Poesia, favela e Baixada - cultura e acesso (poema)

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
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Dentro desse verbete vou trazer poesias que, a partir da escrevivência traduzam a realidade de um jovem negro periférico da baixada fluminense. Eu falo de um território que é esquecido dentro da Baixada, São João de Meriti. Um território que muitas vezes não é conhecido pelos próprios moradores da baixada, esse município é extremamente pobre na sua maioria, e o acesso a cultura é limitado dentro da cidade. Enquanto referência temos a casa da cultura que fica em frente a praça da prefeitura e temos em construção o memorial do Marinheiro João Cândido, um herói nacional negro. Mas há um problema, o acesso à cultura está centralizado em apenas um ponto de um município de 35,216Km² e que contém incríveis 440.962 habitantes. O investimento em cultura, lazer e esporte se limita a construção de praças. Aqui nesse espaço virtual espero construir um mural de poesias, fotos e localizações que coloquem espaços culturais da cidade em evidencia e que principalmente o Jovem, negro, favelado de São João de Meriti tenha um espaço para a postagem e demonstração do que se produz nas favelas da Baixada.

Poesia: Baixada cruel

Um mundo sádico e violento, violência? Isso aqui é normal

ando neurótico pelas esquinas

me afogo nas drogas, fácil acesso a drogas

talvez entorpecendo minha mente a dor que eu sinto alivia

a cada rua, a cada esquina, a cada situação que eu vejo, me situa e me deixa mais puto com a realidade

ando olhando para o celular, como sempre o celular

me distraindo e enchendo minha mente de informação

eu já nem penso em quem eu sou ou como estou

e o meu povo tão alienado só para avisar, da barricada para cá o mundo é diferente

o mundo tem outro sentido

outra rotação, outra formação, outra direção, sempre com contenção e jamais na infração.

sigo firme e desconfiado, vivendo de trago em trago

olhando esse mundo de forma diferente me deixando intrigado com essa realidade

da conformidade com o inconformável

do medo velado e da fome insaciável

sigo vivendo em um mundo instável em que ódio e felicidade andam lado a lado

e sabe o que me deixa mais intrigado ?

com o menorzin no 12 ninguém está preocupado !


Poesia: eu até queria falar sobre amor

como pude ir pensando na volta?

na revolta eu sigo por aí

andando com rumo e sem direção

ter na minha mente e corpo muita disposição

e não me olhe assim pois a vida é engraçada

feitas de fases

fases de agonia e alegria

várias covardias

mundo cruel e sádico

ando batendo muita neurose

mas eu não me atrapalho, não uso atalho

apenas existo e qual amor maior, se não o meu

por que tanto amor pro mundo ?

por que tantos amores confusos ?

relações sociais, caos social

amores fatais, mentes fracas e corrompidas

ando, ando, ando e nunca chego

falo, falo, falo e ninguém me escuta

talvez eu escreva para cegos

ou fale para surdos

nesse mundo me sinto um rato

ando sempre escaldado

o mundo me abomina mas eu existo

sempre querendo passar despercebido

pessoas pensam que eu sou metido

talvez vestindo a "marra" eles me respeitem

me julgam pois falo diferente, me visto diferente e eu sou diferente

vejo o mundo de outro lugar

aqui faz frio no verão

paz e guerra, amor e ódio

essa poesia era para falar de amor

me desculpe, mas é muito ódio acumulado.


poesia: coisa de preto

me entorpecendo e tentando ficar inconsciente

mas, conscientemente eu vivo a dura realidade.

eu sou o povo daqui e represento o povo daqui.

é assim minha pele é igual um finin' de ouro

reluz em qualquer lugar que eu chego

chama atenção e sempre sobre tensão

vivo o meu dia normal, como se tudo aquilo fosse normal

mas será que eu sou anormal? sempre pensando e me torturando

o que me difere dele? E por que o espanto?

mas é esse olhar, é aquele olhar que você conhece

eu consigo enxergar, eu vejo no meios de todos olhares

eu te enxergo e é assim que eu vivi e vivo

espaços rejeitam minha pele, minha voz

eu falo preto, ando preto

sou preto, me comunico preto

tenho gíria de preto, ando igual preto

eu sou preto e carrego muitas coisas de preto

minha mãe é branca e nem me entende

até hoje não esqueço

um branco achando que eu roubei uma banana

tão novo eu nem entendia a crueldade daquele momento

imagina desde cedo tanto sofrimento, só minha mãe enquanto exemplo

sempre o risonho, sério

neuroses que eu não sei explicar

talvez em algum momento eu consiga me expressar.