Policiamento

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
Revisão de 22h30min de 1 de outubro de 2019 por Gabriel (discussão | contribs)

Autores(as): Jacqueline Muniz, Eduardo Paes-Machado.

O fenômeno do policiamento articula-se à noção de controle social e suas dinâmicas na vida social. Consiste em um expediente singular de controle pela ênfase no seu caráter instrumental, isto é, na sua capacidade de produzir efeito inibitório e o mais imediato possível sobre os acontecimentos, as atitudes de indivíduos e grupos. Constitui-se como um variado repertório de meios (vigiar, regular, impor, fiscalizar, patrulhar, guardar, conter, etc.) para determinados fins: a sustentação de um certo status quo, de uma determinada visão e expectativa de ordem que se deseja obedecida e, em alguma medida, consentida pelos indivíduos ou grupos policiados. A natureza política do policiamento se expressa como um agenciamento de meios coercitivos que visam sustentar o exercício de tipos de poder e de autoridade, legais ou ilegais, legítimas ou ilegítimas, que podem ir do extremo da sujeição à obediência negociada. O policiamento caracteriza-se como uma expressão pragmática, funcional, utilitária e invasiva do “como” sustentar a submissão sob algum consentimento às regras do jogo, inclusivas ou excludentes, ou a uma determinada ordem pactuada ou não, com o recurso à coerção respaldada pela força. As práticas de policiamento ultrapassam a administração do Estado, sendo-lhes anteriores historicamente. Pode-se identificar práticas de policiamento que não são administradas por agências estatais, mas por arranjos privados lícitos ou ilícitos, formais e informais, nos quais se incluem os domínios armados que exercem controle territorial ilegal em espaços populares. Tem-se que as práticas de policiamento correspondem às formas concretas de se governar, mais ou menos democráticas, conforme a concepção de cidadania acionada e, por sua vez, o acesso e a extensão dos direitos civis, políticos e sociais. A anterioridade das práticas de policiamento à emergência de burocracias especializadas e estatais na sua administração, põe em relevo duas questões caras à compreensão deste conjunto de práticas sociais de controle e regulação. A primeira é a de que o policiamento não constitui um lugar hegemônico do Estado. Sobretudo quando se considera que a ambição do Estado seja o monopólio legal e legitimo da força e, por sua vez, das práticas de policiamento que expressam e sustentam sua soberania sobre um determinado território e população, assim como os seus dispositivos de governo. A segunda, como decorrência, é que as agências especializadas estatais, as polícias, também não possuem, ainda que isto não seja abertamente assumido em função de uma estratégia de legitimação e ampliação de poder, o monopólio das práticas de policiamento.