Diversidade cultural na Zona Oeste do Rio de Janeiro (relatório)
Este verbete destaca a importância do acesso à cultura como um direito universal, citando documentos como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Constituição Federal do Brasil. Ele também discute a falta de políticas públicas culturais efetivas na Zona Oeste do Rio de Janeiro, mencionando a situação de vários espaços culturais na região, incluindo a Lona Cultural Elza Osborne, a Areninha Carioca Hermeto Pascoal, a Areninha Carioca Gilberto Gil e a Lona Cultural Sandra de Sá. O texto enfatiza a necessidade de investimento e valorização desses espaços para garantir o acesso à cultura na comunidade local. Além disso, destaca a importância dos coletivos culturais na região.
Autoria: Mandato do vereador William Siri.
Cultura como direito, sua negação como motivo de luta![editar | editar código-fonte]
Você sabia que acesso à cultura é um direito de todos? Os direitos culturais estão expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e aqui no Brasil estão também garantidos na nossa Constituição Federal de 1988, no artigo 215 está escrito: “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”. Portanto, temos claro que é papel do Poder Público financiar as atividades culturais em suas pluralidades e garantir a participação popular no desenvolvimento, gestão e aplicação de políticas culturais.
Não é nossa intenção levantar um debate conceitual sobre Cultura, mas apontamos para a totalidade da palavra que remonta os termos do latim “colere”, “cultus”, significando tanto cultivo, agricultura, quanto serviço religioso, forma de vida, formação, sociabilidade e moda. Cultura como toda manifestação da vida, não como algo fragmentado em níveis ou esferas. Não iremos aqui, de maneira alguma, hierarquizar manifestações culturais ou encaixá-las em divisões reducionistas[1].
Na Zona Oeste do Rio de Janeiro, como em boa parte dos subúrbios e periferias das cidades pelo Brasil, a negação do direito à cultura é a regra. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostram que quase 60% da população brasileira nunca foi a um teatro ou a um show de dança e aproximadamente 70% jamais esteve em museus ou centros culturais. É visível os desafios que enfrentamos para democratizar o acesso às diversas manifestações culturais pelo país, os abismos que ainda existem para que as camadas mais pobres acessem seus direitos garantidos na Constituição precisam ser combatidos.
Como precisamos estabelecer recortes e estamos aqui para direcionar o olhar para a Zona Oeste do Rio de Janeiro, reflita conosco: quantas peças de teatro você já assistiu na ZO? Quantos museus já visitou pela região? Já foi em alguma mostra de cinema, música, pintura, escultura ou qualquer outra atividade artística na Zona Oeste? Suas respostas, provavelmente, virão ao encontro da razão principal deste dossiê: questionar e debater a escassez de políticas públicas culturais efetivas para a Zona Oeste, além de cobrar e propor à Prefeitura um projeto político-cultural mais consistente para a região que concentra a maior parte da população da cidade.
Eu quero reforçar que mesmo em meio a um cenário de desinvestimento, crise, ausência de espaços públicos destinados às atividades culturais e a não prioridade da Zona Oeste diante do eixo turístico-cultural estabelecido no Centro e na Zona Sul, ainda assim há muita cultura produzida nos diversos bairros da ZO, fruto do encontro de movimentos e coletivos nas ruas e praças e da resistência que é histórica na região, são a essas ações e memórias que somamos força para resgatar e dar continuidade na luta e na construção de ambientes culturais livres, democráticos e diversos por toda a Zona Oeste.
As condições dos equipamentos culturais públicos na Zona Oeste[editar | editar código-fonte]
Durante os meses de agosto a outubro, nosso mandato visitou os espaços públicos de cultura na ZO que estão sob a gestão municipal, conversamos com gestores e com a população para entender a importância desses espaços para a comunidade local e os desafios que são enfrentados no cotidiano. Começamos pela Lona Cultural Elza Osborne, em Campo Grande, um espaço muito importante e que foi palco de inúmeras atividades culturais nas últimas décadas. Foi a pioneira no projeto das Lonas Culturais na cidade do Rio de Janeiro, criada em 1993 no então Teatro de Arena Elza Osborne, sede da União de Grupos e Artistas de Teatro da Zona Oeste (UGAT-ZO), onde, na época, seu gestor, Ives Macena, propôs a reutilização de uma das tendas da conferência ambiental Rio Eco 92. Devido ao sucesso alcançado, a iniciativa foi replicada pelo município, principalmente nas Zonas Norte e Oeste, e outras nove lonas foram criadas como forma de descentralizar as atividades culturais na cidade.
A lona de Campo Grande se tornou um ponto de referência para os fazedores de cultura e para a população da região, mas um espaço tão importante como este precisa de investimentos e valorização constante do poder público. A infraestrutura necessita de melhorias urgentes, a restauração do teto do equipamento é fundamental pois nos períodos de chuva goteiras generalizadas dificultam a realização de eventos e espetáculos.Você já assistiu alguma apresentação na Lona Cultural Elza Osborne? Já se apresentou ou conhece alguém que tenha se apresentado lá? Para quem não conhece, a lona é um espaço com capacidade para 400 pessoas e recebe artistas locais e de projeção nacional em atividades diversas: teatro, música, dança, debates entre outras coisas e está localizada bem no centro de Campo Grande.
Contudo, devido aos problemas infraestruturais e a fortes chuvas, a lona está interditada e as atividades foram suspensas. Cobramos da prefeitura um plano de ação mais rápido para que a lona cultural de Campo Grande volte a desempenhar sua importante função social na garantia de direitos à cultura e à educação.
Outro ponto cultural de significativa relevância é a Areninha Carioca Hermeto Pascoal, em Bangu, fruto da reivindicação da comunidade de Bangu e adjacências a partir da mobilização de agitadores culturais, artistas, intelectuais e líderes comunitários para a construção de um espaço democrático e de estímulos ao desenvolvimento de empreendimentos culturais como teatro, música, desenho e etc. A Areninha é um aparelho público que tem por objetivo atender a população e oferecer garantias aos direitos culturais das comunidades locais, sendo um equipamento importante como instrumento de acesso ao lazer por meio da participação em eventos que apresentam e valorizam a cultura local e a de outras regiões do país, além de trazer grandes ídolos do cenário nacional e talentosos artistas locais para se apresentarem em Bangu.
Estivemos na arena e encontramos uma boa infraestrutura: Lona, palco e camarins em bom estado. Na área externa tem um espaço que serve como palco externo, um pequeno acervo com exposição sobre o Hermeto Pascoal e espaços para a socialização com bancos e cadeiras. Durante a pandemia, a gestão da Lona, feita pela ONG Subúrbio Carioca, coordenada pelo Zinho, distribuiu cestas básicas para os artistas que tiveram seus rendimentos comprometidos, através de contato com a CUFA (Central Única das Favelas).
Aulas de teatro são oferecidas gratuitamente e muito procuradas pela comunidade local, outras atividades como dança de salão e zumba, aulas de violão e canto retornarão a preços populares. Uma importante parceria é realizada com as escolas municipais através do contato com a 8a CRE, diversos alunos e alunas visitam o local e assistem aos espetáculos, devido ao cenário pandêmico tais eventos estão suspensos, mas a gestão do espaço não vê a hora dessas atividades retornarem! Nosso mandato luta por mais espaços de cultura, gratuitos e democráticos, mas também celebra os espaços existentes, locais que trazem vida, arte, cultura e que devem estar cada vez mais abertos ao acesso de todos.
A Areninha Carioca Gilberto Gil fica na praça da Capelinha entre os bairros de Realengo, Magalhães Bastos e Sulacap. Criada em 1998, este equipamento também é fruto de luta coletiva e de uma ampla campanha para instalar na praça uma das tendas usadas na ECO- 92. Nas últimas décadas, o espaço vem interagindo com diversos tipos de produções artísticas, oferecendo oficinas de artes cênicas, música e atividades para os idosos, o objetivo principal é apresentar atrações que possam interagir e melhorar a qualidade de vida da comunidade.
Hoje o espaço oferece muitas atividades a preços populares (entre 30 e 40 reais): 1.Atendimento com psicólogo gratuito na primeira sessão e com preço popular nas seguintes; 2. Aula de capoeira para crianças e adultos; 3. Curso de teatro; 4. Aula de violão; 5. Dança de salão; 6. Yoga; 7. Ballet com turmas baby class, crianças e adolescentes; 8. Dança do ventre e cigana. 9. Feira comunitária de artesanato e gastronomia.
A infraestrutura está em boas condições, e os gestores Naldo e Francisco nos apresentaram o espaço de forma muito atenciosa, relataram apenas problemas com a sala de dança que está com infiltrações e com o espelho que precisa ser trocado. O espaço recebe cerca de R$16.500,00 mensais para pagar todas as contas, prestadores de serviços e realizar as atividades, segundo os gestores a verba não é suficiente para tornar o espaço grandioso como já foi no passado.
É fundamental desenvolver mecanismos que facilitem o acesso da população da Zona Oeste aos produtos culturais desenvolvidos neste espaço, a partir de ingressos a preços populares e eventos com a entrada franca, com atividades que atraiam mais crianças, jovens e adultos para a atmosfera da cultura e das artes. Para que isso aconteça, a Prefeitura deve direcionar mais investimentos para realização de mais atividades e eventos, pois sabemos que as políticas culturais são essenciais na formação de indivíduos participativos, autônomos e críticos.
Um dos momentos mais difíceis para a realização deste relatório foi se deparar com o estado de abandono da Lona Cultural Sandra de Sá, em Santa Cruz. Inaugurada em 2004, com um show da cantora Sandra de Sá para mais de mil pessoas. O equipamento tem dois pavilhões, continha uma biblioteca e parque infantil, mesa de jogos e campo de futebol society. A parte coberta tem capacidade para 500 pessoas e recebia espetáculos diversos, além de oficinas de desenho, teatro, futebol, dança de salão, percussão e lambaeróbica, todas gratuitamente.
Hoje, o espaço está totalmente degradado, sem a mínima condição de uso. A Lona está completamente rasgada, com enormes quantidades de entulho na parte interna e não exerce nenhuma função social junto à comunidade local. Você acha que um equipamento cultural grandioso como este estaria nesta situação de descaso e destruição se estivesse na Zona Sul da cidade? Acredito que sua resposta será NÃO! A desigualdade na implantação de políticas culturais e de manutenção dos aparelhos existentes na cidade, principalmente na Zona Oeste, tem nos legado um histórico de exclusões e marginalizações, é só olharmos para o descaso com a Lona Cultural Sandra de Sá. Um equipamento com grande potencialidade que poderia estar garantindo, em um bairro pobre da cidade, um mínimo de acesso à cultura, à arte e ao lazer.
Reforço aqui meu compromisso de lutar pela restauração, conservação e ativação da Lona Cultural de Santa Cruz, seu potencial para transformação da realidade local é gigantesco e por isso cobramos do prefeito e da Secretaria de Cultura um resposta a este descaso e abandono, a lona Sandra de Sá deve voltar a ser um espaço democrático de construção coletiva de cultura para todos e todas!
Outro espaço cultural de grande importância para a Zona Oeste e que não poderia deixar de entrar neste dossiê é a Arena Carioca Abelardo Barbosa/Chacrinha, em Pedra de Guaratiba. Possuindo um múltiplo espaço para espetáculos como arena ou palco italiano, capacidade para 300 lugares e com área externa que também pode ser usada para apresentações. Este equipamento pode ser utilizado de variadas formas dependendo das características da atividade cultural, um espaço multiuso que deve sempre estar a serviço dos grupos culturais locais e da comunidade.
Um olhar sobre os coletivos da Zona Oeste[editar | editar código-fonte]
Espaço Cultural Raízes do Gericinó: Casa Bumba meu Boi em Movimento[editar | editar código-fonte]
Você sabia que em Bangu existe um projeto que possibilita o encontro entre a cultura carioca com a cultura maranhense? O Raízes do Gericinó, localizado próximo ao Catiri, é uma ONG que atua no território através da cultura popular, oferecendo para as famílias das comunidades do Catiri, alfabetização infantil, curso de corte e costura, rodas de vivências, atendimento psicológico, projeto de nutrição alimentar e muitas outras atividades ao longo do ano.
A missão do Raízes, nas palavras de Auricelia Mercês, é “contribuir para a transformação social, visando o benefício da Zona Oeste do Rio de Janeiro, por meio da cultura popular, da arte, da educação, promovendo diversidade cultural na convivência familiar e comunitária”. Para isso, ela defende que o diálogo com a comunidade deva começar pelo pertencimento, trabalhando a partir dos afetos que os moradores têm pela região e, dessa forma, as necessidades sociais aparecem para serem trabalhadas e debatidas.
A casa também é um museu que guarda a memória da família vinda do Maranhão, e, em datas festivas, realiza-se apresentações do bumba meu boi e rodas de coco e jongo. O museu é aberto para a visitação guiada pelas gestoras do espaço, que ao final da exposição, recitam uma bela poesia de cordel, escrita no contexto da mudança do Maranhão para a Zona Oeste do Rio de Janeiro. Um dos projetos, como o da formação em corte e costura, que é voltado para as mulheres da região, funciona de modo a possibilitar a geração de renda, a interação e partilha entre as mulheres, enquanto elas aprendem ou aperfeiçoam o ofício, valorizando a cultura do folclore e do bumba meu boi.
Nesse contexto, são inúmeros os desafios enfrentados para continuar com o trabalho nas comunidades que englobam o Catiri. As gestoras do espaço dependem de editais de fomento à cultura, entretanto, como Célia é suplente em cultura popular, logo não pôde se inscrever no FOCA - Edital de Fomento à cultura Carioca, pois alega-se cargo de funcionária pública. Todavia, ela não recebe para exercer essa função, que é nada mais do que participação popular, participação essa que precisa ser cada vez mais estimulada entre os produtores culturais da Zona Oeste, porém, com a restrição em se inscrever em editais, como fazê-lo? A participação popular não deveria impedir que produtores acessem os recursos dos editais. A casa “Raízes do Gericinó” possui funcionárias voluntárias e as dificuldades financeiras para sustentar os projetos sociais não param de crescer, infelizmente os problemas se acumulam.
Os desafios envolvem também a falta de estrutura e saneamento básico da região. Somente o Catiri e seus cinco sub-bairros vizinhos possuem 22 mil habitantes e de espaço público possuem uma creche, uma escola de primeiro e segundo grau conhecida por “Maria Quitéria", com aproximadamente 421 alunos, além de um posto muito pequeno e um abrigo para idosos. Dentre os sub-bairros Chico Mendes, Tom Jobim, Oitenta, Vila Catiri e Catiri, o Chico Mendes é o único que não possui saneamento básico. O local cresce territorialmente, mas sem nenhum tipo de estrutura. Infelizmente essa é uma realidade que se repete em diversas regiões da Zona Oeste.
Espaço Cultural Viaduto de Realengo[editar | editar código-fonte]
Primeiramente, essa história se inicia no sub-bairro Barata, quando jovens se reuniam para rimar, fazer beat box e se encontrar. Em seguida os eventos passaram a ocorrer debaixo do viaduto, em uma passagem considerada perigosa por muitos que já sofreram assaltos ali. O Viaduto de Realengo foi construído em 2012, mas passou a ter novos sentidos e significados no ano seguinte, em 2013, quando surgiu a ocupação “viaduto cultural”.
Como se pode ver no espaço, os grafites coloridos são a essência do Viaduto, ou “sentinela” nas palavras do produtor, uma vez que os grafites - expressão da cultura Hip Hop - ajudaram a criar um novo olhar para o local, pois, caso contrário, a ocupação já teria sido retirada dali, uma vez que tentativas e ameaças não faltaram, sem contar toda a dificuldade existente em desenvolver projetos culturais na região.
O Viaduto Cultural possui oito anos de resistência e, ao longo dos anos, muitas atividades e muitos eventos já passaram por ali. Nas terças-feiras acontecia, por exemplo, a “Sagrada Terça-Feira Rap”, roda de rima com MCs locais. O espaço já foi palco para exibição de longas, apresentações ao vivo, música experimental, eventos de Jazz e Blues, Funk, rodas de samba, Grafiti e muitos outros.
O Espaço Cultural Viaduto de Realengo foi reconhecido como Ação Local em 2015, recebendo a moção de louvores da Câmara Municipal dos vereadores do Rio de Janeiro e também saiu em uma matéria do "O mapa da Cultura Carioca feita na Raça”.
Em 2018, o espaço recebeu o prêmio “Influenciadores Sociais Contra o Racismo”, da Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos (SMASDH). Já em 2020, o E.C. Viaduto de Realengo foi contemplado em dois editais da Lei Aldir Blanc de Auxílio Emergencial a cultura e recebe, em 2021, a medalha de ordem do Mérito Cultural Carioca junto a outros coletivos culturais do Rio de Janeiro. Também recebeu a medalha “São Sebastião”, mérito de quem trabalhou a cultura como elemento para reduzir os impactos da pandemia de covid-19. Somado a isso, também seria importante aprovar um projeto de lei para a nomeação e registro da rua que dá passagem ao Viaduto, porque assim facilitaria que o público localizasse o espaço. Assim sendo, a “rua Walter Fraga” teria a função de endereçar o espaço cultural e também homenagear um sambista referência para o bairro – Projeto de Lei n° 728/2018.
Em suma, a comunidade de Realengo, em suas variadas idades, reconhece a importância e a relevância da ocupação cultural. Muitos defendem a ocupação e acreditam que o trabalho deva continuar. Isso pode ser observado também na Web Série “Uma Ponte Cultural”, filmado ainda na pandemia. Por isso, é importante destacar a relevância que o Viaduto Cultural tem para o bairro de Realengo, se tornando um espaço onde diferentes gerações podem se encontrar e ter acesso a diferentes projetos artísticos e culturais, o que não é a realidade da maioria dos moradores da Zona Oeste.
Centro de Artes Casa da Rua do Amor[editar | editar código-fonte]
A Casa da Rua do Amor é um projeto cultural de grande atuação e impacto em Santa Cruz e Paciência, abrangendo os dois territórios entre Saguassu e Urucânia. A gestão da casa é compartilhada entre 3 artistas e produtores culturais que, após ouvir repetidas vezes que “Santa Cruz não tem nada”, conseguiram demonstrar que é viável e necessário desenvolver projetos culturais na região. De 2016 em diante ocorreram muitos espetáculos na casa, muitas companhias de diversas partes do mundo pisando e realizando inúmeras atividades no espaço.
A Casa conta com algumas salas criativas como o teatro de bolso Vilma Camarate, o Cine clube Waldir Onofre, sala de leitura e escrita criativa Fabi Carrozzino e o museu de artes lúdicas composto por brinquedos criados nas oficinas e brinquedos trazidos de viagens, formando um pequeno acervo que mistura as obras feitas nas oficinas da casa e brinquedos trazidos de diversas partes do mundo. Rodrigo, Gisele e Luiz acreditam que qualquer lugar é palco de teatro e afirmam que “se a arte fosse dada como alimento, ela hoje não seria remédio”.
A história do projeto começa em 2004, na associação de moradores de Saguassu, onde, por solicitação de Fabiana Carrozzino, jovem executiva da empresa local Valesul Alumínio S.A, convidou quatro artistas e educadores que anteriormente haviam trabalhado juntos como animadores culturais de CIEPs a fim de realizarem oficinas de artes como incentivo à leitura das crianças destas comunidades. A partir dessa movimentação, foi criado um projeto de artes integradas (teatro de bonecos, teatro, artes plásticas, música e literatura). Em três meses havia um espetáculo de teatro de animação. O bom resultado das oficinas levou o projeto a fazer uma parceria com CIEP Alberto Pasqualini (Urucânia) com o financiamento da Valesul S.A nos dois polos (A sede de associação do Saguassu, onde se criou o pequeno teatro do Saguassu e no CIEP). O atendimento chegou ao número de aproximadamente 300 crianças e jovens de 8 aos 19 anos.
A casa que hoje abriga o projeto teatral, localizada exatamente entre o limite dos dois sub-bairros atendidos pelo projeto, foi comprada pela Valesul em 2007 e doada para a comunidade como sede. Daí surge a Casa da Rua do Amor. As comunidades de Saguassu e Urucânia poderiam, finalmente, se encontrar em um espaço gratuito para participarem das oficinas disponíveis (Teatro, Teatro de Boneco, Capoeira, Artes Plásticas, Criatividade Infantil, Cinema, cordas dedilhadas, canto e Animação) realizada em três turnos, de segunda a sábado. Paralelo a essas atividades, o projeto somava produção de curtas metragens, peças teatrais, grupos musicais e de dança. Porém, com o passar dos anos, a ValeSul foi extinta como fábrica em 2010 e o financiamento foi finalizado.
Em seguida, buscou-se editais de fomento e a casa recebeu três importantes prêmios pelo instituto Rio, recebendo também o prêmio ações locais 2015 da prefeitura do Rio. O teatro a céu aberto do Saguassu é o primeiro teatro de quintal da região, sendo inaugurado em 2016 com 12 sessões teatrais recebendo um público médio de 40 pessoas por espetáculo.
Nesse sentido, a importância da Casa da Rua do Amor é muito grande e pode ser confirmada principalmente pelo seu principal público: as crianças, que lotam todas as apresentações teatrais da casa e encontram no espaço uma possibilidade para o seu desenvolvimento, tendo em vista que o incentivo à cultura, ao lazer e a arte são quase inexistentes na região e infelizmente o teatro de quintal de Saguassu é, provavelmente, o primeiro e único do território. É por isso que afirmamos: o acesso à arte e cultura deveria ser um direito de todos e todas e não privilégio de poucos. O trabalho com cultura se faz com muita luta e persistência, mas deveria poder ser valorizado e realizado em toda a sua potência de transformação.
Zona de cinema[editar | editar código-fonte]
O Zona de Cinema é um movimento brasileiro focado na Zona Oeste, que ocupa vias ou praças públicas, promovendo encontros, exibindo filmes brasileiros e encantando pessoas. O movimento surge de um fomento público, do prêmio “Mostras e Festivais” da Rio Filme, em 2016. É um movimento de cinema e luta que já realizou atividades sem nenhum edital, desde exibição, articulação, produção cultural através de apoio em comunicação, revisão de texto, articulação com outros movimentos.
É interessante perceber que o movimento abrange diferentes linguagens artísticas, trabalhando com três eixos: 1) produção cultural com ocupação de praças e exibição de filmes brasileiros, mais o debate entre os realizadores, além de shows musicais e outras linguagens artísticas, como performances, exposição de fotografias, mapeamento de vídeo, etc. 2) produção audiovisual – nomeada de produção de impacto – com foco em filmes que trabalhem a temática da transformação social, sendo produções que tratam de assuntos de grande relevância e 3) formações populares e livres em cinema e educação, voltada para educadores ou qualquer pessoa interessada.
Todavia, assim como ocorre com muitos produtores culturais da Zona Oeste, o ponto de partida de iniciativas como essa é a indignação. Gisele, produtora do Zona de Cinema, interpreta o trabalho com a cultura da Zona Oeste como uma forma de transformação social, em um contexto de precariedades e desigualdade na distribuição dos equipamentos formais. Nesse sentido, o objetivo é transformar essa realidade, portanto é necessário que haja mais fomento, mais espaços e especialmente pensar a cultura como transformação social voltada para a sustentabilidade, uma vez que o contexto é de crise sanitária e de saúde pública, que tem tudo a ver com preservação ambiental, disse ela.
É importante destacar que o Z.C é contraponto ao cinema de Shoppings, maioria esmagadora na cidade. Dentro dos shoppings, é exibido uma programação hollywoodiana e distante da realidade de incontáveis brasileiros. Dessa maneira, o movimento possibilita que pessoas residentes na Z.O tenham acesso a um cinema brasileiro e de qualidade. Quando a exibição de cinema acontece na praça, os produtores recebem muito feedback das pessoas que gostam, inclusive, de se ver na tela. Em 2021, ainda durante a pandemia, o movimento produziu o II Festival Zona de Cinema, a revista digital de cinema e cultura das margens e o curta feminista intitulado de “Sangue entre as pernas”.
Maria Realenga[editar | editar código-fonte]
Maria Realenga é um movimento cultural que surgiu em 2011, a partir da tragédia na escola Tasso da Silveira, em 07 de abril de 2011. Esse terrível acontecimento marcou a memória do bairro de Realengo e até hoje, ao pesquisar “Realengo” no Google, as páginas da internet direcionam para essa tragédia como principal referência de memória do bairro. Entretanto, a dor não pode ser a única a ter voz para contar histórias de uma região e, por esse motivo, alguns moradores planejaram uma intervenção para que o bairro não fosse marcado pelo estigma de “bairro tragédia”.
Em seguida, um grupo de moradores do bairro, enlutados, movimentaram-se e pesquisaram artistas de todas as áreas, escritores, poetas e no dia 26 de novembro de 2011 fizeram um sarau com 16 apresentações em 8h de festa. Nascia assim, o sarau cultural de terras realengas. São iniciativas como essa, construídas por moradores, que diante do luto reconstroem e dão novos sentidos a sua experiência de vida, em comunidade e em coletividades.
O coletivo Maria Realenga oferece para a população, um Sarau Multicultural, onde se é buscado a integração das artes, a inclusão social e a difusão do artista. O público alvo são jovens, adultos e idosos que procuram parcerias para lançar obras, montar grupos, bandas, coletivos, companhias, além disso, pessoas que buscam acesso a apresentações artísticas no subúrbio, como canto lírico, palhaçaria, teatro e performances. O coletivo está articulado com outros movimentos culturais e também já foi contemplado com editais, como o “ações locais” de 2015.
Sidnei, um dos produtores do coletivo Maria Realenga, interpreta que o nosso Velho Oeste carece de espaços para expressões culturais, aparelhos públicos e privados para apresentações. Também são gigantes os problemas com a mobilidade urbana, que é muito precária, além da acessibilidade. A ZO tem um potencial artístico imenso, porém nosso desenvolvimento pessoal passa pelo deslocamento até o centro, Zonas Norte ou Sul para o acesso acadêmico ou a espetáculos diversificados. Segundo ele, o impacto das intervenções no território é imenso, pois os saraus e feiras literárias agregam valores isolados pela falta de espaços de expressão.
Ambulante Cultural[editar | editar código-fonte]
É uma rede de cultura atuante há mais de 10 anos na Zona Oeste e além dela, trabalhando a partir de projetos como “Zona Onírica”, ‘Reciclando Pensamentos”, “Comando Selva”, intervindo no espaço urbano dentro do recorte “Ritmo e Poesia”, relacionado com a cultura hip hop, porém sem um formato padronizado e específico, pois essa rede engloba inúmeras possibilidades artísticas a serem executadas dentro de uma ideia. A intenção dessa rede é produzir cultura e formar multiplicadores culturais, pessoas que continuem o trabalho cultural com autonomia.
Toda essa história se inicia com o mutirão de Grafite, que ocorreu em 2006 reunindo vários grafiteiros que se deslocavam até uma região para dar mais cor e vida às vielas e outros espaços periféricos. Esse projeto começou em Bangu e rodou o Rio de Janeiro inteiro. O projeto realizou cerca de 20 mutirões na cidade e após isso mais pessoas fizeram mutirões, fazendo com que a iniciativa realmente se multiplicasse. A rede “Ambulante Cultural” engloba muitos projetos, como o “reciclando pensamentos”, que atuou na Fazenda do Viegas, em Senador Camará, como uma escola de formação de multimídia, fotografia, música, comida, etc. A rede já promoveu muitos encontros, como a Intervenção do mês da Consciência Negra em Senador Camará, na Favela do Sapo ou no Morro do Sossego, envolvendo pintura, música, fotógrafos, compositoras e outras artes. Outro projeto da rede é a Zona Onírica, definida como: "Vivências que provoquem o despertar através de iniciativas inovadoras artísticas e sociais através de trocas que priorizam coletivamente uma reflexão acerca da multiplicidade cultural do território historicamente estigmatizado.”
MV Hemp, idealizador do Ambulante Cultural, é pesquisador, produtor, multi-artista e pixador bastante conhecido no campo da cultura da cidade. Ele trabalha pela perspectiva do resgate ancestral das memórias de favelas, da multiplicação de produtores culturais autônomos. Ele acredita que a Zona Oeste tem uma produção cultural rica e é a base de cultura da cidade, porém o projeto de colonização apaga tais memórias, assim como apagou a memória de inúmeros quilombos e expressões culturais distantes do padrão da colonização. Portanto, é um desafio imenso trabalhar em um território tensionado onde há o aceleramento de apagamento de memórias.
Odefotos e Sarau do Marcola[editar | editar código-fonte]
Na Favela da Vintém, a produtora e fotógrafa Vatuzi segue fazendo a diferença na comunidade onde vive. Ela possui uma empresa nomeada Odefotos, que oferece serviços de fotografia e filmagens em centros de Candomblé. Os terreiros são fortes expressões da cultura afro-brasileira em diáspora, representando a reinvenção da vida e reconstituição de laços comunitários apesar de grandes rupturas e muitas violências. Vatuzi Leontina, mulher, preta, jovem, é referência na cultura para a favela. Ela conta que o projeto começou despretensiosamente, quando entrou para um terreiro de Candomblé e começou a fotografar por conta própria as festas para as entidades e, assim, foi cada vez mais sendo convidada a realizar essas fotografias, tendo feito registros em Bangu, Realengo, Padre Miguel, Anchieta, Jacarepaguá, Curicica, Belford Roxo e até mesmo fora do Rio de Janeiro. O projeto possui CNPJ e o público alvo são as pessoas que fazem parte de um terreiro, como dirigentes que desejam ter o registro das festividades que acontecem. Essas pessoas entram em contato e contratam o serviço.
Como moradora da Zona Oeste, ela considera de muita resistência às iniciativas culturais que acontecem na região, por não contar com nenhum apoio e visibilidade, mas sim com “as garras” de cada pessoa que chega para colocar “as coisas para andar”. Disse também que o diálogo com a comunidade é a base para as movimentações culturais que acontecem. Vatuzi citou o “Sarau do Marcola”, também de sua produção, na Vintém, que acontece em frente ao bar do Marcos.
O Sarau do Marcola reúne músicos, cantores, percussionistas, guitarristas para tocar e cantar músicas autorais e também alguns covers a serem apresentados a céu aberto para os vizinhos que se sentam em frente ao bar. Ela não imaginava que tantas pessoas fossem querer participar, ou que conseguiria levar pessoas para lá e apenas com uma edição, as pessoas já têm ido ao bar perguntando quando será o próximo, querendo participar e ajudar na construção.
Sobre o impacto dessas atividades para a comunidade da Vila Vintém, ela acredita que “trouxe, de certa forma, uma sede nas pessoas. Sede de viver de arte, discutir arte e fazer arte. Nós queremos contemplar o artista da nossa área. Contemplar e apoiar. A gente também quer fazer arte com eles, nós também somos artistas e também queremos participar, fazer e acontecer... O impacto é o movimento e acredito que seja algo bem positivo, que nem imaginávamos que teria tanto retorno, de pessoas pedindo uma nova edição. Isso também fala sobre aproximação, sabe? Aproximação com aquele seu vizinho que você passa e não olha, mas ele vai estar lá no sarau contemplando a arte e fazendo a arte também. Esse movimento também representa novas vivências pra Vintém”.
Lata Doida[editar | editar código-fonte]
“Na lata do poeta tudonada cabe, pois ao poeta cabe fazer com que na lata venha caber o incabível.” (Gilberto Gil). Reconhecida como ponto de cultura pelo Ministério da Cultura em 2014, Lata Doida é uma família, um projeto, ONG, banda, ativismo socioambiental, estúdio musical e todo o incabível que essa família de Realengo faz caber em
“Na lata do poeta tudonada cabe, pois ao poeta cabe fazer com que na lata venha caber o incabível.” (Gilberto Gil). Reconhecida como ponto de cultura pelo Ministério da Cultura em 2014, Lata Doida é uma família, um projeto, ONG, banda, ativismo socioambiental, estúdio musical e todo o incabível que essa família de Realengo faz caber em sua lata. Vanielle, filha, professora, pesquisadora e cantora e Vânia, mãe, gestora ambiental, artista plástica, contadora de histórias, decidem articular, juntas, um núcleo de um programa governamental para jovens (apesar das contradições históricas de ações governamentais voltadas para jovens periféricos) para o seu bairro, onde Vânia assumiu a coordenação de dezenas de jovens. Vandré, filho mais novo, hoje professor, multi-instrumentista, luthier e produtor fonográfico, foi incluído, com 16 anos, como jovem atendido no programa que a mãe coordenava no bairro e teve sua primeira experiência pedagógica com música nesse projeto, ensinando, a princípio, violão para as crianças.
Devido a ausência de instrumentos musicais, Vandré e outros jovens decidem utilizar latas, sucatas, para desenvolver a música para as crianças do bairro, chegando a ganhar um prêmio de maior aclamação popular em casa de show de grande importância local. Porém, a continuidade do projeto não foi possível por muito tempo e é encerrado em 2007, fazendo com que Vânia, a matriarca da família, decida alugar uma casa ao lado da sua, para comportar as atividades artísticas da família e manter voluntariamente as oficinas que foram iniciadas no projeto.
Em seguida, surge em 2008 a Associação Grupo Cultural Lata Doida, que realiza, além de atividades musicais, oficinas de artesanato, promoções de eventos, trabalho com catadores de materiais recicláveis, fóruns, reuniões de moradores, artistas e ativistas, consolidando, com o tempo, o reconhecimento e popularidade do Lata Doida no bairro.
Em 2020, devido à pandemia de Covid-19, o grupo Lata Doida teve que pausar suas atividades presenciais, mas seguiu o trabalho realizando lives de apresentações musicais e também na construção do Festival Avante Parquinho Verde, um festival online que reuniu moradores, artistas e demais interessados pela construção de um Parque Urbano, 100% verde e também sustentável no terreno da antiga fábrica de cartuchos, na rua Carlos Wenceslau.
Bloco Flor de Lis[editar | editar código-fonte]
O Bloco Flor de Lis, um bloco Banguense, surge em 2018 para comemorar e homenagear os setenta anos do grande Djavan, em 2019, na Lona de Bangu. São ativistas, artistas, fazedores de cultura e fãs do Djavan que se organizaram para realizar, com alegria e arte, esse trabalho no território. As principais atividades do bloco envolvem apresentações musicais e também formações em música, já que o bloco se desenvolve a partir de oficinas de percussão para a comunidade, possibilitando a prática em conjunto. É importante perceber que o perfil é de pessoas da melhor idade, ou de mulheres que estão pela primeira vez podendo sair de casa para fazer arte. Nesse sentido, o bloco também contribui para o território quando inclui um público que não se sente tão à vontade para ingressar nas baterias mais técnicas e geralmente comandadas por homens.
O público alvo do projeto é a população de Bangu e o diálogo é constante, inclusive porque é a própria comunidade que participa das oficinas e também contribui voluntariamente para a manutenção do mesmo . O público é majoritariamente da Vila Vintém, Vila Kennedy, Santíssimo e Camará. Apesar de realizarem um trabalho de impacto para as comunidades, o bloco não possui patrocínio e dependem de editais para tocarem projetos de curto ou médio prazo. O primeiro edital conquistado foi o Aldir Blanc.
Téo, um dos produtores culturais, afirma que é urgente o poder público fornecer, de forma equânime, estruturas e condições para os artistas da Zona Oeste conseguirem se manter, sobretudo realizando atividades culturais nas próprias comunidades. Em síntese, é preciso enxergar as potências da Zona Oeste e e dar visibilidade a elas, que são motivo de muito orgulho para os moradores do Bairro, seja por conta da Mocidade Independente de Padre Miguel e da sua incrível bateria, ou a unidos de Bangu, bloco do Rio da Prata, o próprio Bloco Flor de Lis e todos os movimentos que produzem arte na região.
Festival de Música e Cultura de Rua de Bangu[editar | editar código-fonte]
O Festival de música e cultura de rua de Bangu surgiu em 2013 e acontece, geralmente, na praça Guilherme da Silveira, mas também já ocupou outros lugares como a areninha carioca Hermeto Pascoal, por exemplo. Foi idealizado por artistas e produtores locais, com foco no território e intuito principal de impulsionar artistas independentes da região. Para isso, trabalhar o pertencimento e a identidade são essenciais e está expresso, inclusive, na identidade visual/logo do projeto: a fábrica, as palmeiras imperiais e o maciço da Pedra Branca ao fundo. Além das cores, vermelho e branco. Essas são referências que dialogam com a memória do bairro.
O festival gerou possibilidades novas para os artistas do bairro, que necessitam de um local para se apresentar, com uma estrutura e visibilidade boas, para divulgarem os seus trabalhos diante do público. Esse sempre foi o objetivo principal do projeto. Assim como outras intervenções culturais da Z.O, esse festival possui uma multi-linguagem cultural, ou seja, não tem um segmento artístico definido. Os produtores abraçam o que puder ser abraçado: Skate, Grafite, audiovisual, dança de tecido, acrobacia, chorinho, orquestra, fotografia, exposição, debate, música, poesia, dança, economia criativa, artesanato, gastronomia. A intenção é a expansão de possibilidades, em tudo que envolve a cultura de rua e do subúrbio.
Ao longo desses oito anos, essa construção já foi contemplada por alguns editais, tanto da prefeitura quanto do estado, como o Ações Locais, Cultura presente nas Redes, Aldir Blanc, entre outros, um meio importante e viabilizador para que o projeto sobreviva no meio de tantas dificuldades, agora acentuada pela pandemia do Coronavírus. O público alvo são, em maior número, jovens periféricos, entre 15 e 29 anos, porém o diálogo com a rua oferece o contato com diferentes gerações, a depender da própria intervenção cultural e do espaço escolhido. O coletivo ainda não possui CNPJ, mas está agilizando para mudar essa realidade, afinal de contas isso permitirá uma maior regularidade ao projeto, além de alcançarem editais grandes e voos maiores. Possuem patrocinadores fixos que sempre colaboram para a realização das edições, assim como entusiastas e parceiros que ajudam por entenderem a importância de movimentar a cultura do território. Devido ao sucesso do projeto, o Festival de música e cultura de rua de Bangu foi estabelecendo redes e parceiros, como o Lata Doida, a Zona Oeste Ativa, Parquinho Verde e muitos outros. Rede importante a ser cultivada. Logo, foi inevitável atingir outras regiões, dando voz a artistas de outros territórios também, como Niterói, São Gonçalo, Baixada Fluminense, fazendo com que outras pessoas também venham para Bangu. Para Thiago, um dos produtores do festival, a Zona Oeste é um celeiro de potência, de abrangência, porém esbarra na existência de muitas realidades e desafios distintos dentro do território. Os produtores culturais e atores da região, precisam despir-se de ego e vaidade, para circular pelos espaços e furar essa bolha territorial que a Z.O propaga, para que seja possível conhecer todas ou a maioria das potências existentes, fortalecendo a rede de fazedores culturais. Além de caminhar pelo fortalecimento dessa rede, o diálogo com a comunidade é também essencial e direto, fortalecendo também os comerciantes locais, como as barraquinhas de comida, a fim de movimentar a economia local.
Sarau do Calango[editar | editar código-fonte]
O Sarau do Calango é uma ocupação artístico-cultural do espaço público, que se fixou na Praça da Capelinha, no bairro de Magalhães Basto, desde sua sétima edição, em novembro de 2016. Atuando em rede desde sua fundação, com coletivos culturais da região, estruturado com equipamento de som e luz de qualidade, o Sarau do Calango oferece um espaço de apresentações de música, poesia, dança, literatura, artes visuais, contação de história, performance e microfone aberto, principalmente para os muitos artistas da região exporem seus trabalhos autorais. O público alvo é composto, predominantemente, pela população da Zona Oeste, pessoas de várias idades, jovens em vulnerabilidade social e econômica, público LGBTQIA+, pessoas em situação de rua, transeuntes e artistas da região, que sofrem com o déficit de equipamentos culturais em relação ao eixo Centro-Zona Sul. O Sarau não possui CNPJ e também não conta com patrocinadores, entretanto, ao longo de quase 4 anos de atuação, pouco antes da pandemia foi firmada uma parceria com o comércio local, que oferecia uma cota em dinheiro para os custos de aluguel e operação dos equipamentos de som e luz. Após esse momento, no final do ano passado, foram contemplados com o prêmio Ações Locais via Lei Aldir Blanc, oferecido pela Secretaria Municipal de Cultura, o que possibilitou oferecer cachês para os artistas que sempre se apresentaram voluntariamente. No momento, os produtores do Sarau estão aguardando o resultado final do edital FOCA da SMC, na Linha 2 – Território e Cultural, o qual foi habilitado para a seleção. Culturalmente falando, a Zona Oeste sempre foi vanguarda no setor cultural, de onde saíram para o mundo inúmeros artistas, das mais variadas linguagens, comprovando, não somente à comunidade local, mas a toda população da cidade, a potência cultural da região. O setor cultural é importante também para o desenvolvimento humano e territorial, podendo gerar trabalho e renda às pessoas envolvidas com a produção cultural, incentivando os jovens a assumirem o seu papel de agente transformador de sua realidade, inserindo-os em todo o processo de produção de uma atividade cultural em nosso território. Fica evidente, portanto, o impacto positivo para a comunidade local a partir das atividades produzidas pelo Sarau do Calango na Praça da Capelinha, trazendo ânimo e entusiasmo à população do bairro e ao comércio local, sendo uma ocupação que acolhe e cativa a todos e todas que a conhecem. Muitas delas se apresentaram em público pela primeira vez, em uma das edições, tirando da gaveta suas obras, e assim iniciando suas trajetórias artísticas. Talvez este seja o resultado mais gratificante e potente que o Sarau pode obter com essa intervenção no território.
Centro de Estudos e Divulgação das Culturas Negras (CEDICUN)[editar | editar código-fonte]
Idealizado pela Professora Dulce Vasconcellos, uma de suas principais fundadoras, nasceu no dia 9 de maio de 1988, ano do Centenário da Abolição, devido a necessidade de se refletir, questionar e desmistificar a "pretensa libertação dos escravos", promovendo ações contra o racismo estrutural. Tendo como patrono o Almirante Negro João Cândido, herói da Revolta da Chibata, tem como objetivo divulgar a cultura afro-brasileira, incentivando a pesquisa e o estudo de nossas origens, valorizando a Raça Negra, assim como a Comunidade Afro residente na Zona Oeste. Nos seus 33 anos de existência tem desenvolvido muitos projetos, atuando em diversas áreas.
Dentre esses projetos, destacamos a atuação na Educação: levantamento dos patronos negros das escolas da 9a CRE (Coordenadoria Regional de Educação), Coordenação do Prêmio COMDEDINE (Conselho Municipal de Defesa dos Direitos do Negro) de Pesquisa Escolar, Projeto "Fala CEDICUN" (Palestras, Debates e Encontros em escolas, sempre com temas voltados ao interesse da Comunidade, ex.: AIDS, Drogas, Gravidez na Adolescência, Racismo e Meio Ambiente). Seu Projeto "Lixo com arte é luxo", transformando em arte o que chamam de lixo, deu origem à Feira de Artesanato Afro, agregando vários artesãos e ao Bazar Nossas Raízes - no momento desativado, sem local fixo para exposição.
Vale destacar ainda o Projeto "Fazendo a Cabeça, Reciclando Ideias e Resgatando Raízes", que tem como foco atual alcançar os jovens do CEDICUN, buscando minimizar o impacto da pandemia na educação desses e também gerar renda para os adultos. Dentre os muitos eventos realizados, o "CEDICUN Exalta Zumbi" (com sua tradicional feijoada) e “CEDICUN Exalta a Mulher Negra” são festas fundamentais para a celebração e exaltação da cultura afro-brasileira. Por conta da pandemia, o Centro criou uma página no Facebook, para postagens referentes à causa negra. Criou ainda um canal no Youtube com vários vídeos, entre eles “Histórico da instituição”, “O Estudo te Leva lá” I, II e III (Para motivar jovens desmotivados nos estudos) e “Mulheres Influenciadoras”, que temos como referência, em Homenagem ao dia 08 de março deste ano. Recentemente, o CEDICUN está também no Instagram divulgando suas ações.
Vivências em danças populares[editar | editar código-fonte]
O projeto “Vivência em danças populares” foi idealizado pelo casal Nathalia e Bruno, ela de Campo Grande e ele de Nilópolis. Bruno já era compositor e ela envolvida com a dança antes de iniciarem o projeto. A proposta é possibilitar um ambiente de reconexão através do canto, da poesia, da perna de pau, das trocas e das danças populares como o Jongo, o samba de coco e o maracatu. Uma forma de celebrar e dar um “viva” à cultura popular!
O projeto é atuante em comunidades e periferias do RJ, da Zona Oeste e para além dela. Oferecem oficinas gratuitas e pagas, servindo-se também da música popular e do teatro de rua. A proposta é compartilhar nossa cultura popular através da poesia, do diálogo, da perna de pau, por exemplo, que é um brinquedo que possibilita falar sobre o tambor e de toda essa ancestralidade brasileira e nossas riquezas populares.
No projeto, acredita-se que a arte move muitos sentimentos, a exemplo da dança que consegue desatar muitos nós, conforme as pessoas vão liberando e vencendo desafios. E também na utilização da perna de pau, pois subir, se equilibrar, estar ali, presente, são desafios a serem enfrentados.
O público alvo é de todas as idades. Crianças, jovens, adultos e idosos compartilham vivências e saberes. Para Nathália: “é muito gratificante ver, por exemplo, o sorriso de uma criança que está praticando danças como Coco e Jongo entendendo o que são essas manifestações, que não são tão divulgadas na mídia, porém fazem parte da nossa identidade brasileira. Portanto, estar envolvida com esse trabalho enriquece a gente como seres humanos e impacta as pessoas atendidas, ao mesmo tempo que o aprendizado é mútuo em uma troca de saberes, vivências e aprendizados. É muito importante e motivo de felicidade ver o sorriso de uma criança que está ali entendendo o que é o jongo, o coco, o que são essas manifestações culturais que não são divulgadas na mídia e que fazem parte da nossa história”.
Obs: fica a dica para todos assistirem no Youtube o mini-documentário: “Do chão ao céu”, que narra um pouco sobre as experiências e as realizações do projeto.
Ponto Cine[editar | editar código-fonte]
O nosso mandato visitou o maior exibidor de filmes brasileiros do mundo e ele não está na Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro. Você sabia que o maior exibidor de filmes brasileiros é também a primeira sala popular de cinema digital do Brasil, sendo, além disso, patrimônio histórico e artístico do Estado e está localizado na Zona Norte, no bairro de Guadalupe, dentro de uma galeria próximo à Av. Brasil?
O Ponto Cine é um projeto atuante há quinze anos, cuja sala de cinema é reconhecida por exibir filmes brasileiros, oferecer cursos para escolas, asilos, jovens que estão a cumprir medidas socioeducativas e para a comunidade local como um todo. Oferecem empregos para muitas pessoas e também oportunidades de estudos, através da parceria com o Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), que também oferece bolsas de estudo e entrega os certificados para as turmas. Mesmo sendo um projeto de grande impacto para o bairro, as atividades estão suspensas por falta de recursos e apoio.
É importante perceber que a experiência a qual o ponto Cine proporciona é diferente da experiência de um cinema tradicional dentro de shoppings, pois, para uma família, o valor investido nos ingressos, na pipoca e refrigerante pode ficar alto e inacessível, além disso a saída da sala logo desemboca na praça de alimentação, onde as pessoas geralmente param e lancham. Muitas vezes as pessoas nem conversam sobre o filme recém assistido e essa certamente não é uma experiência aproveitada em toda a sua potência. Já no Ponto Cine o valor é mais acessível e a experiência de sentidos é mais rica. As pessoas podem ler livros antes do filme começar, podem levar para a casa e devolver quando a leitura terminar. A sala possui capacidade para aproximadamente 72 lugares e ao final da exibição, é possível comentar no microfone o que pensaram sobre o filme, às vezes na presença do próprio diretor do longa exibido. Essa é uma forma de proporcionar reflexão, encontros, lazer e literatura para as pessoas.
Para divulgar o projeto, foi utilizado um carro com tela móvel, o qual a porta aberta torna-se uma tela de cinema. Adailton Medeiros saía fazendo promoção a noite, passando trailer de filmes onde tinha churrasquinho ou pagode acontecendo no bairro e, assim, eles iam apresentando o projeto para os moradores. Além de utilizar o tradicional carro de som, que facilita a comunicação com o público. O Ponto Cine é, também, a primeira sala de cinema da América Latina a receber o selo Carbono Livre, sendo um exemplo a ser seguido.
Para Adailton Medeiros, idealizador do projeto, “Cinema alimenta a alma das pessoas e fortalece a consciência de um país.” E de acordo com ele, as regiões que possuem menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), como essa, deveriam receber um olhar diferenciado do poder público. Ações como Ponto Cine deveriam e poderiam receber maiores incentivos. O projeto é estudado em 13 universidades brasileiras, e por que algo assim não está sendo noticiado? Por que não conhecemos? Por que não valorizamos? É essa realidade de invisibilidade que o nosso mandato deseja transformar. Os moradores da Zona Oeste, por exemplo, passam pela Av. Brasil quase o tempo todo e muitas vezes não imaginam que algo assim esteja acontecendo ali, tão próximo.
Projeto Fruta do Pé[editar | editar código-fonte]
Diretamente de Inhoaíba, a roda de samba “Fruta do Pé” movimenta a região através do samba e da cultura popular, alinhados ao protagonismo e à preservação da cultura negra. A música “oitava cor” serviu como inspiração para o nome do projeto: “É ter na mão, fruta do pé, no fundo do quintal [...]".
A roda, que acontece no quintal de uma família, possibilita edições quase que mensais para a vizinhança, além de oficinas de percussão, bateria, samba no pé, capoeira, yoga para todos aqueles que desejam aprender repinique, caixa, o surdo, além das técnicas corporais para a dança, etc. Os músicos da roda são todos da Zona Oeste, alunos que participam das oficinas e através delas aprenderam a tocar. Em algumas edições, o projeto recebeu convidados como Aluisio Machado, Will Freitas, Zé Luis – nomes de peso para o samba, especialmente na escola Império Serrano.
Toda essa história começa com uma família de músicos, ou músicos de famílias, que já tinham o costume de fazer rodas de samba em casa e também ensinar outras pessoas a tocarem os instrumentos. Esses encontros e essas atividades já aconteciam antes de oficializar o projeto e logo então um jovem, filho e neto, sambista, instrumentista e compositor decidiu produzir e coordenar as rodas, formalizando o projeto para o público e, assim, toda a família embarca nessa aventura. As primeiras edições foram gratuitas, mas à medida que a roda crescia, os custos também foram aumentando e hoje é cobrado um valor de R$20,00 para a entrada. Está articulado também com o grupo de pesquisa, Quilombo do Samba, e produzem reflexões críticas em todas as suas edições, como a afirmativa de que o samba é preto, sobretudo para preservar as tradições africanas sendo, portanto, uma continuação da cultura, das tradicionalidades e manifestações que formam a cultura afro-brasileira.
O projeto Fruta do Pé integra o Calendário das Rodas de Samba Cariocas e está apto a realizar o Circuito Empreendedor do Samba, assinado pelo então prefeito Marcelo Crivella. No entanto, nota-se grandes desafios e dificuldades ao trabalhar com a cultura popular no Brasil. São muitos os exemplos, como a própria relação com um público cada vez mais distante e desconectado de suas raízes. E quando somado à questão territorial, onde o investimento na cultura acontece de forma paliativa, esses desafios se multiplicam. Certamente, o Projeto Fruta do Pé se preocupa em ir muito além da arte como puro entretenimento, sendo um projeto que nasce da terra, que fala da história africana do samba, da ancestralidade e das pessoas.
Zona Oeste Ativa[editar | editar código-fonte]
Zona Oeste Ativa (ZOA) é um coletivo cultural que promove rodas de conversa e diferentes intervenções artísticas, desde 2015, na praça Guilherme da Silveira, em Bangu. O objetivo é ocupar a praça, ressignificar o espaço público, impulsionar debates sobre o cotidiano, território, políticas públicas e sociedade, além de proporcionar bons encontros e acesso à arte local, promovendo intervenções artísticas de diferentes tipos: música, dança, grafite, cinema, exposições, artes visuais, desenhos, etc.
Sendo assim, muitas rodas de conversa já foram realizadas na praça: “Mulher na sociedade: lutas, trajetórias e desafios”, “Redução da Maioridade Penal”, “É Golpe ou não é Golpe” em 2016, “Intervenção Federal para quem?”, “Eleições 2016”, “Memória e Pertencimento: Raízes de Gericinó”, “Cine Debate: Segurança pública para quem?”, “Funk é Cultura SIM!”, entre outros. Além das rodas, o coletivo produziu a festa “Nuvem Preta”, em comemoração ao mês da consciência negra e também o festival JUNTEY, experiências muito potentes que fizeram a praça lotar com muito Black Power para o alto.
Além disso, o movimento é auto-organizado, suprapartidário e protagonizado por mulheres, sendo corpos e mentes em movimento para construir espaços de reflexão, diálogo, produção de cultura e participação cidadã na região. Por isso, todas as edições foram gratuitas para os moradores de Bangu e adjacências, sendo um coletivo patrocinado pelos próprios produtores que contavam apenas com o bar para arrecadar algum dinheiro e pagar as contas. Editais de fomento nunca foram uma realidade para a ZOA, que não sabia como acessar tais recursos, até que a articulação com o coletivo Zona de Cinema proporcionou esse aprendizado, sendo possível acessar o recurso do Inciso II, Aldir Blanc.
Por conseguinte, o diálogo com a comunidade foi, em muitos momentos, recíproco e democrático e outras vezes hostil e perigoso, a depender do assunto abordado em roda. O coletivo já sofreu ameaças, por exemplo, de um homem que estava próximo e se revoltou com a defesa do Funk como uma expressão cultural legítima. Esse senhor pegou o microfone, ofendeu as produtoras e os artistas, disse que tinha uma arma e que voltaria lá. Essa não foi a única situação de terror que o coletivo já enfrentou. Uma viatura da polícia acabou com a festa “Nuvem Preta” e se recusou a devolver o alvará que os dava permissão de estarem ali. Ele, que estava visivelmente alterado, algemou uma pessoa da equipe, desfilou com ele por toda a praça, constrangendo e se recusando também a informar o departamento de polícia para onde o levaria. A pergunta que ficou é: se fosse na Zona Sul, será que uma festa seria interrompida dessa forma, a base de humilhações? Até quando a cultura na Zona Oeste continuará a ser deixada de lado pelo poder público? Até quando as expressões culturais de raízes africanas serão desrespeitadas? Evidentemente, quando a cultura não está presente, a intolerância tem mais terreno para se criar e, infelizmente, além de produzir cultura com muita dificuldade no território, os produtores culturais ainda são alvos de quem deveria proteger ou apoiar.
Coletivo Piracema[editar | editar código-fonte]
O Coletivo Piracema recebe esse nome em homenagem àquele que, segundo pesquisas históricas, foi o primeiro nome de Santa Cruz, dado pelos indígenas que aqui viviam. É simbólico também porque o próprio fenômeno da piracema pressupõe remar contra a maré. Então, em 2016, a partir da união de 5 amigos de Santa Cruz, provocados a pensar sobre a ausência do Estado nos mais diversos aspectos, decidiram se organizar coletivamente para pensar direitos humanos e cidadania a partir da periferia.
Ainda que o coletivo não realize ações exclusivamente culturais, ele constrói uma agenda semanal de divulgação de eventos pela Zona Oeste, atividade que foi interrompida durante a pandemia. Além disso, participa e divulga as ações de parceiros também da Z.O. O público é composto por jovens, trabalhadoras e trabalhadores, população LGBTQIA+, mulheres negras e populações minorizadas no geral. Porém, ainda não possui nenhum patrocinador, voluntário ou fonte de financiamento.
No momento, o trabalho do coletivo está mais focado em 64 famílias que recebem cestas básicas. É importante destacar que esse diálogo com as famílias foi possibilitado a partir do legado do movimento organizado de mulheres. E além de tentar amenizar minimamente o quadro cruel da insegurança alimentar, o coletivo atua nas micropolíticas, a partir do afeto e da escuta. Aprendendo e trocando com muitos parceiros, como o Teia de Solidariedade Zona Oeste.
Assim sendo, o coletivo Piracema representa também a potência criativa advinda em meio ao caos, que impacta diariamente a vida de pessoas que ainda enfrentam a insegurança alimentar, além de gerar um pouco mais de visibilidade para a cena cultural de Santa Cruz, um lugar que pulsa, porém é deflagrado pela violência e abandono.
Casa da Cultura[editar | editar código-fonte]
A cultura hip-hop é uma forte manifestação especialmente para as periferias e favelas. Efetivamente, o rap é o grito de muitos e muitas na Zona Oeste e, um grande exemplo dessa expressão, são as batalhas de rima produzidas pela Casa da Cultura, na Vila Aliança, em Bangu. A Casa da Cultura é um coletivo auto-organizado por jovens que vivem o propósito de valorizar e expandir a cena da batalha de rima na Zona Oeste.
Para tal, são 8 organizadores que realizam os eventos mesmo sem receber nenhum apoio financeiro, sendo um trabalho realizado com muito compromisso, diálogo e responsabilidade. Dentro do coletivo, a ideia de organização tem como ponto de partida as melhores qualidades de cada um; então, tem DJ, mestre de cerimônia, aquele que entende do audiovisual, ou aquela pessoa mais articulada que busca parcerias. É assim, através da coletividade, que uma intervenção cultural é construída.
De forma surpreendente, essa juventude organiza as batalhas de rima e apresentações musicais na pista de Skate, na Estrada do Taquaral, ao lado da então desativada Nave do Conhecimento, todos os sábados às 19h. Ali, o mestre de cerimônia comanda as batalhas, enquanto os Mc’s improvisam na rima, freestyle e no Flow, na modalidade “sangue” e “slam”, sob os olhares de muitos outros jovens que encontraram nas edições semanais da Casa da Cultura uma ótima opção de lazer e aproximação com a cultura hip-hop.
O coletivo estabelece ótimas relações com organizadores de batalhas de outros bairros e também já realizou uma intervenção conjunta com o movimento Zona Oeste Ativa. Atualmente estão gravando, de forma independente, um longa-metragem para narrar a realidade da favela, trazendo novos olhares e ativando o audiovisual na comunidade. Certamente seria fantástico se houvesse um centro cultural a disponibilizar aulas de produção cultural para jovens e adultos que desejam aprender e se profissionalizar no trabalho com a cultura, sendo uma possibilidade de ampliar as oportunidades de trabalho para novas gerações.
Nas palavras de um dos produtores: “É preciso estar sempre procurando soluções para os problemas que assolam os jovens nas favelas, que todos os dias são rechaçados de forma truculenta. É por isso que eu me sinto como uma voz para aquele que não teve a oportunidade de falar em voz alta o que realmente quer dizer. A Casa da Cultura é a voz da favela na Vila Aliança.”
Clube de Leitura ZO e Festa Literária de Campo Grande (FLICAMP)[editar | editar código-fonte]
Com o objetivo de promover encontros mensais ao redor de livros e voltados para os amantes da leitura, surgiu em outubro de 2017, o coletivo literário Clube de Leitura ZO. Os encontros começaram na livraria Leitura do Park Shopping e depois aconteceram em outras localidades do bairro, como a Casa Bosque (próximo à rodoviária), mas também fora de CG, como em Bangu e Santa Cruz. Logo no ano seguinte, o Clube de Leitura ZO foi convidado para participar da FLUP, a Festa Literária das Periferias, organizando um debate ao redor do romance “Úrsula”, da escritora maranhense Maria Firmina dos Reis. Depois, em 2019, José Fontenelle, o coordenador, participou do Salão Carioca do Livro, no Centro. Naquele mesmo ano foi realizada a primeira edição da Flicamp.
A Flicamp é a Festa Literária de Campo Grande, um evento inspirado pela Festa Literária das Periferias, que trouxe para a Zona Oeste a atmosfera de uma festa que exalta a literatura, promove encontros e debates e não está reduzida ao movimento comercial e mercadológico da venda de livros. A primeira edição da festa homenageou o grande escritor Lima Barreto. Um verdadeiro sucesso, com a cobertura de reportagem da GloboNews e a capa do Jornal Extra.
Em 2020, devido à pandemia, a II Flicamp aconteceu em formato totalmente virtual, por meio de palestras e debates online, tendo como homenageado o Patrono da Educação Brasileira, Paulo Freire. Como novidade, a festa teve uma madrinha, a grande escritora Conceição Evaristo. A próxima edição será organizada em 2022 e necessita de financiamentos, o coordenador da Flicamp, José Fontenelle, nos relatou a grande dificuldade de arrecadação via a lei de incentivo por meio da isenção do ISS, sendo negado por mais de 20 empresários locais.
É fundamental que essas iniciativas tenham mais visibilidade e floresçam na Zona Oeste, movimentos que estimulem a leitura, exaltem os escritores locais e valorizem suas histórias, crônicas e memórias. Nosso mandato acredita que a Festa Literária de Campo Grande é uma potência para aglutinar coletivos, artistas e escritores locais e fornecer para os moradores da ZO, mais acesso à literatura e às atividades artísticas, garantindo assim o direito à cultura.
Rede Zona Oeste de Teatro[editar | editar código-fonte]
Uma organização criada por grupos, artistas, ações e espaços de teatro dos bairros da Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro que compartilham experiências e vivências artísticas desenvolvidas em seus territórios, com o intuito de gerar e promover ações de transformação artística e social por meio da experimentação cultural e da articulação pessoal e comunitária. A organização está articulada com a Rede Latinoamericana de Teatro em Comunidade, uma rede criada por coletivos teatrais de vários países. Atualmente 13 países estão representados por meio de integrantes na Rede, são esses: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, México, Peru e Uruguai.
A missão da Rede Zona Oeste de Teatro é dar visibilidade, integrar e potencializar os grupos e artistas de teatro da região, além de gerar, fomentar e organizar eventos artísticos alinhados com a vanguarda dos processos conceituais, estéticos, formativos e educacionais através de manifestações teatrais visando a formação dos mais diversos públicos e a livre fruição dos artistas.
A partir de 2022, a Rede realizará uma mostra bienal com a participação de todos os grupos e artistas independentes que integram a organização, não apenas como uma mostra artística, mas também como a possibilidade de encontro e troca entre os diferentes saberes, especificidades e particularidades dos grupos. Portanto, é fundamental o apoio do poder público para realização desses eventos, fontes de financiamento e recursos infraestruturais são necessários para que a população da Zona Oeste possa ter acesso à diversidade e riqueza de manifestações teatrais produzidas pelos grupos, coletivos e artistas da região.
O Patrimônio histórico-cultural da Zona Oeste[editar | editar código-fonte]
As políticas de valorização patrimonial na cidade do Rio de Janeiro se estabelecem no território de forma desigual, a Zona Oeste nunca recebeu a devida atenção em seus lugares de história e memória e por isso muitos patrimônios foram perdidos pela negligência e descaso do poder público. Sabemos bem que as referências e a ativação dos patrimônios como espaços de memória, história e afetividade estão concentradas no centro e zona sul do município e se tornaram lugares de desenvolvimento cultural e econômico a partir da atividade turística.
Aqui na Zona Oeste convivemos, em nosso dia-dia, com os severos problemas relacionados à dinâmica dos transportes, habitação, de acesso à saúde pública e equipamentos culturais. Porém, é também necessário trazer luz sobre as invisibilidades históricas e a negação do direito à memória e ao patrimônio local, condenando-os a um intenso processo de degradação devido ao descaso e má gestão.
É urgente e de extrema importância criar referências patrimoniais que exaltem a cultura, a memória coletiva e a história vivida na Zona Oeste, utilizando o patrimônio como meio educativo para a compreensão dos processos de expansão urbana, de lutas sociais e da diversidade das artes. Pensando nisso, nosso mandato criou a “Frente parlamentar de proteção e ativação do patrimônio histórico cultural da Zona Oeste do Rio de Janeiro” que está comprometida em fiscalizar e levantar estudos sobre as condições dos patrimônios já tombados pelos órgãos oficiais de tutela e construir diálogo com os movimentos sociais e fazedores de cultura que estão em luta pela ativação social do patrimônio para que estes se tornem verdadeiros espaços de educação, memória e interpretação do mundo.
Para darmos um exemplo da ausência de políticas voltadas ao patrimônio basta olharmos para o quarteirão cultural de Santa Cruz e outros bens do bairro que carecem de visibilidade e investimentos. Você sabia que Santa Cruz é um bairro com grande concentração de patrimônios do período Colonial e Imperial? Que aqui na nossa querida Zona Oeste existem patrimônios valiosos e tombados pelos institutos de patrimônio?
Só para falarmos de alguns desses patrimônios, a Ponte do Guandu, hoje mais conhecida como Ponte dos Jesuítas, é uma das raras obras de proveito coletivo remanescente do Brasil colônia. Foi construída em 1752 para a travessia do interior para a capital e também para regular o volume das águas das enchentes do rio Guandu e desviar parte das águas para o rio Itaguaí por um canal artificial.
Quando rio Guandu foi canalizado, o conjunto arquitetônico da “Ponte dos Jesuítas” perdeu sua função original, mas ainda representa um dos mais belos e raros monumentos da arquitetura jesuítica do Rio de Janeiro, sendo consagrada por sua importância histórica e arquitetônica em 1938, quando criado pelo Governo Federal, a Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, hoje IPHAN, inclui a ponte entre os cinco primeiros bens tombados no Brasil[2].
Outro bem de grande importância é o Palacete Princesa Isabel, construído no final do século XIX para abrigar a sede administrativa do antigo matadouro, quando o local ficou defasado tecnologicamente, o matadouro deu lugar a uma escola, no começo do século XX. Por cerca de 40 anos a instituição dedicou-se ao ensino técnico, recebendo, em 1946, o nome de Escola Princesa Isabel. Nos anos 70 o prédio já estava em péssimas condições e a escola tinha sido transferida para outro prédio.
O patrimônio sofreu inúmeras invasões e ocupações, em 1984 foi tombado por seu valor histórico cultural, foi reformado e hoje é um bem de uso para toda a sociedade. No local, atualmente, funciona um centro cultural coordenado pelo NOPH (Núcleo de Orientação e Pesquisa Histórica de Santa Cruz). É essencial que todos conheçam e visitem o espaço, a melhor forma de preservação é o uso, e este patrimônio é um bem de todos.
As ruínas do que no passado foi um importante Matadouro, unidade industrial para abastecimento de carne do município do Rio de Janeiro e funcionou do final do século XIX até a segunda metade do século XX, precisam ser preservadas. Inaugurado oficialmente em 30 de Dezembro de 1881, com a presença do Imperador D. Pedro II, trouxe para o bairro algumas melhorias como: a ampliação do comércio local, novas residências e infraestrutura. Hoje funciona uma FAETEC em parte do terreno. É um exemplo de patrimônio em risco e que precisa ser urgentemente preservado, receber investimentos e estar aberto ao público.
Com o objetivo de trazer visibilidade para estes e outros bens patrimoniais de Santa Cruz, foi criado um lindo projeto chamado “Descubra Santa Cruz”, a ideia é colocar o bairro no mapa turístico da cidade a partir das suas riquezas culturais. Andressa Lobo, criadora do projeto, nos disse que a iniciativa envolve alguns passos: 1- Levantamento e catalogação de acervo, 2- Caminhadas Culturais, 3- Coleção Patrimônios, 4- Site Descubra Santa Cruz RJ: com Tour Virtual e acervo digitalizado, 5- Livro Catálogo, 6- Coleção História de Santa Cruz para as Crianças, 7- Visitação às instituições de ensino, 8- Recepção das Escolas para o Tour (Descubra Santa Cruz RJ), 9- Concurso Literário Descubra Santa Cruz RJ, 10- Concurso Fotográfico Descubra Santa Cruz RJ, 11- Qualificação de prestadores de serviço locais e 12- Criação de Calendário Turístico para a região[3].
O movimento realiza Caminhadas Culturais por Santa Cruz, pois são as formas mais simples e direta de apresentar à população local e ao público de interesse a rica história do bairro e suas potencialidades para o turismo cultural. Realizadas sempre no terceiro final de semana de cada mês em parceria com o Núcleo de Orientação e Pesquisa Histórica de Santa Cruz (NOPH), uma associação da sociedade civil que visa realizar pesquisas, divulgar a história local, dinamizar a cultura e desenvolver campanhas de preservação dos bens culturais de Santa Cruz e de toda a Zona Oeste.
Acreditamos que por meio de iniciativas como essa podemos construir novas perspectivas para a área cultural da Zona Oeste, contribuir para a ampliação e difusão de conhecimentos e até mesmo criar novos setores ligados à economia do turismo cultural, uma forma de pensar o desenvolvimento socioeconômico local a partir das histórias e memórias da comunidade. Temos na Zona Oeste diversas potencialidades culturais: artistas, coletivos, mobilizadores que transformariam a realidade de inúmeros bairros e sub-bairros e que só precisam de políticas de fomento e de valorização.
Outro espaço pelo qual somamos à luta e queremos ver aberto para a sociedade é a Casa do Dr Silveirinha em Bangu. O Movimento Pró Casa do Silveirinha reivindica, desde 2011, que o local seja transformado em um Centro Cultural e de memória do bairro, uma forma de valorizar a história de Bangu, tendo em vista que Silveirinha foi dono da Fábrica Bangu, Presidente do Bangu Atlético Clube, fundador do estádio Moça Bonita, sendo um nome de grande significado e impacto para a história do bairro. Com mais de 250 mil habitantes, Bangu, como os demais bairros da Zona Oeste, carece de espaços culturais gratuitos que promovam para os moradores acesso às mais diversas modalidades de arte. A casa do Silveirinha pode e deve ser um espaço multiuso, educativo e democrático, mas hoje a luta é para que o espaço não seja usurpado pela especulação imobiliária.
No mês de agosto recebemos uma denúncia sobre o corte ilegal de árvores no terreno, tudo indica que para a tentativa de construir um estacionamento no local. A denúncia chegou à Secretaria de Meio Ambiente, que esteve na localidade e constatou o crime ambiental em curso. Uma das lideranças do movimento, Wladimir Mutt, esteve recentemente com o Prefeito Eduardo Paes, que prometeu fazer do lugar um centro cultural, mas até o momento nenhuma iniciativa concreta foi tomada.
Outro patrimônio de grande importância para a Zona Oeste que carece de políticas de restauração, conservação e ativação é o Parque Urbano Fazenda Viegas, em Senador Camará, bem próximo a Bangu. Datada do século XVIII, sua estrutura arquitetônica pertence ao período colonial, sendo um importante marco histórico para o desenvolvimento urbano da Zona Oeste. A fazenda, fundada pelo colonizador Manuel de Souza Viegas, se destacava pela produção de açúcar e aguardente, e se tornou em 1777 o segundo engenho açucareiro mais importante da região na freguesia de Campo Grande.
Todo o complexo produziu cana-de-açúcar por mais de 80 anos e, segundo uma reportagem do diário do Rio, “Naquele tempo, a Zona Oeste da cidade se caracterizava pela atividade canavieira e pela presença de grandes fazendas, entre as quais se destacavam, além da própria Fazenda do Viegas, a Fazenda Bangu (a maior da freguesia) e a Fazenda Piraquara. Já no século XIX, começou a se destacar na produção de café[4].”
O lugar recebeu Dom João VI, Dom Pedro I e II, que se hospedavam por lá quando se deslocavam de São Cristóvão para a fazenda Imperial de Santa Cruz. É sem dúvida um espaço de memória para estudos de história econômica, urbana e para a compreensão da formação de nossa sociedade. Agora me diz, meu amigo e minha amiga, você imagina um espaço de grandiosidade histórica como esse sendo totalmente esquecido pelo poder público e em constante degradação se estivesse na Zona Sul da cidade?
Senador Camará é um bairro pobre, marcado pelo processo de favelização e pela expansão do crime organizado por meio de facções, a comunidade local vive constantemente a negação de direitos à cultura, à educação, ao esporte/lazer e ao meio ambiente sadio, o patrimônio histórico-cultural da Fazenda Viegas deveria estar aberto, com acesso livre e gratuito, cumprindo sua função social como local de memória e história, contribuindo ao processo de ensino-aprendizagem da população da Zona Oeste. Diz pra nós, quais atividades você imagina que poderiam ser realizadas na Fazenda? Quantas formas de arte poderiam ser desenvolvidas e apresentadas para a comunidade? Morador da Zona Oeste, quais cursos você gostaria de fazer em um espaço cultural?
Exercer a imaginação sobre as inúmeras possibilidades do patrimônio é uma forma de luta e de resistência, além de alimentar nossos sonhos coletivos na esperança com o momento em que a os espaços de cultura serão de fácil acesso para as famílias da ZO. Nosso mandato está comprometido com a valorização e com a ativação de todo bem cultural da Zona Oeste, como vereador tenho fiscalizado, com a minha equipe, a infraestrutura de diversos equipamentos culturais sob a administração municipal, e a Fazenda Viegas é um patrimônio que possui centralidade nas nossas preocupações, pois está em plena destruição, sem piso e teto, com muitas pichações, sofreu muitos furtos de seus artefatos históricos e passou a ser frequentado por usuários de drogas. Esta luta é para combater a desigualdade no acesso à cultura que sempre atravessou nossa região.
Sítio Roberto Burle Marx[editar | editar código-fonte]
Você sabia que aqui na Zona Oeste, mais especificamente em Barra de Guaratiba, temos um patrimônio da humanidade reconhecido pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO)? A propriedade foi residência do paisagista Roberto Burle Marx em seus últimos 20 anos. O primeiro terreno foi comprado em 1949, após uma longa busca por espaços que unissem boa diversidade de solos, com rochas expostas, água abundante e com entorno livre da especulação imobiliária. O local também se destaca por possuir uma vegetação nativa de grande importância e diversidade: manguezais, restinga e mata atlântica.
Durante a década de 50, terrenos vizinhos foram comprados e anexados à propriedade inicial e adaptações foram realizadas para transformar o espaço em um grande laboratório de experimentações, com mais de 3.500 espécies de plantas tropicais e subtropicais organizadas em jardins e viveiros em harmonia com a vegetação nativa numa área superior a 400 mil metros quadrados. O terreno foi doado por Burle Marx ao governo federal em 1985 e desde então está vinculado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o objetivo da doação era garantir a continuação das pesquisas e a divulgação de conhecimentos para a sociedade.
Em 2021, o Sítio recebeu o título de Patrimônio da Humanidade da Unesco na 44a sessão do Comitê Patrimônio Mundial, realizada na China, e agora compõe a lista dos 23 bens brasileiros declarados como patrimônio da humanidade. É um verdadeiro orgulho para nossa região, um espaço que precisa ser valorizado, reconhecido e ainda mais visitado.
Ainda sobre a importância de olharmos com mais atenção para o patrimônio da cidade em sua totalidade, criamos o projeto de lei que torna obrigatório o desenvolvimento da Educação Patrimonial no currículo das unidades escolares de ensino fundamental da Município do Rio de Janeiro, pois entendemos que a educação patrimonial é um instrumento de alfabetização cultural que possibilita ao aluno ler o mundo a partir da herança cultural, material e imaterial, que o rodeia. Não se trata de decorar informações sobre monumentos tombados no país, mas de entender o universo sociocultural e o arco temporal em que ele está inserido. Levar a criança e o adolescente a um processo ativo de conhecimento, apropriação e valorização da memória e dos bens culturais, tanto os oficialmente patrimonializados quanto os que ainda precisam ser, passando por um processo de patrimonialização participativa e coletiva.
A Educação Patrimonial obrigatória, de forma transversal, nas diversas disciplinas da grade curricular não tem por objetivo enrijecer e inchar os conteúdos programáticos e os processos de ensino-aprendizagem, pois tal conjunto de saberes constitui-se de todos os processos educativos formais e não formais que têm como foco o Patrimônio Cultural. Para que estes patrimônios sejam apropriados socialmente como recurso e método para a compreensão social e histórica das referências culturais em todas as suas manifestações, a fim de colaborar para seu reconhecimento, sua valorização, conservação e preservação.
Vale destacar que consideramos que todos os processos educativos devem prezar pela construção coletiva e democrática dos conhecimentos, através do pleno e permanente diálogo entre os agentes culturais e sociais e pela participação ativa e efetiva das comunidades que detêm e produzem referências culturais, em que habita e convive uma diversidade de noções de Patrimônio Cultural.
É importante comentar que no Projeto de Lei Complementar 44/2021 que trata do novo Plano Diretor, há um destaque para a Educação Patrimonial. Apresenta que, devido ao seu caráter transversal, a educação patrimonial deve acompanhar todas as ações e atividades de preservação do patrimônio cultural, mas o que está no texto do Plano Diretor não estabelece normatizações para o desenvolvimento dos conhecimentos nas escolas, não apresenta a construção de uma política voltada à educação patrimonial na cidade do Rio de Janeiro.
O projeto de lei que apresentamos sobre Educação Patrimonial nas escolas tem como objetivo construir formas de aprendizagem e interpretações dos patrimônios em suas diversidades, apresentando às crianças e adolescentes as perspectivas ativas da patrimonialização de seus bairros, desenvolvendo novas referências e novas afetividades, visando combater por um lado os processos de degradação e esquecimento de certos bens e, por outro, a cenarização que totaliza os bens patrimoniais, transformando-os em meros cenários turístico-fotográficos, esvaziando-os de sua importância histórica, de seus sentidos e significados para a memória coletiva.
Para não concluir...[editar | editar código-fonte]
Não é possível estabelecer conclusões definitivas sobre um tema tão grande e dinâmico como este, que aqui abordamos. Não temos a pretensão de que este relatório seja capaz de abarcar toda complexidade, desafios e realizações dos agentes culturais da Zona Oeste. Contudo, nossa maior vontade é de que este material contribua na luta por mais direitos e garantias de acesso à cultura na região. Que seja uma fonte de visibilidade para os movimentos aqui citados e um documento de orientação para possíveis políticas públicas a serem implementadas pelo Poder Executivo. Em relação à sociedade civil, nossa intenção é de que este relatório seja um texto de possibilidades, para que o(a) leitor(a), morador(a) (ou não) da Zona Oeste tenha a oportunidade de conhecer e de se aproximar dos movimentos e coletivos culturais que atuam aqui, impulsionando também o surgimento de mais mobilizadores e fazedores de cultura em suas diversidades.
Nosso mandato quer fortalecer o debate sobre as políticas culturais e suas desigualdades na cidade do Rio de Janeiro, pois sabemos que o momento é de retrocesso social e econômico. Está em curso uma política de desmonte em diversas áreas do setor público no país e a Cultura sempre é a primeira a sofrer com cortes e desinvestimentos sucessivos. Apenas a luta, o desenvolvimento e o compartilhamento de conhecimentos são capazes de conter e enfrentar os ataques de um Governo Federal que nunca demonstrou apreço e interesse em articular e implementar ações eficazes para estimular o desenvolvimento cultural-educativo em sua amplitude.
Como disse no início deste texto, comecei minha caminhada na luta política envolvido em um coletivo que realiza inúmeras ações culturais - e, por isso, faço da cultura na Zona Oeste um tema prioritário no nosso mandato. Luto e lutarei para que mais espaços de cultura públicos sejam criados, para que mais políticas de fomento cheguem aos nossos produtores e artistas e para que nosso patrimônio histórico, material e imaterial, seja valorizado e ativado.
Para finalizar, é importante registrar que há coletivos, grupos e companhias de diversas naturezas culturais-artísticas que não apareceram neste relatório, devido às limitações de tempo, páginas ou conhecimento da nossa parte. Mas nossos dossiês continuarão sendo atualizados e ampliados e queremos muito conhecer, ouvir e ver as realizações e manifestações de outras práticas culturais da Zona Oeste. Nosso gabinete está aberto para receber a todos e todas! Nosso WhatsApp, o “Fale com Siri” - (21) 99061-3265 - também é um canal rápido e fácil de diálogo. Fale conosco! Esta caminhada só é possível e efetiva quando estamos juntos, em unidade e em constante conversa para aprimorar os instrumentos e as estratégias de luta coletiva.
Ver também[editar | editar código-fonte]
- Coletivo Piracema - Santa Cruz/RJ
- Cultura e Política nas favelas e periferias (live)
- Cultura, história e resistência na Rocinha - episódio 8 (programa)
- Cine & Rock
- ↑ Para um aprofundamento sobre os movimentos da palavra cultura em diferentes línguas e abordagens, indicamos como leitura o livro de Raymond Williams - Palavras-Chave: um vocabulário de cultura e sociedade.
- ↑ Para mais informações acessar SEDREPAHC - Ponte dos Jesuítas - Santa Cruz (rio.rj.gov.br)
- ↑ Para mais informações: https://descubrasantacruzrj.com.br/
- ↑ https://diariodorio.com/historica-fazenda-do-viegas-em-senador-camara-sofre-com-extremo-abandono/