Encontro Nacional pelo Direito à Cidade: mudanças entre as edições
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Edição atual tal como às 18h19min de 1 de março de 2024
O Observatório das Metrópoles e mais de 300 entidades de todo o país assumiram um compromisso histórico e estão na construção da Conferência Popular pelo Direito à Cidade, que aconteceu em junho de 2022, em São Paulo.
Autoria: Observatório das Metrópoles.
A iniciativa tem por objetivo:
- Construir democraticamente uma plataforma de lutas urbanas voltada para o combate à desigualdade social e à predação ambiental;
- Participar da redemocratização do país por meio de uma articulação nacional de agentes, atores e entidades vinculados à vida urbana e produção das cidades;
- Inserir o tema das cidades no projeto nacional a ser definido socialmente por ocasião das eleições de 2022.
Para isto, serão organizados eventos, seminários, reuniões e outras atividades preparatórias, de modo a ampliar a discussão e a construção de convergências acerca das experiências recentes, acertos e erros, novos caminhos e formas de luta e organização da vida urbana.
Sobre o evento[editar | editar código-fonte]
Estamos vivendo um período de acentuada transição. Em grande parte do mundo e também no Brasil, a desigualdade social se aprofunda com a concentração da riqueza sob hegemonia do capital financeiro. São muitos os fatores que concorrem para a formação desse cenário: as novas tecnologias que promovem desemprego estrutural e impactam relações de trabalho; o fortalecimento do neoliberalismo após a crise de 2008; o enfraquecimento dos sindicatos; os ataques à democracia, à ciência e à razão são alguns deles. Perdas históricas de direitos sociais, desmonte do Estado de Bem-estar Social e das políticas públicas também fazem parte desse processo. Some-se a isso o crescimento do racismo, do machismo e da heteronormatividade, fatores estruturais da desigualdade social, e o avanço do projeto genocida da população negra, pobre e periférica e teremos o quadro catastrófico, sob o qual incide a grave crise ambiental e a pandemia decorrente do coronavírus.
No Brasil, urbanização e industrialização ocorreram concomitantemente durante o século XX. Nesse movimento, a mentalidade escravagista manteve a dinâmica da senzala e impôs à massa da população, que se instalava nas cidades como podia, um mercado residencial discriminado e ilegal. Com parcos recursos e sem acesso às políticas públicas urbanas, essa população constituiu-se para o mercado como uma fonte farta de mão-de-obra barata. Resulta daí a construção de gigantescas periferias dispersas, em sua maioria criminalizadas e desassistidas, causando imensos impactos à vida, à saúde e ao bem estar dos mais pobres. Em contraposição, outra cidade, destinada à população branca de média e alta renda, concentrou em si os investimentos públicos e privados em favor de um mercado imobiliário especulativo e restrito, promovendo uma abissal desigualdade social. 320 anos de dependência colonial,
350 anos de trabalho escravo, cujo final nunca foi totalmente equacionado, e mais de 400 anos de hegemonia de uma economia baseada em serviços braçais de baixa remuneração e exportação de matéria-prima e produtos agropecuários conformaram as condições do nosso processo de urbanização.
Esse relevante processo de industrialização/urbanização passa por mudanças na conjuntura global atual. O Brasil vive um processo de desindustrialização e retrocesso à condição de total submissão econômica a produtos primários e agrícolas para exportação – grãos, carnes, celulose, minérios e etanol, etc. – com forte impacto na economia e na sociedade, mas também no território, no meio ambiente e nas cidades.
A experiência democrática pós ditadura de 64[editar | editar código-fonte]
Nos anos 1980 e 1990, com o impulso das lutas de trabalhadores, mulheres, negros e periféricos pela redemocratização, muitas cidades viveram experiências inovadoras - em que pese a pouca disponibilidade de recursos públicos - conhecidas como “prefeituras democrático-populares”. Movimentos sociais, pesquisadores, professores, ONGs e profissionais se organizaram e defenderam esse modelo. Dentre os muitos projetos implementados na época estavam os CIEPs (Centros Integrados de Educação Pública); CEUs (Centros de Educação Unificados); o Orçamento Participativo, com repercussão e acolhida no mundo todo; urbanização de favelas e áreas precárias; e assistência técnica à moradia social e apoio à produção habitacional por autogestão. Tais projetos assinaram um marco de esperança para a superação de uma sociedade atrasada e extremamente desigual.
A partir de 2002, políticas federais ligadas ao combate à fome, ao acesso à educação, à saúde, à água e à energia, somadas ao reajuste do salário mínimo, conseguiram diminuir a histórica desigualdade social. Os fundamentos mais estruturantes e seculares da nossa formação social, entretanto, persistiram, convivendo com a herança autoritária de uma transição democrática truncada. Não por acaso, no campo urbano, constatamos que, apesar da criação do Ministério das Cidades e de seu Conselho Nacional, das Conferências Municipais, Estaduais e Federal participativas e apesar do arcabouço legal urbanístico inovador, formado por um conjunto impressionante de leis que se seguiram à Constituição Federal de 1988 e ao Estatuto da Cidade - como as leis dos Consórcio Públicos, Fundo de Habitação de Interesse Social, Regularização Fundiária, Saneamento Básico, Mobilidade Urbana, Resíduos Sólidos, Estatuto da Metrópole, entre outras -, as cidades não romperam com a lógica da desigualdade e sucumbiram à ampliação das forças conservadoras no interior das políticas de coalizão.
Há uma visão patrimonialista e racista predominante que impede o reconhecimento e a efetivação do direito à moradia e do direito à cidade. Essa visão é reforçada por parte dos operadores do direito, que manteve distância e oposição às conquistas legais da luta popular - em especial à “função social da propriedade” - e desconhece a realidade urbana concreta. A segunda década do século XXI nos trouxe material suficiente para compreender em que medida as cidades podem combinar crescimento econômico, fruto de medidas desenvolvimentistas, e regressão nas condições de vida da classe trabalhadora.
Se as reformas pró-cidadania e justiça social foram definitivamente adiadas a partir do golpe de 2016 – reformas nas áreas fundiária, de mobilidade, saneamento ambiental, segurança pública e prisional –, um conjunto de outras reformas – corte de gastos em saúde, educação e assistência social, reforma trabalhista, reforma da previdência – aprofunda a tragédia urbana brasileira, principalmente agora, diante da ruptura com a democracia. A mal enfrentada pandemia, por sua vez, evidenciou e agravou as brutais desigualdades urbanas herdadas de séculos e ampliadas perversamente pelas reformas neoliberais e pela hegemonia financeiro-imobiliária. A política de morte promovida pelo governo Bolsonaro ampliou a miséria e o desemprego. A volta da fome, o avanço dos despejos coletivos, a intensificação da violência contra os pobres e, em particular, contra a população negra configuram um quadro de barbárie social promovido pelo projeto de poder bolsonarista. Esse projeto fortalece e consolida milícias e outras formas de crime organizado, máfias de todos os tipos que, além de ocupar os territórios que se reproduzem na ausência do Estado, passam também a ocupar as próprias instituições estatais.
Mas é preciso reconhecer também o início do retorno da mobilização cidadã capilarizada que ocupa o chão das cidades. A bem sucedida campanha DESPEJO ZERO, que em um ano construiu uma corrente vitoriosa unindo forças e articulando iniciativas em todo território nacional, é prova disso. Como ela, em todas as regiões do País, despontam iniciativas da sociedade civil: do movimento negro, de coletivos, de sindicatos, de universidades, de partidos, de movimentos de mulheres, de LGBTQIA+, de moradores de favelas, de jovens pela cultura, de luta pela moradia, de
profissionais – professoras(es), arquitetas(os), advogadas(os), engenheiros(as), médico(as), assistentes sociais - entre outros.
Há uma visão patrimonialista e racista predominante que impede o reconhecimento e a efetivação do direito à moradia e do direito à cidade. Essa visão é reforçada por parte dos operadores do direito, que manteve distância e oposição às conquistas legais da luta popular - em especial à “função social da propriedade” - e desconhece a realidade urbana concreta. A segunda década do século XXI nos trouxe material suficiente para compreender em que medida as cidades podem combinar crescimento econômico, fruto de medidas desenvolvimentistas, e regressão nas condições de vida da classe trabalhadora.
Igualdade e democracia pelo direito à cidade[editar | editar código-fonte]
Nesse momento de sobreposição de crises e regressões, é nosso papel recolocar horizontes e desbloquear o futuro que hoje se encontra interditado. É preciso fortalecer a luta pela democracia desde as cidades: nos bairros, nas escolas, nas igrejas e também nas universidades - que, nas últimas décadas, se difundiram pelo território nacional e foram obrigadas a abrir espaço para camadas populares por meio de ações afirmativas. É preciso disseminar a informação e travar a batalha de ideias, resgatar a utopia das cidades como lugar do viver juntos, como o espaço da vida em comum, onde todas e todos podem ser socialmente iguais, humanamente diferentes e livres de opressões, explorações e discriminações. Este horizonte de cidades justas é utópico, mas também realista e necessário.
É preciso, também, redirecionar os investimentos públicos para a reparação histórica e para a redistribuição das riquezas para superar o racismo, os abismos e as barbáries instaladas. Ou seja: investir de acordo com as necessidades sociais e não de acordo com interesses de rentistas fundiários/imobiliários. Para tanto, é fundamental exercitar o controle social sobre os recursos públicos, como manda o Estatuto da Cidade; denunciar e condenar as práticas criminosas daqueles que fazem da cidade um grande negócio; expandir e manter a oferta estatal e gratuita de bens e serviços públicos essenciais à efetivação dos direitos sociais; e retirar poder dos “centrões” que fazem ponte entre interesses privados e os executivos, manipulando os fundos públicos.
É imperioso reconhecer e valorizar os esforços que promovem a organização e as lutas no tecido social. É imprescindível revalorizar o trabalho cotidiano de "formiguinha", que organiza e promove as lutas localizadas que dizem respeito à realidade concreta da maioria da população. As entidades abaixo assinadas estão organizando um grande encontro nacional da sociedade civil no primeiro semestre de 2022 com a perspectiva de recolocar a luta pelo direito à cidade no centro do debate político nacional. A hora é agora.
Assinaturas[editar | editar código-fonte]
Coletivos, Organizações e Entidades que assinam a convocatória do evento (atualizado 19 de outubro de 2021).
Centro Popular de Direitos Humanos
Clínica de Direitos Humanos Luiz Gama
Clube de mães do aratù
Coletivo Urbanistas nas Ruas
COMITÊ CIDADÃO VOZ TRESPONTANA
Comitê Goiano de Direitos Humanos Dom Tomás Balduíno
COMRADIO INSTITUTO
CONAM - CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA ASSOCIAÇÕES DE
MORADORES
CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL
Cut Central única dos trabalhadores
Engenharia pela Democracia - EngD
Engenheiros Sem Fronteiras - Brasil
ETTERN/IPPUR/UFRJ - Laboratório Estado, Trabalho Território e Natureza
/ Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional / Universidade
Federal do Rio de Janeiro
Evangélicos de Esquerda
FACESP - Federação das Associações Comunitárias do Estado de São
Paulo
Federação das associações e conselhos comunitários do Piauí- FAMCC-PI
Federação das Entidades Comunitárias do Estado Amapá-Fecap
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
Federação Nacional das e dos Estudantes de Direito -FENED
FEMAB Federação MATOGROSSENSE DAS ASSOCIAÇÕES DE
MORADORES DE MORADORES DE BAIRROS
FNA Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas
Força Associativa dos Moradores de Ouro Preto
Fórum de Trabalho Social em Habitação de São Paulo
Fórum Nacional de Reforma Urbana
Forum Pós-ocupação de Habitação de Interesse Social da Região
Metropolitana de Salvador
Frente pelo Direito à Cidade de Campina Grande
Frente São Paulo pela Vida (FSPPV)
Fruto de Favela
Gaia Movimento Ecológico e Social
GEEMA - Grupo de Estudos em Educação e Meio Ambiente do RJ
Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades (Demodê)
Habitat para a Humanidade Brasil
IAB - INSTITUTO DE ARQUITETOS DO BRASIL
IAB RS
IBAM - Instituto Brasileiro de Administração Municipal
INCUBA/UNTRABALHO/UNEB
Instituto Abare Fomento a Autogestao Popular
Instituto Brasileiro de Analises Sociais e Economicas- Ibase
Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico - IBDU
Instituto Cultural e Social No Setor
Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento de Santa Catarina
Instituto de Arquitetos do Brasil Departamento da Bahia- IAB-BA
Instituto de Educação Pesquisa Extensão e Cultura-IEPEC
Instituto de Promoção e Proteção de Direitos Humanos - IPPDH
INSTITUTO EDUCAÇÃO E JUSTIÇA SOCIAL
Instituto Inrede
INSTITUTO REDES PARA O DESENVOLVIMENTO
Instituto Soma Brasil
Instituto Terra Trabalho e Cidadania-ITTC
Juntas somos revolução
LABÁ - Direito, Espaço & Política (UFRJ/UNIFESP/UFPR)
LABHAB - Laboratorio de Habitação e Assentamentos Humanos
Laboratório de Estudos das Transformações do Direito Urbanístico
Brasileiro - LEDUB
LeMetro/IFCS-UFRJ
Marcha de Mulheres Negras - SP
MCT/FACESP
Movimento comunitário trabalhista
Movimento comunitário TUDO para TODOS
Movimento das(os) Trabalhadoras(es) Sem-Teto (MTST Brasil)
Movimento de Mulheres Judias Me dê sua Mão
Movimiento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra Leste 1
Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de
Rua MNLDPSR
Movimento Nacional População de Rua-MNPR
Movimento pela Reforma Urbana do Estado de Goiás-MRU-GO
Movimento Tudo para Todos
MRT - Movimento Renda para Todos
Mstc
MTD - Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos
Najup Luiza Mahin
NAJUP Pedro Nascimento
Núcleo de Assessoria Técnica Popular da UERJ
Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Movimentos Sociais - NEMOS-
PUCSP
Núcleo de Gestão Urbana e Saúde- ENSP Fiocruz
Observatório da Mulher
Observatório das Metrópoles
Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento - ONDAS
OLGA MARIA ESTEVES CAMPISTA
Ong Ação e Cidadania
ONG ESTRUTURA-AÇÃO
Plataforma Dhesca Brasil
Plataforma Mercosul Social e Solidário-PMSS
POLIFONIA Revista Internacional da Academia Paulista de Direito
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal de Santa Catarina
REARO
REBEA- Rede Brasileira de Educação Ambiental
Rede Brasileira de Conselhos -RBdC
Rede de Mulheres Ambientalistas da América Latina - Elo Brasil
Rede de Mulheres Negras de Pernambuco
Rede Emancipa de Educação Popular
Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares - RENAP
Redes de Desenvolvimento da Maré
Reexistir LGBT
Representante de favelas do Conselho Gestor da Operação Urbana
Água Espraiada
Secretária de Estado de Transportes SETRAP
Semana social brasileira
Sindicato de Arquitetos de Santa Catarina
Sindicato dos Urbanitários da Paraíbaa- STIUPB
Somos Todos Muribeca
SOS CORPO INSTITUTO FEMINISTA PARA A DEMOCRACIA
Tendência Náutico Urgente.ECO
UMAMLAJ
Uneafro Brasil
União Brasileira de Mulheres
União das Mulheres Negra de Laranjal do Jari
Uniao de Vilas da Grande Cruzeiro
UNIÃO NACIONAL POR MORADIA POPULAR
União Por Moradia Popular - Bahia
Unificação das lutas de cortiços e moradia
Universidade da Cidadania Resiste (UC Resiste)
Opinião: Apontamentos para uma Agenda Urbana para a Conferência Popular pelo Direito à Cidade[editar | editar código-fonte]
Por Fórum Nacional da Reforma Urbana, publicado originalmente no blog do Fórum em 03 de junho de 2022.
O Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU) é uma articulação nacional que reúne movimentos populares, sociais, organizações sindicais, profissionais, não governamentais, instituições de pesquisa entre outros que vem concebendo e construindo, há quatro décadas, formulações, propostas, estratégias e ações políticas para a promoção da Reforma Urbana e o Direito à Cidade, buscando transformações estruturais nas cidades brasileiras, considerando as desigualdades, segregações e exclusões que as marcam.
O FNRU compreende a cidade como bem comum, fruto de uma produção social que é atravessada pelas dimensões de classe, gênero, raça, cultura e religião. Para o FNRU, o direito à cidade é um direito coletivo de todas as pessoas ao usufruto equitativo da cidade dentro dos princípios da justiça social e territorial, da sustentabilidade ambiental e da democracia. Ao mesmo tempo, o direito à cidade também é reconhecido pelo FNRU como o direito de recriar a cidade, onde todas as pessoas possam participar das decisões relativas à forma como a cidade será produzida e apropriada e ao modo de organizar a vida coletiva na cidade.
Nesse sentido, todas as pessoas devem ter o direito de participar no planejamento e gestão das cidades, respeitando direitos já conquistados e expressos em leis e políticas públicas, para garantir que a utilização dos recursos e a implementação de projetos urbanos sejam revertidas em benefício da coletividade, considerando todas as pessoas em suas diferenças e diversidades relativas à classe, raça, etnia, gênero, orientação sexual, cultura, religião, idade, capacidades e deficiências.
Historicamente, o FNRU tem lutado: pela gestão democrática das cidades a partir da promoção de processos decisórios participativos e do controle social das políticas e projetos urbanos; pela regulação pública do solo urbano, a partir da proposição de leis e instrumentos jurídicos, políticos e urbanísticos com a perspectiva de garantir as funções sociais da cidade e da propriedade urbana e o uso socialmente justo dos espaços urbanos; na prevenção e mediação dos conflitos fundiários urbanos para evitar os processos de despossessão e despejos; pela promoção da regularização fundiária às populações em situação de vulnerabilidade; pela universalização e defesa dos serviços públicos de saneamento ambiental; pela mobilidade urbana inclusiva, sustentável e democrática; pela justiça socioambiental; pela produção social do habitat; pela economia urbana solidária; contra as discriminações e opressões de gênero, raça, sexualidade nas cidades, entre outras causas.
Em função desta trajetória, o FNRU contribuiu diretamente para diversos avanços institucionais no campo do desenvolvimento urbano, entre eles: o Capítulo da Política Urbana na Constituição Federal; o Estatuto da Cidade – Lei 10.257/2001, com vários instrumentos para o cumprimento das funções sociais da cidade e da propriedade; novas instâncias de gestão democrática das políticas urbanas, como as Conferências e os Conselhos das Cidades; as políticas e planos de habitação, saneamento, mobilidade entre outros.
As diversas conquistas no âmbito das políticas urbanas sofreram retrocessos em função da persistência do patrimonialismo, da dominância do ideário neoliberal, da intensificação da mercantilização dos espaços urbanos, do desmonte de políticas públicas pró bem-estar e inclusivas, além da emergência de perspectivas, autoritárias e fascistas. Esses fatores associados a históricas discriminações e opressões de raça, gênero, xenofóbicas, LGBTQIA+, religiosas, culturais etc. têm contribuído para a ampliação das desigualdades e da precarização e vulnerabilidade das condições de vida nas cidades brasileiras. Tais condições foram agravadas, ainda, pelas crises social, econômica, política e crise sanitária recentes, levando à morte, à miséria e à fome parte expressiva da população brasileira.
Como enfrentar a combinação perversa entre as desigualdades estruturais e a agenda neoliberal promotora de exclusão social? Como reverter as reformas neoliberais e Emenda Constitucional NO 95 que atacam direitos trabalhistas e sociais e restringiram investimentos públicos nas políticas sociais? Como garantir a construção de políticas urbanas de estado, inclusivas e construídas de forma participativa? Quais as possibilidades de mobilização ampla de articulações, movimentos, coletivos que lutam pelo direito à cidade de alcançarem a reversão das reformas neoliberais e promoverem a construção de políticas redistributivas e inclusivas?
Como recuperar a democracia e garantir processos decisórios participativos e o controle social das políticas e projetos urbanos e dos investimentos públicos nas cidades brasileiras? Como fazer que estes investimentos sejam voltados para o enfrentamento de desigualdades históricas? Bastará a recuperação de instituições e instâncias, como os conselhos e conferências implementados no ciclo anterior e desestruturados recentemente?
Quais as alternativas para enfrentar e superar a produção capitalista desigual do espaço, acentuada no contexto ultraliberal, que promove nas cidades despejos, boiadas urbanísticas e ambientais, segregações etc. de acordo com os interesses rentistas e imobiliários? Denúncias quanto aos grandes projetos imobiliários e sobre violações de direitos serão suficientes? Tentativas de implementação dos instrumentos do Estatuto da Cidade teriam alcances significativos com o atual arranjo institucional do pacto federativo que coloca os Municípios como protagonistas da política urbana? O desenvolvimento de alguns experimentos alternativos coletivos, autogestionários e solidários nas cidades para a constituição de comuns urbanos poderia ser efetivo frente às barreiras estruturais e à perspectiva empreendedorista?
Como contestar e oferecer alternativas à propriedade privada individual, aos processos de mercantilização dos espaços das cidades e impedir a privatização das propriedades públicas? Lutar pela implementação dos instrumentos do Estatuto da Cidade para cumprimento da Função Social da Propriedade é suficiente? Iniciativas de propriedade coletiva e de termos territoriais coletivos poderão oferecer contrapontos expressivos? A constituição de comuns urbanos tem potencial para se tornar abrangente frente à visão privatizante das cidades?
Quais os meios e propostas para enfrentar as combinações entre racismo, violência e despejos nos territórios populares? Como contrapor e oferecer alternativas às políticas de militarização e repressão nesses territórios? Quais as estratégias para ampliar a atuação nos territórios populares das articulações e movimentos que lutam pelo direito à cidade e pela reforma urbana, considerando as forças atuantes nestes, como as igrejas conservadoras, milícias, facções do tráfico entre outras e que têm capilaridade? Como valorizar as iniciativas e lutas nesses territórios e articulá-las a políticas urbanas inclusivas? Quais as possibilidades de integrar alternativas para trabalho e renda, meios de vida, bem-estar e bem viver às políticas urbanas nos territórios populares? Como fortalecer e viabilizar a produção autogestionária do habitat e a economia popular solidária como opções aos moradores dos territórios populares?
Quais as formas para contestar e confrontar a criminalização dos movimentos sociais urbanos e ao mesmo tempo fortalecê-los em suas lutas? Qual a importância de construir e manter uma frente ampla de movimentos, coletivos, fóruns e redes pelo direito à cidade e na defesa da Reforma Urbana?
Como ampliar a articulação das lutas do campo e da cidade?
Como integrar as lutas pelo direito à cidade e as lutas contra as opressões, intolerâncias e discriminações de raça, gênero, LGBTQIA+, culturais, religiosas, geracionais etc. nas cidades? Como confrontar e impedir as violências relacionadas à raça e gênero, com atenção às mulheres negras e às pessoas LGBTQIA+?
Como explorar a riqueza da cultura urbana em todas as suas formas de expressão, tais como a arte na rua, música, dança, teatro, filmes e vídeos, skate, bicicleta, grafite, para mudar os valores das formas de vida e expressão nas cidades?
Quais as alternativas para a promoção da justiça socioambiental frente à combinação de mudanças climáticas, desastres e desigualdades? Como tornar as mudanças climáticas e injustiças socioambientais centrais para as lutas pela reforma urbana e pelo direito à cidade?
De que forma o combate à pobreza energética está incorporado às políticas públicas urbanas? Ações baseadas nos pilares de renda adequada, preço justo e eficiência energética são levadas em consideração? Quais as alternativas para a promoção da justiça energética e como incorporá-la às lutas pela reforma urbana e pelo direito à cidade?
Considerando o contexto da pandemia, como mobilizar a sociedade para exigir políticas e investimentos públicos que integrem a saúde pública e a assistência social com o planejamento urbano, a mobilidade, o saneamento e a habitação?
Quais as estratégias para exigir a implementação de políticas de mobilidade urbana que incentivem meios de deslocamento não poluentes e não motorizados e que garanta transportes públicos integrados de qualidade e tarifas socialmente justas?
Como reverter a mercantilização e privatização das cidades e de seus serviços (de saneamento, mobilidade etc.) e como garantir serviços públicos para a garantia da universalização do atendimento, da justiça social e do cumprimento da função social da cidade?
Como o FNRU pode contribuir para a construção de um pacto social e civilizatório amplo para garantir políticas e investimentos públicos nas cidades brasileiras para enfrentar a crise urbana e as desigualdades estruturais?