A invisibilidade social depois da barricada
Barricadas são objetos instalados em vias públicas com objetivo de impedir a passagem de veículos da polícia. No Rio de Janeiro, elas geralmente estão presentes em regiões de favelas e periferias e, nesses casos simbolizam limites de atuação do Estado, no que diz respeito à garantia de condições dignas de sobrevivência. Para além das barricadas, são ignorados e/ou desrespeitados direitos essenciais descritos na Constituição Federal, como o direito à moradia, educação, segurança, lazer, inviolabilidade do domicílio e ao saneamento básico.
Autoria: Thais Aparecida
Sobre[editar | editar código-fonte]
Todo brasileiro é detentor de direitos sociais e garantias fundamentais como elenca a Constituição Federal, mas atualmente existem lugares que infelizmente sofrem uma inflição por parte do próprio Estado, aquele que deveria zelar por eles.
Como existem, entre divisas de municípios, placas que demonstram o limite entre um município e outro, no Rio de Janeiro existem as barricadas, (que são compostas por trilhos de linha férrea, sofás, caçambas de lixo, articulados compostos por diversos utensílios que impeçam a chegada da policia), essas barreiras funcionam como essas placas, mas neste caso o objetivo é demostrar que ali o Estado não opera e que os direitos básicos elencados pela Constituição Federal como o direito à moradia, educação, segurança, lazer, inviolabilidade do domicílio e o direito ao saneamento básico são ignorados e desrespeitados pelo poder público.
A analogia que foi utilizada é para ilustrar que as barricadas são sinais de invisibilidade social, escassez, miséria e passe livre para ofensa aos direitos dos moradores. Após essas barreiras, vemos a falta de políticas públicas. O Portal G1 apresenta um índice alarmante: a Polícia do Rio de Janeiro viola os direitos dos moradores da comunidade da Maré quatro vezes mais do que os criminosos. Isso é uma realidade não somente na comunidade da Maré, mas em todas as comunidades do Rio de Janeiro.
Mas por que isso acontece? A resposta se encontra na inflição dos direitos pois, se há uma operação policial não haverá aula e consequentemente os alunos que ali residem tem o seu direito a educação violados pelo próprio Estado, por um conflito no qual este já se mostrou incapaz de resolver, pois não se combate criminalidade com violência, se começassem a construir uma comunidade saciando a sede de politicas publicas seria um caminho mais efetivo na busca do combate ao crime.
As operações policiais revelam um conjunto de direitos frequentemente ignorados, como o direito de ir e vir, o direito à segurança e a inviolabilidade do domicílio. É comum que moradores se deparem com a polícia dentro de suas casas, sem um mandado e fora do horário permitido. Essa situação ocorre com frequência e parece que nunca vai cessar, dada a falta de fiscalização e punição, diferente do que acontece nas residências da pista (onde o poder público atua efetivamente com políticas públicas e respeito aos direitos sociais e garantias fundamentais).
Veja o que diz o inciso XI do Artigo 5º da Constituição Federal
A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial […].
Este é um direito resguardado pela constituição, mas somente os moradores das comunidades não possuem. Uma pesquisa feita pela Redes da Maré aponta que **35 casas na comunidade foram invadidas por criminosos ou policiais** no ano de 2020.
“A última operação que teve eles entraram na casa, quebrou as coisas, quebraram televisão, furaram piscina que estava na laje que era de morador, piscina de criança, assim, a gente fica assustado, né?”, disse uma moradora.
Se ampliássemos este estudo para a atualidade e para um maior número de comunidades no Rio de Janeiro, os resultados seriam preocupantes, já que muitos residentes vivem em condições sem dignidade, direitos e visibilidade. A filósofa Simone de Beauvoir fala sobre o conceito de invisibilidade social, que se refere a grupos sociais que parecem não existir. Podemos relacionar esses indivíduos com a situação descrita pela filósofa, pois o conceito de invisibilidade social está ligado à sociedade atual, onde as pessoas são separadas por classe, renda e ambiente em que vivem (CELEGUIM; ROESLER, 2009).
A vulnerabilidade da comunidade vai além das questões financeiras, abrangendo também a falta de saneamento básico e coleta de lixo. Estes são essenciais para a preservação da saúde pública e do meio ambiente, pois impedem a propagação de doenças. É um direito dos indivíduos ter acesso a esses serviços. Historicamente, a ausência desses elementos podem resultar em problemas sérios, como altas taxas de mortalidade infantil e doenças como parasitoses, diarreias, febre tifoide e leptospirose. Estes são problemas que remontam aos tempos medievais, mas que têm solução desde os anos 1940, com a comercialização dos serviços de saneamento. Com os recursos e tecnologias disponíveis hoje, esses problemas não deveriam persistir.
Como moradores das comunidades do Rio de Janeiro e de outras áreas, é evidente que somos frequentemente ignorados e privados de direitos fundamentais, salvaguardados pela Constituição Federal do Brasil. A diferença de tratamento é clara - assim que atravessamos a barricada, a Constituição parece não se aplicar mais, e a invisibilidade se instala. Existem várias formas de invisibilidade que experimentamos. Sentimo-nos desvalorizados quando não podemos pedir um lanche no Ifood, pois é considerado uma "área de risco", ou quando não podemos comprar pela internet, já que a entrega não é garantida por ser uma "área de risco". A necessidade de se deslocar para realizar uma compra ou venda, pois ninguém quer assumir o risco de entrar em uma área considerada perigosa, é outra fonte de indignidade. A cada dia, nossa dignidade é mais prejudicada, nossos direitos são mais violados e nossa invisibilidade é reforçada. Ler a Constituição Federal como um morador de comunidade é uma constatação dura: na teoria é belo, mas na prática, a realidade é outra. E o pior é saber que você é a vítima da violação de direitos e a União, o Estado e os municípios são os próprios culpados.
Referências bibliográficas[editar | editar código-fonte]
CELEGUIM, C.R. J.; ROESLER, H. M. K. N. A Invisibilidade Social No Âmbito Do Trabalho. Revista Científica da Faculdade das Américas, v. 3, n. 1, 2009.–1º semestre de 2009.PAG 3 a 10