Espaço urbano e a questão étnico racial no Rio de Janeiro

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

Estudo relacionado ao curso Clássicos e contemporâneos sobre favelas, realizado no âmbito do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. O curso teve objetivo de debater o lugar das favelas no Rio de Janeiro, estabelecendo diálogos entre estudos clássicos e contemporâneos. Este verbete registra o debate, realizado na aula aberta voltada para o tema "Espaço urbano e questões étnico-raciais no Rio de Janeiro".

Autoria: José Eduardo.
MARIO BRUM

Sobre Mario Brum[editar | editar código-fonte]

Professor no Departamento de História - IFCH - UERJ e professor colaborador no Mestrado Profissional em Ensino de História (ProfHistória) - UERJ. Pesquisador de temas urbanos atuando principalmente nos seguintes temas: Teoria da História e Ensino de História, História do Brasil República, História Oral e História Local; questões urbanas, questão fundiária, memórias, educação, identidade e estigmas, favelas, movimentos sociais, poder público, políticas públicas, políticas para juventude.

Integra a Rede Proprietas, hoje INCT - Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, p e também o IMAM - Laboratório de Imagem, Memória, Arte e Metrópole - UFRJ.

Possui graduação em História pela Universidade Federal Fluminense (2003), mestrado em História pela Universidade Federal Fluminense (2006) e doutorado em História pela Universidade Federal Fluminense (2011), Pós Doutorado em Planejamento Urbano pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ e Pós Doutorado em Educação pela UERJ.

Foi professor das redes municipal e Estadual do Rio de Janeiro. No ensino superior, lecionou na Graduação em História da UFF , em cursos de Extensão na PUC-RJ,no GPDES-UFRJ e no Programa de Pós Graduação em Educação, Cultura e Comunicação em Periferias Urbanas da UERJ na graduação em Pedagogia da FEBF-UERJ.

(http://lattes.cnpq.br/2015880806399937)

Sobre a aula[editar | editar código-fonte]

Aula aberta com participação de Mário Brum.

O autor inicia sua discussão abordando como a questão da favela era abordada por meios de comunicação ou até mesmo meios oficiais de governo, onde ligavam diretamente o espaço a raça. Ao mesmo tempo, se utilizavam destas ligações para que pudessem lastrear políticas urbanas, que por muitas vezes tinham vieses eugenistas e segregacionistas.

Importante destacar como a segregação socioespacial é um importante elemento para que possamos entender as práticas adotadas no Rio de Janeiro ao longo dos anos. Sua peculiaridade de organização é demonstrada até os dias de hoje quando observamos a cidade do Rio de Janeiro, onde se pode deparar com áreas extremamente carentes e outras com níveis altos de desenvolvimento econômico e social, fruto da fundação de bases coloniais e racista.

Importante destacar, que o autor percebe que por muito tempo a questão racial foi deixada de lado em relação aos diferentes temas de pesquisa abordados no meio acadêmico, ou seja, as pesquisas não tinham como eixo ou como "chave de compreensão" para entender e pensar a favela (Brum, Mario; Gomes, A, 2022). Brum destaca também, como os pesquisadores norte-americanos que compreendem a questão racial dentro de suas pesquisas sobre favelas brasileiras, observando que a relação racial é importante para compreender a construção e o desenvolvimento do espaço e da sociedade brasileira e carioca.

Se o foco não é a questão racial e sua imbricação com o espaço de favela, o foco das pesquisas se davam na organização capitalista, dentro de suas variadas classes, e através de questões de desigualdades socioeconômicas. Os aspectos pegavam principalmente as ideias de desenvolvimento através da urbanização, logo a favela seria esse "não urbanizado".

Antes dos focos em favelas, já existiam as preocupações com os cortiços que eram as habitações populosas e que abrigavam pessoas mais pobres na Cidade do Rio. Os locais eram considerados imorais, insalubres e desordenadas, de forma que o governo combatia e operava em ações nesses espaços. Após 1876, com o I Congresso Internacional de Higiene, cria-se o planejamento de que o trabalhador deixasse o modo de moradia coletiva, para o modo unifamiliar (uma casa por família), indo de encontro aos métodos tidos como civilizados.

Assim como as remoções futuras, o poder publico também criou ondas de Conjuntos Habitacionais pela Cidade do Rio de Janeiro, ainda na ideia de higienização do espaço e tentativa de acabar com os espaços caracterizados como favela. Alguns exemplos foram os Parques Proletariados da Gávea e Leblon que foram construídos para abrigar removidos de favelas em áreas que eram próximas as fábricas que estavam instaladas nas localidades.

Mais tarde, a Ditadura Militar também se empenharia em fornecer força contra os espaços de favela, reconhecendo esses espaços como locais que demonstravam um atraso no Rio. Outra vez atribuindo ideias e caracteriscas criadas a partir de um pensamento racista, ligando-as a um passado de "perigo e desordem a ser superados"

Trecho transcrito da aula

(...) Nas palavras de Mario Brum

Vamos conversar sobre a questão da favela e da ausência do debate racial na academia. Como a Paloma mencionou, essa ausência é um problema real. Quando comecei a pesquisar sobre o tema, percebi que havia uma lacuna muito evidente. Durante o surgimento das favelas, era claro que esses espaços eram habitados majoritariamente por pessoas negras, e por isso eram estigmatizados e depreciados. Até os anos 60, isso era explicitamente mencionado nos documentos.

Entretanto, a partir desse período, quando a academia começou a se aprofundar mais no tema das favelas, a discussão tomou um rumo mais econômico. O foco passou a ser a desigualdade econômica, enquanto a questão racial foi sendo deixada de lado, mesmo com as melhores intenções. Com o avanço do capitalismo e a produção da cidade, a favela passou a ser vista como um problema social, mas não necessariamente como um espaço de resistência e exclusão racial.

Com a entrada de mais pessoas negras na universidade e o fortalecimento do movimento negro, essa discussão voltou a ter evidência. Hoje, é fundamental revisitar como essas duas questões – raça e desigualdade econômica – estão ligadas. Eu mesmo, na minha tese de doutorado, defendida em 2011, não mencionei essa questão racial, o que é uma falha que só percebi depois. Na época, eu fazia pesquisas na Cidade Alta, em um conjunto habitacional de ex-moradores de favelas, e entrevistei cerca de 250 pessoas. Dentre os 17 que selecionei para entrevistas mais longas, 14 eram negros, e eu, como pesquisador branco de classe média, não prestei a devida atenção a esse dado evidente.

Hoje, entendo que é preciso repensar essas questões, e que a entrada de mais pessoas negras na academia tem sido crucial para esse repensar.

Vou dividir nossa aula em três partes. A primeira será sobre o higienismo e a eugenia no século XIX, como esses pensamentos caíram sobre os cortiços e, posteriormente, sobre as favelas, associando-as a espaços de pessoas negras. A segunda parte será sobre como essa associação racial foi evidente até os anos 60 e como foi sendo deixada de lado. A última parte abordará as remoções das favelas, principalmente nos anos 60 e 70, e como isso moldou a cidade que temos hoje.

Clique aqui e assista a aula na íntegra![editar | editar código-fonte]

Referências bibliográficas[editar | editar código-fonte]

Bibliografia complementar[editar | editar código-fonte]

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Ver também[editar | editar código-fonte]