Portal Viva Favela
O Portal Viva Favela, criado em julho de 2001, foi um dos primeiros veículos jornalísticos brasileiros, dedicados exclusivamente ao universo das favelas, a surgir no ambiente da internet. Na época, a própria rede mundial de computadores ainda era incipiente no Brasil e as páginas jornalísticas engatinhavam, aspecto que contribuiu para o seu ineditismo.
Autoria: Kita Pedroza (Cristina Pedroza de Faria)
Trajetória[editar | editar código-fonte]
Diversos componentes fizeram parte da trajetória desta mídia, que permaneceu ativa até por volta de 2016. Sua proposta, desde o início, foi a de se constituir como um veículo de informação capaz de influenciar a imprensa e modificar a cobertura estigmatizante dos espaços de favelas e periferias, limitada à violência armada e à criminalidade, historicamente predominante nos jornais do Rio de Janeiro. Resultado de reivindicações feitas por lideranças de favelas, em circunstâncias específicas ocorridas na década de 1990, o portal teve a sua produção de notícias elaborada, sobretudo, por pessoas que viviam nestas regiões da cidade e conheciam seus lugares de moradia como ninguém. Chamados de “correspondentes comunitários”[1], fizeram parte de uma equipe de trabalho, estruturada nos moldes de uma redação robusta de jornal, junto com jornalistas com experiência de atuação em grandes meios de informação.
Concretizado como um projeto de comunicação da organização sem fins lucrativos Viva Rio (que surge em 1993), em interlocução com líderes comunitários, jornalistas e proprietários dos principais veículos de imprensa da cidade do Rio de Janeiro, o portal atravessou distintas fases, relacionadas a fatores como a (in)disponibilidade de recursos, mudanças no processo de (auto)representação das favelas, nos perfis dos comunicadores/jornalistas locais e nas coordenações do projeto, além das rápidas transformações nas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). De acordo com Mayra Coelho Jucá dos Santos, editora e coordenadora do projeto entre 2010 e 2013,a estrutura inicial da redação de jornal, com cerca de 30 pessoas em seu auge, parou de funcionar, por falta de patrocínio, em 2006 e, entre 2010 e 2013, deu lugar ao “Viva Favela 2.0”, um modelo interativo, já característico do tempo das redes sociais, contando com uma rede ampla de “colaboradores” e “produtores de conteúdo” de diferentes estados do país (SANTOS, 2012, pg 107)[2]. A partir de meados de 2013, o vivafavela.org.br voltou a seguir um formato com uma linha editorial pré-definida, ao que parece, até 2016.
Hoje, o acervo desta última fase ainda pode ser acessado neste endereço: http://vivafavela.vivario.org.br/. Porém, lamentavelmente, o conteúdo da primeira fase parece ter sido perdido. Uma seleção de matérias pode ser encontrada no livro "Notícias da favela", escrito por Cristiane Ramalho, que foi redatora, editora chefe e coordenadora do portal entre 2001 e 2005. Publicado pela editora Aeroplano em 2007, o livro se tornou raridade, por estar esgotado, mas talvez possa ser encontrados em sebos e bibliotecas.
Embora os formatos da mídia tenham mudado ao longo de mais de uma década, o traço principal de os textos e imagens serem elaborados por moradores de favelas e periferias, foi mantido durante o funcionamento do Viva Favela. Ao longo de todo esse tempo, alguns deles passaram a coordenar este projeto.
Origens[editar | editar código-fonte]
Diferentes atores sociais que participaram da fundação do portal, bem como autores que escreveram sobre o tema, narram, à sua maneira, as origens do Viva Favela. Mas, entre todos, há o consenso de que a criação dessa mídia teve como motivação principal reinvindicações feitas por lideranças e moradores de favelas em prol da existência de um veículo de informação, de amplo alcance, que não reproduzisse a representação estigmatizada das favelas (historicamente) dominante nos veículos de imprensa, associada à criminalidade, violências e aspectos negativos da cidade. As pesquisas e apurações das jornalistas Cristiane Ramalho e Mayra Jucá - ambas editoras do portal em diferentes fases - jogam luz sobre a trajetória do portal, que também nos fala sobre a própria cidade. Conforme Cristiane, o portal nasceu pois “Eles [um grupo de líderes comunitários] queriam uma abordagem mais precisa e menos preconceituosa dessas áreas e pediram ao Viva Rio (leia-se Rubem César Fernandes, diretor executivo dessa ONG) que articulasse uma mudança nesse sentido” (pg 15) [1]. Ambas editoras reiteram que as circunstâncias dessas reivindicações envolveram a negociação do apoio de lideranças das favelas à manifestação Reage Rio, organizada pelo Viva Rio em 1995, cujo estopim foram os sequestros de três jovens de classe média no mesmo dia. A “contrapartida” da ONG, em troca do apoio, foi no sentido de que “o Viva Rio teria de ajudar a mudar a imagem da favela na mídia” (pg 47)[1]. Os donos dos maiores jornais impressos da época - Kiko Brito (Jornal do Brasil), João Roberto Marinho (O Globo), e Walter Matos Jr. (O Dia) - eram membros do conselho do Viva Rio e faziam parte da organização da mesma manifestação. Em entrevista a Cristiane, o diretor do Viva Rio, Rubem César, contou que o acordo foi feito com “o alto escalão dos jornais mais influentes da cidade” e os líderes comunitários engrossaram a passeata com moradores de suas comunidades. Somente alguns anos depois, o portal pôde entrar no ar, devido a uma convergência de fatores que propiciaram a sua estruturação em 2001, dentre eles, recursos advindos das organizações Globo e outro projeto do Viva Rio que criava as “Estações Futuro”, centros de acesso gratuito à internet em favelas da cidade.
Como editora de fotografia do portal de 2001 a 2004, aproximadamente, participei de reuniões de elaboração da linha editorial e da arquitetura da mídia (incluindo seus sites internos), anteriores ao seu lançamento. Minha voz se soma a muitas outras presentes naqueles momentos, cada qual com a sua percepção e suas diferentes lembranças. Lembro que, nas reuniões de concepção das sessões do portal, havia sempre a presença de gente que morava em alguma favela; o ponto de partida das conversas, em geral, era buscar uma cobertura “diferente da grande mídia” relativa ao universo das favelas. Guardei comigo alguns arquivos da época; compartilho um trecho, que não tem autoria, mas foi uma orientação, talvez de um conselheiro ou conselheira:
Jornalismo comunitário e linha editorial
Não existe jornalismo imparcial no Brasil nem em lugar nenhum. Não precisamos, nem devemos reproduzir essa falsa neutralidade ideológica na revista. Penso que a linha editorial deve ser discutida entre os futuros redatores, fotógrafos e um conselho editorial formado também por pessoas das comunidades. A linha editorial surgirá das histórias de vida dessas pessoas, que receberão orientação no sentido prático da linguagem jornalística, por exemplo, quanto à necessidade de as matérias atenderem aos interesses de um conjunto de cidadãos (de favelas, comunidades, conjuntos habitacionais etc) e não apenas individuais.
Características
Sem fins lucrativos - o jornalismo não está voltado para a conquista de mercado, no sentido financeiro. Procurar aproveitar o potencial comunicativo já existente, sem impor camisas de força no trato das notícias, das formas de apuração etc, diferenciando-se assim do jornalismo tradicional.
Levando-se em conta o fato de as representações dos lugares de habitação das classes pobres (e de seus moradores) como “problema” já serem comuns nos jornais do Rio de Janeiro (então capital federal) desde o início do século XX, vale lembrar que as reivindicações que deram origem ao portal tiveram relação com o contexto urbano específico da sua época, os anos 1990 – quando o mesmo tipo de representação ainda predominava (e predomina) nas principais mídias jornalísticas locais. Ao menos um aspecto foi particularmente relevante: naquela década, a cidade atravessou um período de recrudescimento da violência urbana que ganhou repercussão na imprensa regional e internacional, impactando o imaginário sobre as favelas, em larga escala, já que a a criminalidade era praticamente o único assunto noticiado sobre esses lugares. As chacinas da Candelária e de Vigário Geral, como ficaram conhecidas, ocorridas num curto espaço de tempo entre uma e outra, em 1993, perduram como as maiores marcas, sangrentas, da violência armada da década. Ambas praticadas por policiais militares, deixaram 29 pessoas mortas. Outro aspecto foi o fato de a organização Viva Rio também ter nascido nesta década, fazendo parte de um movimento de aumento significativo da atuação da chamada sociedade civil organizada (as ONGs).
No entendimento de alguns autores, a violência urbana é uma gramática, ou linguagem, “que produz uma compreensão prático-moral de boa parte da vida cotidiana nas grandes cidades” (Machado da Silva, 2010). Ainda de acordo com Luiz Antônio Machado da Silva:
(...) Minha hipótese é que ela (violência urbana) associa o uso de meios violentos à noção leiga de crime (a qual tem relação, mas não pode ser reduzida ao crime como figura do direito penal), enfatizando o quanto essa combinação ameaça permanentemente, e não apenas eventualmente, a integridade física e patrimonial das pessoas. (...) Para fechar este ponto, reitero que, ao menos no Rio de Janeiro, os “portadores” da “sociabilidade violenta” são, tipicamente (mas não exclusivamente), os bandos de traficantes responsáveis pelo funcionamento das “bocas” tendencialmente localizadas nos “territórios da pobreza”.
Márcia Leite também chama atenção para os episódios de violência armada e seu impacto sobre o imaginário social, traduzido na expressão “cidade partida”, amplamente usada na época:
Ao longo dos anos 90, entretanto, o Rio de Janeiro adquiriu o perfil de uma cidade violenta. Assassinatos, roubos, assaltos, sequestros, arrastões nas praias, brigas de jovens em bailes funk e confrontos armados entre quadrilhas rivais ou entre estas e a polícia ganharam as ruas de uma forma inusitada por sua frequência, magnitude, localização espacial, potencial de ameaça e repercussão na mídia local e nacional. (LEITE, 2000)
E segue:
Interpretando o crescimento da violência na chave da “questão social”, vários de seus analistas passaram a nomear o Rio de Janeiro como uma “cidade partida” (Ventura, 1994; Ribeiro, 1996, entre outros). Com isso, de um lado, referiam a um dilaceramento do tecido social por contradições e conflitos resultantes de um modelo de crescimento econômico e expansão urbana que alijara de seus benefícios parte considerável da população carioca. De outro, aludiam ao que vinha sendo referido pela mídia carioca como uma oposição quase irreconciliável entre as classes médias e abastadas e a população moradora nas favelas (...). (LEITE, 2000)
No que diz respeito à história do Viva Favela, o seu surgimento também se conecta ao fortalecimento das chamadas ONGs (ou organizações sem fins lucrativos) também na década de 1990. Diante de chacinas como as da Candelária e de Vigário Geral, movimentos da chamada sociedade civil organizada passaram a disputar o sentido de cidadania com o imaginário criado pelas manchetes dos principais jornais (LEITE, 2000). Foi nesse contexto que os (10) repórteres e (5) fotógrafos passaram a trazer, para um público maior, diversas histórias do seu cotidiano que não costumavam ser notícia, já que nada tinham a ver com violência armada ou ilegalidades. Com o tempo e diante da recorrente violência sofrida por moradores praticada por ações da polícia militar, este tema se tornou de suma importância e um debate que envolvia toda a redação. A diretriz tomada, de forma conjunta, foi abordar o assunto no portal de forma que não trouxesse perigo para os correspondentes, nem contribuísse para a visão estereotipada relativa às favelas, mas abordasse esses casos a partir do ponto de vista dos moradores.
Influência sobre a imprensa[editar | editar código-fonte]
Nas palavras de Cristiane Ramalho, editora do Portal em sua primeira fase (de 2001 a 2005):
Esse panorama ajuda a transformar o Viva Favela numa das principais fontes de informação sobre essas favelas. E o que parecia impossível acontece. De repente, a grande mídia começa a ser influenciada por um projeto de comunicação pequeno e independente [frente às estruturas dos grandes jornais], criado e mantido por uma ONG. Com acesso a histórias e personagens que só poderiam ser descobertas na própria favela (...), o portal oferecia aos jornalistas um atalho seguro para chegar às comunidades do Rio (RAMALHO, 2007, pg 18).
Pautas eram reproduzidas em telejornais locais, viravam assuntos de programas como o Fantástico, e foram fechadas parcerias com jornais impressos - O Dia e o Expresso - para reprodução de matérias (texto e fotos) do portal, com créditos.
Primeira fase (2001 a 2005)[editar | editar código-fonte]
Para participar do portal, "os correspondentes" passaram por um processo seletivo e, após ingressarem, tiveram um treinamento voltado para a produção de textos e fotografias. A colaboração e as trocas entre pessoas da equipe, com diferentes experiências de cidade, constituiu um processo de diálogo intenso e afetivo que contribuiu para o trabalho deslanchar. Mas os desafios também eram muitos. Um dos pontos mais difíceis foi encontrar meios para falar sobre violências sofridas por moradores das favelas, a partir da sua ótica, mas sem colocar repórteres e fotógrafos em risco. A solução acordada por todos foi designar pessoas da equipe que não moravam nesses locais para fazer estas reportagens.
Alguns exemplos de matérias: Um fabricante de instrumentos musicais cria variações de modelos tradicionais como o violão e a viola caipira, inventando novas sonoridades; crianças de dez anos estão se tornando chefes de família ajudando aos pais na difícil tarefa da sobrevivência; um grupo de modelos e um fotógrafo usam a favela como cenário para ensaios fotográficos; jovens moradores da Cidade de Deus põem a mão na massa para criar os próprios filmes e fundam a produtora Boca de Filmes; um pequeno comerciante do Complexo do Alemão constrói um parque de diversão para crianças no alto do morro; encantados com a atmosfera da Rocinha, estrangeiros abandonam a vida em países como Itália e Austrália para morar na comunidade.
Novamente, vale trazer a riqueza de detalhes sobre o dia a dia do portal, narrada por Cristiane Ramalho, recorrendo a falas dos repórteres e fotógrafos das favelas:
Ninguém sabia exatamente o que seria um 'correspondente comunitário' quando o Viva Rio começou, no início de 2001, a recrutar moradores em favelas cariocas para trabalhar no portal. Mesmo assim, a notícia soava sedutora. Atraídos pela divulgação feita com a ajuda de rádios comunitárias e de projetos e parceiros da ONG, os candidatos logo começaram a aparecer. Tinham idades, experiências profissionais e expectativas variadas. (...). Em abril, o time já estava treinado e pronto para entrar em campo. Antes disso, porém, seria preciso vencer um último obstáculo: a desconfiança. (...) Os correspondentes que começavam a entrar em campo temiam, sobretudo, revelar histórias que os colocassem em 'posição de confronto' com a comunidade. (...) Levou tempo até o projeto conquistar sua confiança. Quando começaram a relaxar, ficou claro o quanto poderiam trazer de novidade para o jornalismo carioca. Primeiro, porque tinham um conhecimento profundo daquela realidade. E, ao contrário dos repórteres 'de fora', podiam gastar dias e dias em busca de uma boa pauta. (...) Todos sempre preferiram, por exemplo, mostrar 'a favela do bem'. Era uma forma de trabalhar uma imagem diferente da que costumavam encontrar na mídia tradicional – e isso coincidia com um dos objetivos do portal. Mas era também a garantia de que não correriam risco ao andar pelas ruas com uma máquina fotográfica ou um bloquinho e uma caneta. 'Vocês colocam o pé na favela e saem correndo. A gente continua lá. Nós é que vamos ser chamados para o ‘desenrolo', costumavam dizer, nas reuniões de pauta, sempre que aparecia uma história mais quente para ser apurada'. E tinham razão. Era preciso não ultrapassar os limites de segurança. Com o assassinato do jornalista Tim Lopes, em meados de 2002, isso ficou ainda mais claro.
(...) O grande ponto de encontro dos correspondentes eram as reuniões de pauta, realizadas nas tardes de segunda-feira. No começo, eles vinham tímidos e desconfiados. Depois, bastante à vontade, criavam um clima de festa em meio ao silêncio habitual da redação do Viva Favela. (...) Os assuntos percorriam todas as editorias – comportamento, saúde, economia, cultura, polícia, educação, meio ambiente. Nem tudo o que se falava virava notícia. Mas cada tema se transformava em matéria-prima para costurarmos uma compreensão mais profunda das favelas. (...)
Não foram poucas as reuniões de pauta que provocaram crises de choro ou boas gargalhadas na equipe. Elas tinham um quê de análise de grupo – e geravam espaço para as pessoas abrirem o coração e contarem coisas que ainda não contaram para ninguém. Isso se consolidaria com o tempo – e com a conquista de uma imensa confiança entre cada um do grupo.
As inúmeras histórias contadas no portal passaram a alimentar diferentes sites internos nas áreas de memória, gênero, meio ambiente e apoio jurídico. Dentre eles, o Favela Tem Memória ganhou destaque e conquistou um encanto especial para a equipe. Não à toa: cada site era um projeto dentro do projeto maior do portal, mas o FTM era um espaço destinado, por exemplo, às longas entrevistas de história de vida, com prazo maior de entrega, feitas com pessoas mais velhas, que, ao contarem suas histórias, falavam da história do lugar do seu ponto de vista. A concepção foi feita de forma conjunta, tendo à frente as antropólogas Regina Novaes e Christina Vital, junto com o jornalista Flávio Pinheiro, em diálogo com repórteres, fotógrafos e redatores do portal. Havia três vertentes principais: a história oral, a partir dos depoimentos de moradores antigos; a memória musical, buscando encontrar, por exemplo, sambas e outras produções musicais perdidas com a morte de seus autores; e a memória iconográfica, a partir de fotografias guardadas por moradores e por meio de pesquisa em acervos de imagem públicos e privados.
Fotografia[editar | editar código-fonte]
A produção fotográfica do Viva Favela, em sua fase inicial (2001 a 2005), refletiu, em grande parte, as relações de proximidade e afetividade que a reduzida equipe de fotógrafos tinha com os seus espaços de vivência. E foi justamente esta a razão tanto da sua beleza, quanto da eficácia. Se o principal objetivo do portal era fugir do enquadramento que os grandes jornais davam às regiões de favelas e periferias, o referencial de fotojornalismo conhecido pela maioria dos habitantes desses espaços da cidade não era um bom parâmetro a ser seguido pela editoria de fotografia. Se o desafio de todos que embarcaram naquela experiência era buscar fazer diferente do modelo (ou anti-modelo) vigente de produção de informação jornalística, o primeiro passo era respeitar e valorizar os olhares que vinham de dentro, ou seja, dos fotógrafos - Deise Lane, Nando Dias, Rodrigues Moura, Tony Barros e Walter Mesquita -, carregados com as suas subjetividades e sensibilidades. Era apenas preciso conhecer um pouco mais sobre a linguagem fotográfica, de modo a poderem se expressar melhor com aquele alfabeto e, principalmente, a contarem histórias com imagens - ou criar narrativas com fotografias.
Quando perceberam que fotografar pessoas era uma maneira de estabelecer relações sociais, a equipe foi dando formas visuais a relações de respeito, cumplicidade e afetividade – nos próprios territórios ou em outros que passavam a conhecer por força do trabalho no portal. Esse foi o caminho pavimentado para criar uma forma de comunicar baseada no respeito aos direitos humanos.
Enquanto a equipe de reportagem tinha dez correspondentes de texto, havia somente cinco fotógrafos que, portanto, precisavam cobrir o dobro de pautas em relação aos seus parceiros repórteres – a própria área de moradia e mais uma. No imenso universo de favelas espalhado pelo Rio de Janeiro, a opção do portal, frente a suas limitações, havia sido fazer uma cobertura concentrada em dez áreas de favelas e periferias, nas zonas norte, sul e oeste da cidade, além da Baixada Fluminense. Não foi fácil, mas cada um (a) foi encontrando o seu caminho autoral e o trabalho de fotografia do portal passou a ganhar destaque. Passamos a participar do maior festival de fotografia da cidade, o FotoRio, e de seus encontros de "inclusão visual", além de muitas exposições. Textos e fotos eram também republicados na imprensa (com os devidos créditos).
Apesar dos recursos escassos, em termos de equipamento, foram produzidas cerca de 40 mil imagens fotográficas, nos cinco anos iniciais do portal.
Dentre os maiores reconhecimentos, em 2005, a equipe ganhou o prêmio Documentary Photography Project Distribution Grant, concedido pelo Open Society Institute, pelo conjunto do seu trabalho. Os recursos recebidos foram usados para produzir coletivamente a exposição Moro na favela, que expressou o maior desejo dos fotógrafos e das então editoras (Kita Pedroza e Sandra Delgado): retornar as imagens para os retratados. O formato criado foi uma exposição itinerante que percorreu os lugares de moradia dos fotógrafos e se auto montava nas ruas. Ou seja, cada quadro foi entregue a pessoas cujas casas ficavam de frente para as ruas, para comerciantes etc. Eles ficaram como guardiões de cada imagem; todo dia de manhã a colocavam na porta de casa, ou do comércio, e a recolhiam no fim do dia. A exposição percorreu cinco favelas da cidade.
Contribuições são bem vindas para alimentar este verbete e enriquecer as memórias dos tempos do Viva Favela!
Referências[editar | editar código-fonte]
COMUNICAÇÕES DO ISER n. 59: A memória das favelas.
DA SILVA, Luiz Antonio Machado. “Violência urbana”, segurança pública e favelas - o caso do Rio de Janeiro atual. Caderno Crh, v. 23, n. 59, p. 283-300, 2010.[3]
LEITE, Márcia Pereira. Entre o individualismo e a solidariedade: dilemas da política e da cidadania no Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 15, p. 43-90, 2000.[4]
RAMALHO, Cristiane. Notícias da favela. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2007.
SANTOS, Mayra Coelho Jucá dos. Vozes ativas das favelas 2.0: autorrepresentações midiáticas numa rede de comunicadores periféricos. Dissertação (mestrado) Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, Programa de Pós-Graduação em História Política e Bens Culturais, 2014.
Vários autores. Viva Favela. São Paulo: Editora Olhares, 2008.[5]
Ver também[editar | editar código-fonte]
- ↑ 1,0 1,1 1,2 RAMALHO, Cristiane. Notícias da favela. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2007.
- ↑ SANTOS, Mayra Coelho Jucá dos. Vozes ativas das favelas 2.0: autorrepresentações midiáticas numa rede de comunicadores periféricos. Dissertação (mestrado) Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, Programa de Pós-Graduação em História Política e Bens Culturais, 2014.
- ↑ DA SILVA, Luiz Antonio Machado. “Violência urbana”, segurança pública e favelas - o caso do Rio de Janeiro atual. Caderno Crh, v. 23, n. 59, p. 283-300, 2010.
- ↑ LEITE, Márcia Pereira. Entre o individualismo e a solidariedade: dilemas da política e da cidadania no Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 15, p. 43-90, 2000.
- ↑ Vários autores. Viva Favela. São Paulo: Editora Olhares, 2008.