Movimento Antimanicomial

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco
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Movimento Antimanicomial é um movimento social que luta por uma sociedade sem manicômios e aposta no cuidado em liberdade para pessoas em sofrimento mental. Seu início está ligado a luta de trabalhadores e, posteriormente, de familiares e usuários dos serviços de saúde mental, que no final dos anos 80 reivindicavam melhores condições de trabalho e denunciavam inúmeras violências e maus tratos cometidos contra indivíduos considerados loucos.

Autoria: Lais Lima e Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco.

Sobre

Movimento Antimanicomial é um movimento social que luta por uma sociedade sem manicômios e aposta no cuidado em liberdade para pessoas em sofrimento mental. Seu início está ligado a luta de trabalhadores e, posteriormente, de familiares e usuários dos serviços de saúde mental, que no final dos anos 80 reivindicavam melhores condições de trabalho e denunciavam inúmeras violências e maus tratos cometidos contra indivíduos considerados loucos.

O Movimento Antimanicomial foi um dos principais responsáveis pela transformação do modelo assistencial em saúde mental no Brasil, consolidado pela Lei 10.216/2001. Fruto de inúmeras disputas, a Lei reorienta o modelo de saúde centrado em hospitais psiquiátricos para uma rede de serviços comunitários e de portas abertas.

O Centro de Atenção Psicossocial Carlos Augusto da Silva Magal é um desses serviços, responsável por atender pessoas em sofrimento mental grave. Mantém suas portas abertas e como toda rede SUS funciona de forma regionalizada, atendendo toda população residente da Maré, Manguinhos e parte do Centro do Rio. Conta com equipe multiprofissional e trabalha em prol de um atendimento humanizado.

O Movimento Antimanicomial surgiu como uma crítica ao modelo tradicional de tratamento psiquiátrico, que historicamente se baseava no isolamento de pessoas em hospitais psiquiátricos, os chamados manicômios. Esse movimento defende a reformulação dos serviços de saúde mental, visando tratamentos mais humanos e a reintegração das pessoas com transtornos mentais à sociedade. No Brasil, esse movimento se consolidou no final do século XX e teve um papel crucial na reforma psiquiátrica do país.

Surgimento e influências

O Movimento Antimanicomial foi fortemente influenciado por várias correntes do pensamento crítico sobre a psiquiatria, como a antipsiquiatria que emergiu na Europa na década de 1960, liderada por figuras como David Cooper e Franco Basaglia. Este último foi um dos principais nomes da reforma psiquiátrica na Itália, país pioneiro na mudança do modelo manicomial, com a promulgação da Lei Basaglia em 1978, que levou ao fechamento de muitos hospitais psiquiátricos e à promoção de cuidados comunitários para pessoas com transtornos mentais[1].

No Brasil, a luta antimanicomial começou a ganhar força no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, em um contexto de reabertura democrática e crescente contestação às violações de direitos humanos que ocorriam dentro dos manicômios. A situação desses hospitais era de completa precariedade, com denúncias de tortura, tratamentos desumanos e condições sub-humanas de vida[2].

Atuação no Brasil

O Dia Nacional da Luta Antimanicomial, celebrado em 18 de maio, simboliza a mobilização que começou a se estruturar no país a partir da década de 1980. Essa data foi escolhida em memória ao Encontro dos Trabalhadores da Saúde Mental de Bauru (1987), onde foi consolidado o lema "Por uma sociedade sem manicômios". A partir daí, surgiram movimentos e redes de apoio, como o Fórum Popular de Saúde Mental e a Rede Internúcleos da Luta Antimanicomial (RENILA), que deram visibilidade às condições deploráveis dos hospitais psiquiátricos e pressionaram por mudanças.

O movimento teve um papel central na aprovação da Lei nº 10.216 de 2001, conhecida como a Lei da Reforma Psiquiátrica. Essa lei propôs a substituição progressiva dos manicômios por uma rede de serviços comunitários de saúde mental, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), e defendeu a ideia de que o tratamento das pessoas com transtornos mentais deve acontecer, sempre que possível, em seu meio social e familiar[3].

Conquistas e desafios

Entre as principais conquistas do movimento no Brasil estão:

  1. Fechamento de manicômios: Redução significativa no número de internações psiquiátricas de longa duração, com o fechamento de vários manicômios ao longo das últimas décadas.
  2. Criação dos CAPS: O desenvolvimento dos Centros de Atenção Psicossocial, que oferecem atendimento multidisciplinar e focam em reabilitação psicossocial e reintegração social dos usuários.
  3. Respeito aos direitos humanos: A luta por dignidade e respeito aos direitos das pessoas com transtornos mentais foi uma das grandes bandeiras do movimento. As práticas violentas e desumanas dentro dos manicômios foram combatidas e substituídas por abordagens baseadas em inclusão e tratamento digno[4].

No entanto, o movimento ainda enfrenta desafios, como a insuficiência de recursos destinados à saúde mental no Brasil, a falta de estrutura em algumas regiões para a implementação dos CAPS, e a persistência de um estigma social sobre a doença mental. Além disso, há uma pressão crescente para o retorno de políticas de internação em massa, especialmente em contextos de crise social e econômica.

Atuação do movimento hoje

O Movimento Antimanicomial continua ativo, organizando campanhas de conscientização, debates públicos e manifestações. Ele também atua em parcerias com associações de familiares e usuários, como a Associação Brasileira de Saúde Mental (ABRASME), para garantir que as vozes das pessoas com transtornos mentais sejam ouvidas e que seus direitos sejam respeitados. Além disso, há uma constante mobilização contra tentativas de retrocessos na política de saúde mental, como a volta de modelos manicomiais sob outros nomes ou práticas repressivas que desconsideram o bem-estar do paciente.

Assim, o Movimento Antimanicomial tem sido fundamental para a humanização dos tratamentos de saúde mental no Brasil e na luta contra o estigma e a exclusão social das pessoas com transtornos mentais. As conquistas obtidas ao longo das últimas décadas são significativas, mas o movimento continua necessário diante dos desafios que a saúde mental ainda enfrenta no país.

Movimento Antimanicomial no Brasil

Ver também

Projeto Tecendo Diálogos: Grupo de Trabalho Saúde Mental e Integral

Saúde mental: jovens mareenses e o cuidado para salvar vidas

Violência policial e saúde mental - 1/3 da população favelada sente ansiedade (matéria)

  1. Basaglia, Franco. A instituição negada: relato de um hospital psiquiátrico. Rio de Janeiro: Graal, 1985.
  2. Amarante, Paulo. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1995.
  3. Brasil. Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm.
  4. Delgado, P. G. G. (Org.). A Reforma Psiquiátrica no Brasil e seus fundamentos. Brasília: MS, 2001.