Reuniões comunitárias das UPPs
A realização de reuniões comunitárias, também chamadas de cafés comunitários em algumas localidades, foi uma características do modo de relação entre policiais e moradores no contexto do programa de "pacificação" de favelas. Realizadas nos primeiros anos enquanto atividades irregulares, as reuniões promovidas por comandantes de UPPs tornaram-se frequentes a partir de 2011, persistindo enquanto prática até 2016.
Autoria: Frank Andrew Davies
Sobre[editar | editar código-fonte]
A realização de reuniões comunitárias, também chamadas de cafés comunitários em algumas localidades, foi uma características do modo de relação entre policiais e moradores no contexto do programa de "pacificação" de favelas. Realizadas nos primeiros anos enquanto atividades irregulares, as reuniões promovidas por comandantes de UPPs tornaram-se frequentes a partir de 2011, persistindo enquanto prática até 2016.
O pioneiro na promoção desses eventos foi o comando da UPP Batan, que no primeiro semestre de 2011 iniciou a rotina de encontros mensais na área considerada mais exitosa entre aquelas ocupadas há mais tempo. Naquele momento a polícia militar atuava de modo ostensivo sobre essa localidade de Realengo desde fevereiro de 2009, sucedendo um período curto e violento de dominação por grupos de milicianos.
Em conversa com o comandante da UPP Batan à época, a experiência dos conselhos comunitários de segurança no seu batalhão de origem foi tomada como importante influência para a realização rotinizada desses encontros, contudo há diferenças claras entre as reuniões comunitárias das UPPs e os cafés comunitários dos conselhos de segurança pública: instituídos por lei estadual em 1999, os conselhos comunitários de segurança promovem encontros mensais em que participam representantes da polícia civil, militar e membros da sociedade civil. Circunscritos às Áreas Integradas de Segurança Pública (Aisp), tais encontros têm por objetivo estimular a participação no direito à segurança.
A influência dos “cafés comunitários” sobre as reuniões das UPP se revela no caso pioneiro do Batan não apenas por conta da sua regularidade mensal, mas também no seu formato, eventualmente com a oferta de cafés e biscoitos, mas principalmente na disposição do público frente a uma mesa composta por “autoridades”.
Contudo as "autoridades" são diferentes e a pauta do encontro também é mais ampla. Além do comando da UPP, são convidados a participar os responsáveis pela oferta local de serviços públicos e também de setor privados, e ambos são apresentados pelos comandantes enquanto "parceiros" da "pacificação" e da "comunidade". Esta, por outro lado, é representada pelos presentes e por integrantes de organizações comunitárias, como as associações de moradores.
Nem todos os comandos das UPP promoveram reuniões “comunitárias”. Entre 2013 e 2014, das 27 favelas arroladas ao projeto, apenas 12 contavam com a iniciativa desses espaços. Apesar disso, a Coordenadoria de Polícia Pacificadora, órgão diretor deste programa, emitiu em junho de 2013 uma resolução orientando todos os comandos das unidades policiais a participarem ou organizarem encontros “comunitários” com regularidade, no mínimo, trimestral.
Considerando as dinâmicas e os efeitos relacionados à promoção dessas reuniões, Davies frequentou e analisou ao longo de 2013 diferentes encontros ocorridos em 4 favelas ocupadas pela polícia "pacificadora". O quese pode concluir é que esses espaços, em seus propósitos e na teatralidade manifesta dos eventos, buscava materializar a "presença do Estado" nos territórios até então imaginados pela sua ausência. Os papéis e os cenários eram variados em cada encontro e localidade, mas ainda que sob essa heterogeneidade as reuniões comunitárias foram dotadas de formalidade e regularidade para uma performance dos ideais da “pacificação”. Além disso, apresentaram um propósito claro, ou como diria a tradição antropológica, uma “eficácia”: aproximar moradores e representantes do Estado e do setor privado no intuito de encaminhar problemas e necessidades para, a partir disso, solucioná-los. Contudo, a análise de quatro casos constatou a continuidade de um modelo de interlocução que ajustava para baixo os limites da possibilidade de participação dos moradores na esfera pública, buscando ensiná-los como reivindicar e se comportar frente a essa nova forma de vida "pacificada".
Referência bibliográfica[editar | editar código-fonte]
DAVIES, Frank Andrew. Rituais de “pacificação”: uma análise das reuniões organizadas pelos comandos das UPPs. Rev. bras. segur. pública, São Paulo, v. 8, n. 1, 24-46, Fev/Mar 2014. shorturl.at/oQWX5
Veja também[editar | editar código-fonte]
- Audiência Pública no Complexo do Alemão (2015)
- UPP: a falência de um programa para mudar a polícia
- Circuitos políticos em uma favela pacificada: Os desafios da mediação (artigo)
- Participação Pacificada
- UPP- A redução da favela a três letras: uma análise da política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro (resenha)