Vigário Geral
Vigário Geral está localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro, mais precisamente na região conhecida como Zona da Leopoldina. Este bairro histórico faz divisa com outras localidades, como Jardim América, Irajá e Parada de Lucas, além de ter fronteira com o município vizinho de Duque de Caxias. Considerado um dos bairros mais tradicionais da Leopoldina, Vigário Geral preserva características que remontam a suas origens antigas.
Autoria: Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
História[editar | editar código-fonte]
A formação do bairro de Vigário Geral está intimamente ligada à construção da linha ferroviária. Segundo registros históricos, o vigário-geral da antiga freguesia de Irajá costumava se deslocar de trem do Centro da cidade até a estação do Velho Engenho (atual Vigário Geral) e, de lá, seguia a cavalo até a sede paroquial, situada em uma igreja do século XVII que hoje fica próxima ao Cemitério do Irajá. O trajeto que ele percorria ficou conhecido como "Estrada do Vigário Geral", nome que mais tarde batizou o bairro. Com a inauguração da Avenida Brasil nos anos 1940, essa estrada foi cortada, e o trecho que a ligava a Irajá passou a se chamar Aníbal Porto.[1]
Expansão e urbanização[editar | editar código-fonte]
O primeiro loteamento em Vigário Geral ocorreu no final dos anos 1930, realizado pela Companhia Territorial do Rio de Janeiro. Na década seguinte, o bairro deu nome a uma favela que surgiu às margens da linha férrea da Leopoldina.
Em 1950, parte da antiga Fazenda Botafogo foi loteada, dando origem ao que inicialmente era um sub-bairro e hoje é o Jardim América. Já em 1966, foi inaugurado o Conjunto Habitacional Padre José de Anchieta, financiado pelo extinto Banco Nacional da Habitação (BNH), com a presença do presidente Castelo Branco. Na década de 1970, outro grande conjunto habitacional foi construído: o Conjunto Habitacional Vigário Geral.
Nesse período, o bairro, predominantemente residencial, recebeu diversas indústrias, como a Paskin Cia. Ltda. e a Freitas Leitão Ind. e Com. No entanto, devido aos impactos ambientais, as associações de moradores pressionaram pelo fechamento dessas fábricas.[1]
Origens e primeiros moradores de Vigário Geral[editar | editar código-fonte]
Os primeiros habitantes do bairro foram João 67, Pedro Amaro, Alcides e Naíldo – sendo este último uma figura fundamental para o desenvolvimento do território. Como funcionário da Estrada de Ferro Leopoldina, Naíldo incentivou a migração de ferroviários para a região e, mais tarde, fundou a Associação de Moradores de Vigário Geral, organização que desempenhou um papel crucial na luta por melhorias locais.
Por décadas, os moradores enfrentaram um grave problema: a travessia perigosa da linha férrea, que só foi resolvida com a construção de uma passarela, viabilizada graças à intervenção do Sindicato dos Ferroviários.[1]
Infraestrutura[editar | editar código-fonte]
A energia elétrica só chegou de forma regularizada ao bairro em 1984, enquanto o abastecimento de água foi implantado por meio de mutirões financiados pelos próprios moradores, demonstrando o espírito comunitário da região.[1]
Vigário Geral hoje[editar | editar código-fonte]
Atualmente, o bairro se destaca como um importante polo comercial de produtos importados, especialmente da China, como louças, plásticos, vidros e materiais escolares, tanto no varejo quanto no atacado. Seus limites são definidos pela Avenida Brasil, BR-040, Linha Vermelha e Rua Bulhões Marcial, que margeia a ferrovia.[1]
Dados do território[editar | editar código-fonte]
Identificação[editar | editar código-fonte]
- Nome: Parque Proletário de Vigário Geral
- Código no SABREN: 127
- Data de Cadastramento: 05/06/1981
- Acesso Principal: Rua Bulhões Marcial
- Complemento: 752
- Bairro: Vigário Geral
- Região Administrativa: Vigário Geral
- Região de Planehamento: Penha
- Área de Planejamento: 3
Identificação alternativa[editar | editar código-fonte]
Parque Proletário de Vigário Geral ou Vigário Geral.
Urbanização[editar | editar código-fonte]
- Situação: Em complexo
- Complexo: Vigário Lucas
- Porte: > 500 domicílios
- Grau de Urbanização: Assentamento urbanizado
- Programa de Urbanização: Favela Bairro
População e domicílios[editar | editar código-fonte]
Ano | População | Domicílios | Fonte |
---|---|---|---|
2000 | 6.804 | 1.840 | IBGE - Censo Demografico 2000 |
2010 | 7.048 | 1.777 | IBGE - Censo Demográfico 2010 |
2022 | 4.886 | 1.991 | IPP com base em IBGE - Censo Demográfico 2022 |
Documentário sobre o território[editar | editar código-fonte]
Acadêmicos de Vigário Geral[editar | editar código-fonte]
Fundada em 13 de março de 1991 por David Furtado e Hélio Cunha, a Acadêmicos de Vigário Geral surgiu a partir do bloco Carinhoso e logo se destacou como escola de samba. Sua primeira grande vitória veio com um enredo sobre o centenário de Copacabana, marcando o início de uma trajetória de ascensão. Em 1996, a escola estreou no Sambódromo pelo Grupo B, onde permaneceu até 1999.
Em 2009, a escola apresentou o enredo "Água, fonte da vida: um grito de alerta ao patrimônio da terra", mas acabou rebaixada para o então Grupo de Acesso D após uma 14ª colocação. A virada veio em 2012, quando homenageou Abdias do Nascimento, importante líder do movimento negro, falecido pouco antes do carnaval. A emocionante apresentação garantiu o 3º lugar, mas novos rebaixamentos e acessos marcaram os anos seguintes.
Em 2016, a escola conquistou o vice-campeonato da Série C, retornando à Série B no ano seguinte com o enredo "Contos do Vigário: Nasce um Trouxa a cada minuto", um trocadilho inteligente com seu nome. Em 2018, desfilou na Série B com "Dos tambores africanos ao bandoneón: Tango, um sentimento que se dança", terminando em 9º lugar.
O grande momento de glória veio em 2019, quando a escola apresentou "Mwene Kongo – O Reino Europeu na África que se tornou Folclore no Brasil", contando a história do congado no país. Com um desfile impecável, a Acadêmicos de Vigário Geral sagrou-se campeã da Série B, garantindo seu retorno à elite do carnaval em 2020, após 21 anos fora do Marquês de Sapucaí.
Na Série A, a escola manteve sua identidade crítica. Em 2020, desfilou com "O Conto do Vigário" (tema semelhante ao de 2017), abordando mentiras históricas do Brasil e encerrando com uma dura crítica ao então presidente Jair Bolsonaro, representado como um palhaço com gestos de arma. A ousadia não impediu a permanência no grupo, com um 11º lugar. Nos carnavais de 2022 e 2023, a escola repetiu a 10ª colocação, consolidando-se na série A.
Em 2024, a escola anunciou um enredo sobre festas do Maranhão, mas, um mês depois, optou por homenagear Maracanaú (CE). Em 2025, escola contratou os carnavalescos Alex Carvalho e Caio Cidrini e lançou o enredo "Ecos de um Vagalume", sobre Francisco Guimarães (Vagalume), jornalista e cronista que retratou o Rio antigo e o carnaval de rua nos séculos XIX e XX.[2]
Arte e cultura em Vigário Geral[editar | editar código-fonte]
Almas Aflitas[editar | editar código-fonte]
Na noite da Chacina de Vigário Geral (1993), Valmir do Vale Lins fez um gesto que mudaria sua trajetória: recolheu 12 mil cápsulas de balas espalhadas pelas ruas. Movido por angústia e um impulso criativo, transformou esses vestígios de violência em "Almas Aflitas" (1996), uma escultura que simbolizava a dor coletiva, Formada por três figuras humanas - um homem, uma mulher e uma criança.[3]
Inclusão Postal[editar | editar código-fonte]
Em 2004, Valmir iniciou um projeto simples: placas de mosaico para numeração de casas. O que começou como uma solução prática tornou-se o Inclusão Postal, programa que:
- Embeleza fachadas com mosaicos coloridos;
- Gera renda para moradores através da venda de peças;[3]
Instituto Musiva[editar | editar código-fonte]
Em 2010, o projeto evoluiu para o Instituto Musiva, que expandiu suas ações:
- Painéis artísticos para estações do teleférico do Complexo do Alemão;
- Oficinas de moda e acessórios (como o Tecendo Arte);
- Capacitação em empreendedorismo individual.[3]
AfroReggae[editar | editar código-fonte]
A criação do AfroReggae em 1993 foi influenciada pelas chacinas da Candelária e de Vigário Geral. A organização cultural atua na Favela de Vigário Geral, no Rio de Janeiro, por meio de projetos como o AfroGames e o Centro Cultural Waly Salomão.[4]
Atuação e projetos[editar | editar código-fonte]
Atua principalmente em Parada de Lucas, Cantagalo, Complexo do Alemão, Penha e Nova Iguaçu (RJ), além de ter um escritório em São Paulo e projetos internacionais, como em Cabo Verde.
O projeto esenvolve trabalhos em música (clássica e percussão), dança, teatro (Trupe de Teatro) e circo (Afro Circo).[3]
Projetos sociais[editar | editar código-fonte]
- Segunda Chance: Auxilia egressos do sistema prisional na reinserção no mercado de trabalho (RJ e SP).
- Mutirão AfroReggae: Apoia famílias em vulnerabilidade usando metodologia da ONU (Índice de Pobreza Multidimensional – IPM).
- Programa AfroReggae de Educação: Oferece cursos para aumentar a escolaridade de funcionários e familiares.
- Divulgação: Produz publicações, vídeos educativos e programas de TV, além de ser retratado no premiado documentário "Favela Rising" (sobre a trajetória de Anderson Sá e o impacto do AfroReggae em Vigário Geral).[3]
Estúdio de gravação para artistas locais[editar | editar código-fonte]
Vigário Geral ganhou o primeiro estúdio de gravação com tecnologia Dolby Atmos em uma favela – um projeto pioneiro que oferecerá gravações gratuitas para artistas locais. A iniciativa é do selo CrespoMusic, fruto da parceria entre o AfroReggae e a Chantilly Produções.
- Gravação e lançamento gratuitos: Jovens de favelas e periferias poderão enviar seus trabalhos pelas redes sociais do projeto, com prioridade para talentos locais. A seleção será feita pelo diretor artístico Sany Pitbull.
- Parcerias de distribuição: As músicas serão lançadas em plataformas de streaming através de acordos com a Virgin Music Brasil e a Universal Music Publishing, garantindo registro profissional.
- Estrutura: O estúdio, instalado no Centro Cultural Waly Salomão, terá equipamentos de alta tecnologia.
Os miniestúdios serão disponibilizados em outras bases do AfroGames (projeto de e-sports do AfroReggae) nas favelas Nova Holanda, Morro do Timbau (RJ) e Morro do Estado (Niterói). Nesses espaços, os artistas poderão criar demos antes da gravação definitiva em Vigário Geral.[5]
História e Memória de Vigário Geral (Livro)[editar | editar código-fonte]
"História e Memória de Vigário Geral", obra de Maria Paula Araújo, historiadora do Departamento de História da UFRJ, em parceria com Ecio Salles, ex-coordenador de pesquisa do Afro Samba, é o sexto volume da coleção Tramas Urbanas, publicada pela Aeroplano Editora sob curadoria de Heloisa Buarque de Hollanda.
O livro reconstrói a trajetória de Vigário Geral, sobretudo, a partir dos relatos emocionantes dos moradores mais antigos, conhecidos como os "Pioneiros". A iniciativa partiu de uma entrevista da professora e sua equipe de pesquisa da UFRJ com José Júnior, líder do AfroReggae, o que levou a uma colaboração próxima com Ecio Salles, então coordenador cultural do grupo. A obra possuo a contribuição essencial de residentes de Vigário Geral.
Ao percorrer momentos marcantes – desde as transformações urbanas da era Pereira Passos até o traumático episódio da Chacina de Vigário Geral –, o livro não apenas narra a história local, mas também reflete sobre o crescimento desordenado do Rio de Janeiro e suas consequências em uma sociedade marcada pela desigualdade e exclusão. [6]
Mapa[editar | editar código-fonte]
Ver também[editar | editar código-fonte]
- Chacina de Vigário Geral - 29 de agosto de 1993
- Favela-Bairro em Vigário Geral - com a voz, a comunidade (programa)
- Favela-bairro (programa)
- ↑ 1,0 1,1 1,2 1,3 1,4 WIKIPÉDIA. Vigário Geral. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Vig%C3%A1rio_Geral. Acesso em: 29 mar. 2025.
- ↑ WIKIPÉDIA. Acadêmicos de Vigário Geral. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Acad%C3%AAmicos_de_Vig%C3%A1rio_Geral. Acesso em: 29 mar. 2025.
- ↑ 3,0 3,1 3,2 3,3 3,4 MULTIRIO. Arte que brota em Vigário Geral. Disponível em: https://www.multirio.rj.gov.br/index.php/reportagens/1040-arte-que-brota-em-vigario-geral. Acesso em: 29 mar. 2025.
- ↑ AFROREGGAE. Sobre. Disponível em: https://afroreggae.org/sobre/. Acesso em: 29 mar. 2025.
- ↑ AGÊNCIA BRASIL. Favela de Vigário Geral terá estúdio para gravação de artistas locais. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-04/favela-de-vigario-geral-tera-estudio-para-gravacao-de-artistas-locais. Acesso em: 29 mar. 2025.
- ↑ Disponível em: https://www.amazon.com.br/Hist%C3%B3ria-Mem%C3%B3ria-Vig%C3%A1rio-Geral-Salles/dp/8578200039