Enchente de Acari - 2024

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

No dia 14 de janeiro de 2024, a cidade do Rio de Janeiro vivenciou uma chuva de grandes proporções que atingiu diferentes bairros da capital, em especial Irajá, Acari e Pavuna, na Zona Norte. A notícia não é inédita, visto que quase todos anos nos deparamos com eventos climáticos extremos que impõe dificuldades de diferentes ordens. Contudo, como consequência das mudanças climáticas, as chuvas extremas tem se tornado cada vez mais recorrentes e intensas, que somadas à inoperância das esferas de poder tornam os transtornos das chuvas cada vez mais perigosos, sobretudo para as favelas e periferias. É nesse contexto de mudança climática e ineficiência na manutenção de redes hídricas e espaços da superfície, que Acari, Irajá e Pavuna entraram em colapso, com 4 das 12 vitimas fatais ocorridas no estado e 20 mil casas danificadas pelas enchentes. Segundo a reportagem do G1, as enchentes não são uma novidade para os moradores da região do rio Acari, a drenagem que é demandada há décadas pelos moradores nunca foi de fato realizada e ocasiona, segundo as fontes, em alagamentos extensos em chuvas de diferentes intensidades. O rio também possui conexão com o rio Pavuna que deságua na baía de Guanabara e que também registrou transtornos. Esses dois rios confluem os demais rios e canais menores dos bairros adjacentes que não suportaram a chuva e o pouco investimento na reparação das redes de esgoto. Segundo os dados do INEA, outro fator responsável pelas enchentes é a maré alta que dificultou o escoamento da água. Nesse sentido, é possível observar essas enchentes através da interlocução de duas situações: A enchente como um problema de água em diferentes formatos e a chuva como um problema de resíduo. A enchente de 2024 como um formato da água em diferentes formas, possibilita pensar não apenas a água da chuva em níveis pluviométricos intensos, mas também a água de esgoto e a da baía de Guanabara. Enquanto a primeira é um resultado cumulativo de um processo de aquecimento e degradação do ecossistema, o segundo é fruto de uma rede de esgoto ultrapassada e negligenciada pelo poder público, sobretudo em territórios de favela dessas regiões atingidas. O debate reacende discussões que demandam da prefeitura e do governo do estado, politicas publicas para as favelas que não estejam vinculadas a discursos de ordem criminalizavam, muitas vezes operados pelas forças de segurança pública. A enchente de 2024 como um problema de resíduo pode ser refletida em duas entradas: aqueles conhecidos como "lixo" e resíduos da infraestrutura de canalização que demandam reparações há anos. O primeiro é recorrentemente utilizado como objeto para responsabilizar moradores pelos danos da infraestrutura hídrica. Contudo, não é incomum as críticas acerca da pouca atividade de coleta e tratamento desses resíduos. Ainda assim, o poder executivo, através dos veículos de informação, condicionou as enchentes a poluição produzida por moradores. Já os demais resíduos indicam a pouca efetividade das politicas públicas. O rio Acari e o rio Pavuna que transbordaram e causaram a enchente de janeiro, já haviam sido citados na CPI das Enchentes em 2019, como locais em estágio crítico que demandavam reparações emergenciais. Segundo moradores, planos de de desassoreamento e de ampliação para o escoamento nunca foram de fato implementadas, apenas nos bairros anteriores onde o rio possui dimensões maiores. A chuva que deixou Acari, Pavuna e Irajá em estágio de calamidade é evidentemente um somatório de situações que evidenciam uma disputa de narrativas acerca das favelas do Rio de Janeiro. Por trás das narrativas que culpabilizam moradores de periferias e favelas, há obras estagnadas e redes de esgoto ultrapassadas.