Agenda Marielle Franco

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

A Agenda Marielle Franco é um conjunto de práticas e compromissos políticos antirracistas, feministas, LGBTQIAPN+, periféricas e populares, inspiradas no legado de Marielle, para serem implementadas pelo poder público. Na construção da agenda participam coletivos, movimentos sociais e organizações da sociedade civil.

Autoria: Instituto Marielle Franco[1].
Agenda Marielle Franco 2024.

Sobre a edição 2024[editar | editar código-fonte]

A Agenda Marielle Franco 2024 foi construída entre Março e Agosto de 2024, a partir da adequação da Agenda 2022 para a realidade do Legislativo municipal. Para as candidaturas do Executivo, lançamos uma Carta-compromisso, construída através desta mesma metodologia e que pode ser consultada aqui.

O objetivo deste trabalho se consistiu em:

1) fortalecer e potencializar a Agenda Marielle Franco como uma ferramenta propositiva e de compromisso político capaz de apresentar, em ano eleitoral, um projeto de país popular e democrático, no qual as mulheres negras e suas demandas sejam o motor de transformação social, e que em anos não eleitorais esta Agenda seja trabalhada e implementada nesses espaços de poder e tomada de decisão.

2) trazer propostas concretas que guiem a atuação legislativa da vereança e aumentem sua assertividade em termos de políticas públicas que atendam às necessidades daqueles que as elegeram, permitindo também que os movimentos sociais sejam ouvidos ativamente e participem da construção dessas políticas.

Reforçamos que exercer o cargo de vereança vai além da proposição de projetos de lei, englobando também um direcionamento ético do fazer política. Assim como fizemos em 2020 e 2022, durante a disputa eleitoral de 2024, seguimos com os aprendizados que Marielle nos deixou como horizonte, na forma das suas práticas políticas. Além disso, de modo a garantir a materialização das agendas políticas prioritárias que ela defendia, a Agenda prevê uma estratégia de acompanhamento das candidaturas que se comprometerem e forem eleitas e o fortalecimento dos mandatos de mulheres negras cis, trans e travestis, pessoas LGBTQIAPN+ e periféricas entre 2025 e 2028.

Uma das principais práticas políticas defendidas por Marielle era a construção conjunta com movimentos sociais e organizações da sociedade civil. Neste sentido, realizamos uma extensa consulta popular, com o objetivo de construir coletivamente a Agenda 2024, de modo a refletir também as atuais pautas mais urgentes e prioritárias para a sociedade civil brasileira, uma construção que, assim como nossos passos, vêm de longe.

Durante o processo de consulta, dialogamos com aproximadamente 212 movimentos sociais, organizações da sociedade civil e ativistas da Rede de Sementes do Instituto Marielle Franco que atuam nas mais variadas pautas políticas, por meio de entrevistas telefônicas, encontros virtuais e contato institucional. Os movimentos e organizações consultados foram mapeados a partir da base de contatos do Instituto Marielle Franco, a partir de um chamamento público nas redes sociais e através de divulgação pela Rede de Sementes, circulamos um formulário contendo um questionário semiestruturado para essa escuta qualificada, identificando as pautas prioritárias, o grau de articulação destes com o momento eleitoral, a concordância entre as prioridades destes movimentos e organizações com os eixos da Agenda Marielle Franco, dentre outras questões.

Logo após a etapa de escutas, foi feita a sistematização das demandas elencadas para torná-las propostas concretas de ações e políticas públicas que podem ser implementadas como caminho para a realização dos grandes objetivos programáticos traçados por estes movimentos.

Tomamos como critérios de priorização para a escolha destas propostas: 1) a urgência política; 2) sua aplicabilidade, considerando as necessidades orçamentárias, competência legislativa e articulação política necessária; e 3) o impacto direto na vida das populações mais vulnerabilizadas, com pouca ou nenhuma representatividade política e excluídas dos espaços de poder e tomada de decisão.

Por fim, foram consultadas pessoas especialistas nos temas que constituem cada um dos eixos de propostas da Agenda Marielle Franco, a fim de validar o conteúdo programático desta Agenda. Entre as especialistas consultadas em cada eixo, estão:

  1. Eixo de Justiça Econômica e Social: Luiza Batista;
  2. Eixo de Justiça Racial e Segurança Pública: Eduardo Ribeiro e Bruna Benevides;
  3. Eixo de Gênero, Sexualidade e Justiça Reprodutiva: Dhiego Monteiro, Michele Seixas, Belle Damasceno e Bruna Benevides;
  4. Eixo de Direito à cidade, à favela e periferia: Carmen Silva;
  5. Eixo de Saúde Pública, Gratuita, de Qualidade e Integral: Leonardo Peçanha;
  6. Eixo de Justiça Ambiental, Climática e Direito à terra e ao território: Jéssica Barbosa.


Nesse sentido, o esforço de elaborar essa Agenda é uma maneira de não apenas fazer valer o que Marielle acreditava, mas também potencializar as inúmeras sementes que decidiram disputar esse espaço tão hostil e violento que é a política institucional. As mulheres negras cis, trans e travestis na política foram nossa bússola neste projeto - partimos delas, privilegiando o contato com lideranças comunitárias, candidatas e intelectuais, uma vez que são as mulheres negras, em sua pluralidade, que movem e sustentam as estruturas desse país. Ao longo da pesquisa, verificamos como estes papeis se mesclam: a maior parte das candidaturas negras são importantes lideranças locais, dos mais diversos movimentos sociais do Brasil, dentre eles: movimentos em defesa dos direitos das mulheres, com atenção às especificidades das mulheres negras, das pessoas LGBTQIAPN+, com deficiência, indígenas, quilombolas, agricultoras, defensoras da educação, saúde, moradia e direitos humanos.

Ochy Curiel nos ensina que precisamos de propostas metodológicas que sejam elaboradas a partir de processos coletivos, de organizações e comunidades, para fortalecermos nossos próprios quadros analíticos, permitindo-nos, assim, buscar as melhores vias para a transformação social. Por sua vez, Thula Pires ressalta que a categoria da amefricanidade, cunhada por Lélia Gonzalez, permite o resgate a uma unidade específica propiciada pela experiência histórica comum do povo negro em diáspora. Nesse sentido, as mulheres negras não foram apenas nosso ponto de partida, mas também nosso caminho e nosso ponto de chegada: privilegiamos políticas públicas voltadas a priorizá estes grupos, pois quando suas necessidades e demandas por igualdade a nível social, econômico e cultural forem alcançadas, teremos uma sociedade de fato justa e equitativa para todas as pessoas. Como bem resume Angela Davis: “quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”.

Por fim, é importante ressaltar que as propostas que reunimos e sistematizamos aqui não constituem uma lista exaustiva. Resumir nossas aspirações e necessidades coletivas a essas propostas ainda não dá conta da tarefa histórica que temos diante de nós. Precisaremos de todas as ideias, propostas e potências que pudermos coletivamente organizar para transformar, verdadeiramente, o Brasil. Portanto, aqui estão reunidos alguns compromissos que consideramos importante ressaltar, mas entendemos que esta agenda está em permanente e contínua construção e movimento, assim como estava Marielle Franco e sua prática política. Esperamos poder continuar produzindo e divulgando versões atualizadas da Agenda Marielle, e convidamos todas as organizações, movimentos e ativistas a também seguirem elaborando e formulando suas próprias propostas.

Práticas[editar | editar código-fonte]

Uma das premissas da Agenda Marielle Franco é que o fazer político vai além da proposição de projetos de lei. Por isso, sistematizamos uma série de práticas políticas a partir da atuação de Marielle. É fazer Marielle.

  1. Diversificar talentos e cores, não burocratizar: Mulheres negras, pessoas trabalhadoras do mercado informal, moradoras de favelas e periferias, trabalhadoras rurais, a população LGB- TQIAPN+, dentre outros grupos, há anos constroem e implementam soluções para seus problemas capazes de mudar a realidade de suas vidas e suas comunidades. Os espaços legislativos devem funcionar como potencializadores e amplificadores das lutas de movimentos sociais. Afinal, quem deve dizer como transformar uma realidade, se não quem a vive diretamente todos os dias?
  2. Ampliar as alianças, não se isolar: Órgãos públicos de atendimento à população são fundamentais para efetivar nossos direitos, bem como para ajudar a fiscalizar, implementar e fazer valer políticas públicas dos municípios. Organizações sem fins lucrativos e instituições do terceiro setor que atuem na garantia de direitos sociais, econômicos e culturais, bem como na justiça racial também devem ser lidas como parceiros em potencial na atividade legislativa.
  3. Resgatar a memória, não apagar: As populações negras, quilombolas e indígenas, são o resultado de centenas de anos de esforços das suas ancestrais na luta por sobrevivência e por uma vida digna, elas sempre lideraram as disputas por condições de vida melhores e sempre nos mostraram novas formas de pensar o futuro. O reconhecimento e não apagamento daquelas que vieram antes de nós e que hoje, são referências na construção e implementação de modelos de mudança social, é um fator importante na construção de uma nova identidade política comum.
  4. Coletivizar os objetivos, não se apropriar: O trabalho na política possui um foco coletivo. A coletividade não se manifesta apenas pelo fato de que os benefícios das conquistas políticas atingem toda a população de um município, mas principalmente pela forma como as políticas públicas são construídas, direta ou indiretamente. O benefício de uma política, portanto, não deve ser restrito a um grupo social, ou a um grupo de eleitores, mas a toda população. Ao propor projetos ou pau- tar políticas públicas, é importante que o diálogo seja plural. Nesse sentido, características como respeito, senso de coletividade, disponibilidade para escuta e humildade são essenciais para construir políticas que atendam ao máximo de pessoas possíveis.
  5. Puxar quem quer vir, não soltar: Para ativistas e lideranças locais, a entrada na política institucional pode ser um processo violento. Se você faz parte de algum ou alguns segmentos vulnerabilizados, esse processo é ainda mais complexo e doloroso, ainda mais porque, mesmo em partidos políticos progressistas, é possível que você não encontre o acolhimento que espera e necessita nessa jornada. Por isso, ao longo de todas essas práticas, destacamos a importância de novos/ as legisladores/as se esforçarem para buscar em movimentos sociais e ativistas o olhar, cuidado e experiência que necessita para de fato empreender mudanças em seu município, sem que essas sejam em detrimento da sua segurança e saúde.
  6. Cuidar do coletivo, não abandonar: O cuidado coletivo deve estar no centro de nossas ações políticas. O ativismo em defesa dos direitos humanos e de pessoas vulnerabilizadas é um trabalho árduo e arriscado, muitas formas de violência política podem acontecer nesses espaços permeados por tensões e conflitos. O assédio entre pares, a estafa física e a própria carga psicológica de lidar com temas delicados são alguns exemplos que se reproduzem facilmente. Por essa razão, pensar em práticas de cuidado coletivo junto a quem constroi política diariamente ao seu lado é fundamental. Nossa construção política não pode estar acima de nossa saúde física e mental.
  7. Abrir as portas e janelas, não se encastelar: As campanhas e mandatos que construímos precisam ter janelas e portas abertas para quem quiser se aproximar, entrar e participar de alguma forma. Precisamos dar o exemplo prestando contas do nosso trabalho, prezando pela transparência no uso do dinheiro público, criando ferramentas de participação para a população, para os movimentos e coletivos ajudarem a priorizar e participar ativamente nas nossas construções políticas.Nosso objetivo ao entrar nos palácios do poder deve ser derrubar os muros e grades que afastam a população dos espaços de decisão. Não podemos nos acomodar com essas estruturas, afastando os pés do chão e nos encastelando distantes da população.

Agenda 2024[editar | editar código-fonte]

Edições passadas[editar | editar código-fonte]

Ver também[editar | editar código-fonte]

  1. Informações retiradas do site oficial da agenda 2024.