De vez em quando, sangrando (poema)
De vez em quando, sangrando
A sátira da vida é não pertencer a ela É contraproducente Desvio de rota persistente Ser um eterno estrangeiro Ameaçado, criticado, indesejado em sua terra Terra de senhores, de escravizados, de bichos e bichas
Ahh.... As bichas (suspiro)
Descabidas, desvairadas, desbocadas: PERTURBADAS Desgraçadas, desamadas, desalmadas: VILIPENDIADAS Debochadas, desajustadas, desaforadas: MAL AMADAS
De desdisse em desdisse Um vegetal socialmente condicionado O avesso do admirável Revés do respeitado Um constructo milimetricamente planejado Mergulho em poças de exceção
Razão, paixão, desmedida comoção: SUBVERSÃO Reinvindicação, retratação, penalização: TRANSGRESSÃO Chão, emoção, insensato bordão: REVOLUÇÃO
Se de vez em quando sangra O atestado de óbito social não estanca Se clama, se clama, se clama O grito das dores esquecidas A perda da conquista não obtida Crença, reza sem bença, sem bença, bença
A voz, em nós, emaranhados nós: INFINITA FOZ Feroz, algoz, é veloz: ATROZ Logo após, nos cafundós, quem sabe em Oz: OUÇAM A NÓS
O vazio da jornada Silêncio que amedronta O farol que alerta Na esquina, na noite, num quarto qualquer Se quer, me quer, consinto E o próximo, o próximo, o próximo...
São muitos os afoitos, os aflitos Misericórdia! Na contra-história dos oprimidos Erguem-se vozes, abrem-se peitos, mostram-se tetas Uma gente, nova narrativa, uma luta, o recomeço De levianos, gozadores, bravios e transgressores