resistência cultural nas favelas, trazendo letras que abordam a realidade vivida por seus moradores, como [[Violência de Estado operações policiais chacinas e um plano|violência]], desigualdade e o desejo de ascensão social<ref name=":0">HENRIQUES, Ricardo. ''Funk e sociabilidade: o impacto cultural nas favelas cariocas''. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2018. </ref>. Ao mesmo tempo, essas festas são espaços de sociabilidade, onde vizinhos, amigos e famílias se encontram para compartilhar momentos de alegria, mesmo em meio às adversidades. | |||
Outro aspecto importante dessas celebrações é a vista proporcionada pelas lajes, que muitas vezes oferecem um panorama privilegiado da cidade, com um contraste marcante entre a precariedade das construções e a beleza natural do Rio de Janeiro. Essa posição elevada também reforça a noção de pertencimento e resistência frente às dificuldades que permeiam a vida nas favelas<ref>LEITE, Márcia Pereira. ''Favela, Resistência e Cultura: A Reivindicação do Direito ao Território''. São Paulo: Boitempo, 2019.</ref>. | |||
Além de serem um símbolo de resistência cultural, as festas em lajes também desempenham um papel econômico. Muitas vezes, são organizadas por moradores que aproveitam a oportunidade para gerar renda, seja através da venda de bebidas e comidas, seja pela promoção de eventos musicais. Em um cenário de informalidade econômica, esses eventos se tornam alternativas criativas de subsistência e fortalecimento dos laços comunitários<ref>SILVA, André Luiz. "As Festas nas Lajes e a Economia Informal nas Favelas". ''Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais'', vol. 15, n. 2, 2021.</ref>. | |||
Portanto, as festas em lajes são mais do que simples celebrações; elas representam uma forma de [[Direito à Favela|ocupar o espaço urbano]] com dignidade e alegria, reafirmando o papel das favelas como lugares vivos e pulsantes de cultura. | |||
== Origem == | |||
As festas em laje nas favelas do Rio de Janeiro têm suas origens ligadas ao desenvolvimento das próprias favelas e à dinâmica de ocupação dos espaços urbanos periféricos. Com a expansão das comunidades no início do século XX, as lajes das casas, construídas de forma improvisada e escalonada, passaram a ter um papel central na vida cotidiana dos moradores. Inicialmente, as lajes eram utilizadas como áreas de convivência, lazer e expansão das moradias, e, com o tempo, passaram a ser vistas como lugares propícios para encontros festivos, dada a falta de espaços públicos adequados para lazer nas favelas<ref>LEITE, Márcia Pereira. ''Favela e Convivência: Espaço, Cultura e Sociabilidade nas Favelas Cariocas''. São Paulo: Boitempo, 2019.</ref>. | |||
A cultura desses encontros ganhou força a partir das décadas de 1970 e 1980, quando o processo de urbanização das favelas tornou as lajes não apenas uma extensão das moradias, mas também um espaço comunitário. À medida que a população das favelas crescia e os espaços de lazer e entretenimento eram cada vez mais escassos, as lajes se consolidaram como um lugar de celebração coletiva. Nessas festas, o samba e, posteriormente, o funk, tornaram-se trilhas sonoras emblemáticas, refletindo a identidade e os anseios da população periférica<ref name=":0" />. | |||
O surgimento das festas nas lajes também está relacionado à necessidade de afirmação cultural e resistência frente à exclusão social imposta às favelas. Ao ocupar as lajes para festejar, os moradores ressignificaram o espaço, criando uma forma própria de lazer que resistia à marginalização urbana. Assim, essas festas começaram a incorporar não só música, mas também elementos como a culinária local, a moda e as expressões artísticas periféricas, tornando-se um símbolo de identidade e resistência cultural<ref>VARGAS, Joana. "A Ocupação das Lajes nas Favelas e o Surgimento de Novas Formas de Lazer". ''Revista de Estudos Culturais'', vol. 7, n. 3, 2020.</ref>. | |||
Além disso, essas celebrações refletem a tradicional hospitalidade das favelas, onde os eventos muitas vezes acontecem de forma espontânea e aberta, com vizinhos e amigos compartilhando alimentos, bebidas e momentos de convivência. A laje se transformou, então, em um espaço simbólico, que reforça os laços de solidariedade e pertencimento entre os moradores, servindo de palco para a celebração da vida cotidiana nas favelas<ref>FERREIRA, Paula. ''Ressignificando Espaços: Festas em Lajes e a Sociabilidade nas Favelas do Rio de Janeiro''. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2017.</ref>. | |||
== Importância econômica == | |||
Além da relevância cultural, as festas em lajes nas favelas do Rio de Janeiro desempenham um papel fundamental na economia local, proporcionando alternativas de geração de renda e fomentando a economia informal nas periferias. Em regiões onde o acesso a empregos formais e oportunidades econômicas é limitado, esses eventos se tornam uma maneira criativa e coletiva de mobilizar recursos e dinamizar a vida financeira das comunidades. | |||
Um dos principais aspectos econômicos dessas festas é o comércio local. Durante as celebrações, é comum que moradores vendam bebidas, comidas e até produtos artesanais, gerando uma fonte de renda complementar ou até mesmo primária para muitas famílias. Em áreas marcadas por desigualdade e falta de infraestrutura, essas festas representam uma importante forma de subsistência. Além disso, pequenos empreendedores, como DJs e equipes de som, também encontram nas festas em lajes uma oportunidade de trabalho e divulgação de seus serviços, ampliando suas redes de clientes e fortalecendo a economia criativa nas favelas<ref>SILVA, André Luiz. "As Festas nas Lajes e a Economia Informal nas Favelas". ''Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais'', vol. 15, n. 2, 2021.</ref>. | |||
Outro fator relevante é a organização dos eventos, que muitas vezes mobiliza diversos setores da comunidade. O planejamento e a realização das festas envolvem gastos com equipamentos, alimentação e decoração, estimulando a circulação de dinheiro dentro das favelas e promovendo uma economia de proximidade. Isso reflete o conceito de “economia solidária”, onde o lucro não é o único objetivo, mas sim a geração de benefícios mútuos para a comunidade, reforçando os laços sociais e econômicos locais<ref>SOARES, Beatriz. ''Economia Solidária nas Favelas do Rio de Janeiro: Cultura, Comunidade e Resistência''. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio, 2020.</ref>. | |||
Além do aspecto comercial, as festas em lajes também têm impacto indireto na economia das favelas, como o fortalecimento do turismo periférico. Muitos eventos atraem visitantes de fora das comunidades, que veem nessas festas uma experiência autêntica da cultura carioca, o que, por sua vez, movimenta a economia local e expande as possibilidades de renda<ref>OLIVEIRA, Marcos. "O Turismo Periférico e as Festas nas Lajes: Atração Cultural e Econômica das Favelas". ''Turismo e Sociedade'', vol. 9, n. 1, 2019.</ref>. | |||
Portanto, as festas em lajes nas favelas cariocas vão além da diversão, sendo um motor econômico que fortalece a rede de negócios informais, estimula a economia comunitária e gera oportunidades em um contexto de desigualdade estrutural. | |||
== Vídeo sobre festas na laje == | |||
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== Ver também == | |||
[[Laje e Turismo]] | |||
[[Economia no cotidiano das favelas]] | |||
[[Categoria:Temática - Cultura]] | |||
[[Categoria:Temática - Favelas e Periferias]] | |||
[[Categoria:Temática - Sociabilidade]] | |||
[[Categoria:Festas]] | |||
[[Categoria:Lajes]] |
Edição atual tal como às 10h30min de 18 de setembro de 2024
Nas favelas cariocas a laje é local de sociabilidade desde a sua concepção, onde moradores se juntam para ajudar na construção desse cômodo, até sua utilização como espaço para festas seja ela de diferentes matrizes, variando conforme o dono da casa. Podendo ser comemorações religiosas, churrascos, almoços, festas infantis, quinze anos e até comemorações de casamento.
Autoria: Ludmila e Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco.
Sobre[editar | editar código-fonte]
As festas em lajes nas favelas do Rio de Janeiro são um fenômeno cultural significativo, que reflete a resistência, criatividade e celebração da vida nas periferias cariocas. Essas festas são realizadas nos topos de casas, comumente chamadas de lajes, e servem como espaços de convivência, lazer e expressão cultural para as comunidades. Mais do que simples eventos recreativos, as festas em lajes carregam um profundo significado social, sendo vistas como um símbolo de afirmação identitária e territorial, especialmente em um contexto de exclusão e estigmatização urbana.
A música é um dos elementos centrais dessas festas, com gêneros como o funk, samba e pagode frequentemente presentes. O funk, em particular, é uma forma de resistência cultural nas favelas, trazendo letras que abordam a realidade vivida por seus moradores, como violência, desigualdade e o desejo de ascensão social[1]. Ao mesmo tempo, essas festas são espaços de sociabilidade, onde vizinhos, amigos e famílias se encontram para compartilhar momentos de alegria, mesmo em meio às adversidades.
Outro aspecto importante dessas celebrações é a vista proporcionada pelas lajes, que muitas vezes oferecem um panorama privilegiado da cidade, com um contraste marcante entre a precariedade das construções e a beleza natural do Rio de Janeiro. Essa posição elevada também reforça a noção de pertencimento e resistência frente às dificuldades que permeiam a vida nas favelas[2].
Além de serem um símbolo de resistência cultural, as festas em lajes também desempenham um papel econômico. Muitas vezes, são organizadas por moradores que aproveitam a oportunidade para gerar renda, seja através da venda de bebidas e comidas, seja pela promoção de eventos musicais. Em um cenário de informalidade econômica, esses eventos se tornam alternativas criativas de subsistência e fortalecimento dos laços comunitários[3].
Portanto, as festas em lajes são mais do que simples celebrações; elas representam uma forma de ocupar o espaço urbano com dignidade e alegria, reafirmando o papel das favelas como lugares vivos e pulsantes de cultura.
Origem[editar | editar código-fonte]
As festas em laje nas favelas do Rio de Janeiro têm suas origens ligadas ao desenvolvimento das próprias favelas e à dinâmica de ocupação dos espaços urbanos periféricos. Com a expansão das comunidades no início do século XX, as lajes das casas, construídas de forma improvisada e escalonada, passaram a ter um papel central na vida cotidiana dos moradores. Inicialmente, as lajes eram utilizadas como áreas de convivência, lazer e expansão das moradias, e, com o tempo, passaram a ser vistas como lugares propícios para encontros festivos, dada a falta de espaços públicos adequados para lazer nas favelas[4].
A cultura desses encontros ganhou força a partir das décadas de 1970 e 1980, quando o processo de urbanização das favelas tornou as lajes não apenas uma extensão das moradias, mas também um espaço comunitário. À medida que a população das favelas crescia e os espaços de lazer e entretenimento eram cada vez mais escassos, as lajes se consolidaram como um lugar de celebração coletiva. Nessas festas, o samba e, posteriormente, o funk, tornaram-se trilhas sonoras emblemáticas, refletindo a identidade e os anseios da população periférica[1].
O surgimento das festas nas lajes também está relacionado à necessidade de afirmação cultural e resistência frente à exclusão social imposta às favelas. Ao ocupar as lajes para festejar, os moradores ressignificaram o espaço, criando uma forma própria de lazer que resistia à marginalização urbana. Assim, essas festas começaram a incorporar não só música, mas também elementos como a culinária local, a moda e as expressões artísticas periféricas, tornando-se um símbolo de identidade e resistência cultural[5].
Além disso, essas celebrações refletem a tradicional hospitalidade das favelas, onde os eventos muitas vezes acontecem de forma espontânea e aberta, com vizinhos e amigos compartilhando alimentos, bebidas e momentos de convivência. A laje se transformou, então, em um espaço simbólico, que reforça os laços de solidariedade e pertencimento entre os moradores, servindo de palco para a celebração da vida cotidiana nas favelas[6].
Importância econômica[editar | editar código-fonte]
Além da relevância cultural, as festas em lajes nas favelas do Rio de Janeiro desempenham um papel fundamental na economia local, proporcionando alternativas de geração de renda e fomentando a economia informal nas periferias. Em regiões onde o acesso a empregos formais e oportunidades econômicas é limitado, esses eventos se tornam uma maneira criativa e coletiva de mobilizar recursos e dinamizar a vida financeira das comunidades.
Um dos principais aspectos econômicos dessas festas é o comércio local. Durante as celebrações, é comum que moradores vendam bebidas, comidas e até produtos artesanais, gerando uma fonte de renda complementar ou até mesmo primária para muitas famílias. Em áreas marcadas por desigualdade e falta de infraestrutura, essas festas representam uma importante forma de subsistência. Além disso, pequenos empreendedores, como DJs e equipes de som, também encontram nas festas em lajes uma oportunidade de trabalho e divulgação de seus serviços, ampliando suas redes de clientes e fortalecendo a economia criativa nas favelas[7].
Outro fator relevante é a organização dos eventos, que muitas vezes mobiliza diversos setores da comunidade. O planejamento e a realização das festas envolvem gastos com equipamentos, alimentação e decoração, estimulando a circulação de dinheiro dentro das favelas e promovendo uma economia de proximidade. Isso reflete o conceito de “economia solidária”, onde o lucro não é o único objetivo, mas sim a geração de benefícios mútuos para a comunidade, reforçando os laços sociais e econômicos locais[8].
Além do aspecto comercial, as festas em lajes também têm impacto indireto na economia das favelas, como o fortalecimento do turismo periférico. Muitos eventos atraem visitantes de fora das comunidades, que veem nessas festas uma experiência autêntica da cultura carioca, o que, por sua vez, movimenta a economia local e expande as possibilidades de renda[9].
Portanto, as festas em lajes nas favelas cariocas vão além da diversão, sendo um motor econômico que fortalece a rede de negócios informais, estimula a economia comunitária e gera oportunidades em um contexto de desigualdade estrutural.
Vídeo sobre festas na laje[editar | editar código-fonte]
Ver também[editar | editar código-fonte]
Economia no cotidiano das favelas
- ↑ 1,0 1,1 HENRIQUES, Ricardo. Funk e sociabilidade: o impacto cultural nas favelas cariocas. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2018.
- ↑ LEITE, Márcia Pereira. Favela, Resistência e Cultura: A Reivindicação do Direito ao Território. São Paulo: Boitempo, 2019.
- ↑ SILVA, André Luiz. "As Festas nas Lajes e a Economia Informal nas Favelas". Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, vol. 15, n. 2, 2021.
- ↑ LEITE, Márcia Pereira. Favela e Convivência: Espaço, Cultura e Sociabilidade nas Favelas Cariocas. São Paulo: Boitempo, 2019.
- ↑ VARGAS, Joana. "A Ocupação das Lajes nas Favelas e o Surgimento de Novas Formas de Lazer". Revista de Estudos Culturais, vol. 7, n. 3, 2020.
- ↑ FERREIRA, Paula. Ressignificando Espaços: Festas em Lajes e a Sociabilidade nas Favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2017.
- ↑ SILVA, André Luiz. "As Festas nas Lajes e a Economia Informal nas Favelas". Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, vol. 15, n. 2, 2021.
- ↑ SOARES, Beatriz. Economia Solidária nas Favelas do Rio de Janeiro: Cultura, Comunidade e Resistência. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio, 2020.
- ↑ OLIVEIRA, Marcos. "O Turismo Periférico e as Festas nas Lajes: Atração Cultural e Econômica das Favelas". Turismo e Sociedade, vol. 9, n. 1, 2019.