Quadrilhas juninas no Rio de Janeiro
O verbete reproduz o artigo de opinião "Quadrilha Junina x Projeto Sociocultural", que traça um breve histórico sobre as quadrilhas juninas no estado do Rio de Janeiro e a sua importância sociocultural para os territórios populares e seus moradores.
Autoria: Fábio Batista[1].
Quadrilha Junina x Projeto Sociocultural[editar | editar código-fonte]
"Primeiramente, vale citar que são pensamentos sobre o assunto e não uma verdade absoluta, mas vamos ao assunto."
Há algum tempo, em meados da década de 1980 e 1990, aqui na comunidade do Morro do Andaraí, existiam entorno de dez quadrilhas, dentre elas as mais conhecidas eram "Rompeu Aurora" e "Largo da Paz" que depois de um longo recesso voltou como "Dança e Paz", já participando dos concursos oficiais de Federação[2].
Na época a comunidade tinha um "Tráfico de Droga" com grande poder aquisitivo, também muito ativo no "Incentivo a Cultura", pois não é novidade pra ninguém que ações culturais locais daquela época eram financiadas por rateio de moradores ou candidatos políticos ou na sua maioria era pelos "Caras"[3]. Contudo, as quadrilhas ainda sim sempre tiveram suas dificuldades financeiras e também de circulação, a nível de transporte, mas a bem da verdade para aquela época de abandono total do Estado nas comunidades não havia nada que o tráfico não resolveria.
As quadrilhas saiam de uma comunidade para outra e assim criavam laços de amizades e conhecimento entorno da "Geografia" da sua própria cidade, pois cada lugar visitado gerava um "Conhecimento". Eu mesmo gostava da famosa frase: "Você sabia que aqui tinha?"" Que aqui era?" "Que foi aqui que...". Então, boa parte da minha infância e adolescência passei circulando por aí com a quadrilha "Largo da Paz", pisando em diferentes territórios pela primeira vez e gerando conhecimento.
É bom citar que nesta época a Prefeitura junto às Federações organizava o Arraiá do Rio, cujo era o sonho de todo Quadrilheiro dançar na Praça da Apoteose, local das Grandes finais, na contra-mão do que aconteciam em clubes com os bailes funks de porradaria, o clima entre as quadrilhas, que as vezes compartilhavam o mesmo público, era de uma concorrência com o devido respeito ao trabalho do outro. Depois o Arraiá do Rio foi perdendo a força até terminar de vez e as quadrilhas se abrigaram nos Clubes e Ruas da Zona Norte, Zona Oeste e Baixada Fluminense.
Com a mudança de perfil do tráfico de droga e da política de segurança no inicio dos anos de 2000, as Quadrilhas Juninas também foram desaparecendo das comunidades. Aqui mesmo no Andaraí ficou só o "Dança e Paz" que também não resistiu por mais de uma década. Enquanto nas regiões citadas acima, as quadrilhas revesavam entre falências e o surgimento de novos grupos dando também novas perspectivas de propostas artísticas. Porém hoje, existem bem menos grupos Juninos ativos.
Protagonismo[editar | editar código-fonte]
Um dos ponto positivo é o "Protagonismo", pois a quadrilha proporciona a cada "Dançarino" seu momento e um reconhecimento direto do público e dos jurados, caso for em concurso, O esforço de cada um conta para o resultado positivo do geral, diferente das escolas de samba que tem um aglomerado muito maior de integrantes e facilmente os integrantes são esquecidos ou jamais vistos na visão do público ou do jurado. A sensação de pertencimento e empoderamento dos Dançarinos vão ganhando força com os ensaios, com distribuição de responsabilidades, com as prévias em torneios de ensaios e apresentações particulares até chegar as apresentações oficiais.
Mobilização e geração de renda[editar | editar código-fonte]
Cito também como outro ponto a "Mobilização" e "Geração de Renda", embora pareça pequeno nosso mundo Junino, o que a nossa Cidade e seus Governantes ainda sabem pouco, que na maioria das vezes uma Quadrilha pode até mobilizar um bairro inteiro e bairros vizinhos para a organização de um grupo e em muitos casos alguns integrantes migram de bairros distante ou outros municípios para dançar em outro lugar:
- Bom geralmente os ensaios são na rua, em praças publicas, salvo os grupos que conseguem parcerias com Clubes e Escolas de Samba, isso acarreta a formação de uma platéia, candidatos a dançar e instalação de luz e som;
- Os ensaios geram lucros de lanche nas lanchonetes próximas ao local;
- A confecção de Figurinos exige contratação de mão de obra especializada, muitas vezes mães e avós que tem a costura como profissão são beneficiadas;
- Elaboração e confecção de Adereços, Elementos Cênicos e Cenários, neste caso muitos artistas anônimos tem oportunidade de apresentar seus trabalhos através das quadrilhas a exemplo de pintores, artesãos, iluminadores, além de eletricistas, bordadeiras, aderecistas, Serralheiros, Marceneiros e Técnicos de efeitos especiais pirotécnicos;
- A Mobilização é geral no sentido de faixa etária, pois a quadrilha tem uma estrutura que pode admitir desde criança a idosos, isso vai do perfil de cada quadrilha, também é admitido qualquer pessoa independente da sua Orientação Sexual, Religião, Origem, além de não estabelecer uma condição estética padrão desde raça à massa corpórea;
- A Quadrilha exige pesquisa para elaboração dos temas e enredos, com isso o trabalho em equipe é primordial para a coleta de informações que possam agregar ao desenvolvimento, as vezes a correção de um tema pode ser feito pelo professor da escola ou da Faculdade, também de um carnavalesco ou aluno de escolas de arte... mas muitas vezes a Quadrilha desenvolve um tema que ela mesmo tenha propriedade em representar.
- Bom, citei poucas coisas sobre a Quadrilha poder ser considerada um projeto Sócio-Cultural e me arrisco em dizer que ela pode ser até uma Empresa quando ela consegue concentrar todos estes serviços e produtos dentro da sua própria organização.
Responsabilidade social[editar | editar código-fonte]
Faltava dizer que temos em nossa responsabilidade, o tempo todo, o dever de manter uma tradição brasileira que por longas datas valoriza por nossos próprios bolsos a juventude da periferia, são artistas populares que na sua maioria não frequentam escolas de dança, que propõe o tempo todo um processo evolutivo desta arte, fazendo um dialogo entre o passado do folclore brasileiro e o que há de mais moderno nas danças suburbanas, não podemos esquecer que o subúrbio Carioca, Zona Oeste e a Baixada Fluminense são regiões detentoras das principais Quadrilhas do nosso Estado e que por responsabilidade destas localidades a arte de dançar Quadrilha ainda sobrevive e encanta milhares de pessoas.
Vida Longa as Quadrilhas do Rio de Janeiro e a Esperança de um olhar mais atento do Estado de Direito!
Viva São João!!!
Ver também[editar | editar código-fonte]
- Cia Folclórica Junina PoDe-C Show
- Morro do Andaraí
- Cultura e Política nas favelas e periferias (live)
- ↑ Conteúdo reproduzido pela equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco. Fonte: Texto publicado originalmente no blog Cia Folclórica PODE-C. Texto reproduzido conforme o original.
- ↑ Falo a partir destas décadas pois foi quando iniciei minha trajetória em quadrilhas juninas.
- ↑ Cito o Tráfico de Droga não como um ponto positivo para as Quadrilhas, indico que na ausência do Estado nas ações culturais ocasionou a proximidade destes "Caras' para incentivar.