Etnografando assaltos contra instituições financeiras - a publicação da pesquisa seus impasses e desdobramentos (Resenha)
Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
Resenha sobre o artigo de Jania Aquino[1], no qual a autora apresenta novas perspectivas sobre o trabalho de campo da autora e como ela estabeleceu relações com seus interlocutores, conhecidos, principalmente, como "assaltantes de bancos" e busca compreender os "assaltantes" para além das categorias criminais que lhes são atribuídas.
Autoria: Marcelo Reis.
Sobre
Jania Perla Diógenes Aquino é uma antropóloga brasileira. Professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), possui Mestrado em Sociologia (UFC, 2004) e Doutorado em Antropologia Social (USP, 2009). As suas linhas de pesquisa perpassam violência, crimes eleitorais e segurança pública. É integrante dos grupos Laboratório de Estudos da Violência (LEV) e Núcleo de Antropologia da Política (NUAP).
Principais argumentos
Em "Etnografando assaltos contra instituições financeiras: a publicação da pesquisa, seus impasses e desdobramentos", Jania Aquino reflete sobre o processo de inserção no campo, desenvolvimento da tese e consequências da publicação após a divulgação de "Príncipes e Castelos de Areia: perfomance e liminaridade nos grandes roubos", defendida no Programa de Antropologia Social da Universidade de São Paulo (USP). O artigo, publicado na Revista Iluminuras em 2015, apresenta novas perspectivas sobre o trabalho de campo da autora e como ela estabeleceu relações com seus interlocutores, conhecidos, principalmente, como "assaltantes de bancos".
Na sua pesquisa, Aquino busca compreender os "assaltantes" para além das categorias criminais e estigmatizantes que lhes são atribuídas. Assim, a narrativa apresentada pela autora inclui, por exemplo, detalhes sobre a vida conjugal e familiar de seus entrevistados. A inserção desse aspecto na tese levou Aquino, posteriormente, a refletir sobre os riscos que isso causava aos interlocutores, dado que suas esposas ou namoradas nem sempre sabiam da existência de outros relacionamentos amorosos. Aquino revela que essa reflexão foi impulsionada por uma troca de mensagens com André, um de seus entrevistados.
Em outro sentido, Aquino revela que um de seus interlocutores se revelou decepcionado com ela ao saber do conteúdo da tese, já que seus feitos não recebiam o mesmo destaque que de outros "assaltantes" que eram seus desafetos. A autora utilizou os dados desse entrevistado, chamado de João no artigo, em publicações futuras. A notícia da inclusão de João em artigos e apresentações, inclusive em âmbito internacional, fez com que o interlocutor se gabasse de sua notoriedade para seus pares, afirmando que seria tema de livros e filmes ao redor do mundo.
A partir desses dois aspectos, a autora aponta para riscos morais que a utilização de depoimentos podem acarretar. Aquino diz que, ao se preocupar em proteger si mesma e os entrevistados de repercussões na Polícia ou no Judiciário, não levou em conta possíveis rebuliços de certos trechos nas relações familiares dos interlocutores. Dessa forma, o texto aponta para a necessidade de se considerar os impactos da produção acadêmica para além dos aspectos normativos e legais, levando a uma reflexão sobre os usos e manipulações da narrativa etnográfica pelos próprios nativos.
Referências
AQUINO, Jania P. D. Príncipes e Castelos de Areia: performance e liminaridade nos grandes roubos. Tese defendida no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade de São Paulo, em agosto de 2009.
FAVRET-SAADA, Jeanne. "Ser afetado”. Revista Cadernos de Campo. São Paulo, USP, 2005.
GOFFMAN, Alice. On the Run: fugitive life in an american city. Chicago: University of Chicago Press, 2014
- ↑ AQUINO, Jania. Etnografando assaltos contra instituições financeiras: a publicação da pesquisa, seus impasses e desdobramentos. Iluminuras, Porto Alegre, v. 16, n. 39, p. 184-210, jan./ago. 2015.