Marielle Vive - Favelas na Reconstrução do País - Discussão sobre o Legado de Marielle Franco

Por equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco

O evento 'Marielle Vive!' relembra cinco anos do feminicídio político da vereadora da Maré Marielle Franco. Durante o evento, a exposição “Outras Marés” teve como objetivo retratar o Complexo da Maré através de uma lente sutil, baseada no pertencimento e mostrando um lado das favelas que a maioria dos cariocas não conhece. Foto: Priscila Silva

Autoria: Texto e fotos de Priscila Silva • 18/03/2023

Informações do verbete reproduzidas, pela Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco, a partir do site Rio On Watch (ver Referências).

Clique aqui para acessar em inglês.

Evento Marielle Vive!  Foto- Priscila Silva

O evento[editar | editar código-fonte]

Quem mandou matar Marielle?

O evento Marielle Vive! Favelas na Reconstrução do País foi realizado pelo Dicionário de Favelas Marielle Franco, em parceria com o Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (ICICT) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), na Biblioteca de Manguinhos e contou com a presença de ativistas, moradores de favelas e pessoas comprometidas com a memória da vereadora vítima de feminicídio político há cinco anos.

No dia 13 de março, dia anterior ao marco de meia década desde o assassinato da parlamentar, o encontro buscou refletir sobre o legado legislativo de Marielle e repercutir suas políticas em favor dos mais vulneráveis entre os cariocas.

Assim que chegaram ao evento, os presentes puderam conferir a exposição Outras Marés, curada por Dante Gastaldoni, que apresentou ao público “depoimentos visuais sobre as periferias, aqui entendidas em seu sentido mais amplo… Vistas assim, de dentro para fora, e permeadas por cumplicidade e afeto, as favelas e populações tradicionais se mostram pela pujança de sua arte e pela luta de sua gente para sobreviver com dignidade… Surge a esperança de estarmos em uma nova Maré, que há de varrer desigualdades e semear utopias”.

Realities of the Maré territory never seen before. Photo Priscila Silva
Exposição Outras Marés evidencia realidades não-vistas do território da Maré. Foto: Priscila Silva

O evento seguiu com exibição de vídeos de familiares, comunicadores populares e ativistas, refletindo sobre o legado de Marielle e prestando homenagens tanto à figura política de grande representatividade, quanto à grande mulher, lembrada pelos amigos pela generosidade, senso de justiça, alegria contagiante e sorriso largo, sua marca registrada.

Exposição Outras Marés traz para dentro da Biblioteca da Fiocruz a favela, a negritude e a representatividade imagética do povo de Marielle Franco, negros, de favela, pobres, mulheres e crianças. Foto: Priscila Silva

Outras Marés também apresenta ao público fotografias do Coletivo Fotografia Periferia e Memória, de autoria dos fotógrafos populares Thiago Ripper, AF Rodrigues e Ratão Diniz, dentre outros. A mostra pode ser visitada na Biblioteca da Fiocruz, até o dia 12 de abril.

Ratão Diniz reflects on the importance of grassroots communication and photography in the favelas. Photo: Priscila Silva
Ratão Diniz reflete a importância da comunicação e da fotografia populares para as favelas. Foto: Priscila Silva

A mesa de abertura contou com as participações de Sonia Fleury, coordenadora do Dicionário de Favelas Marielle Franco e pesquisadora do CEE/Fiocruz; Rodrigo Murtinho, diretor do ICICT/Fiocruz; Richarlls Martins, coordenador executivo do Plano Fiocruz de Enfrentamento à Covid-19 nas Favelas do Rio de Janeiro; Cláudia Rose, do conselho editorial do Dicionário de Favelas Marielle Franco, diretora do CEASM e coordenadora do Museu da Maré; e Cristiane Machado, Vice-Presidente de Educação e Criação da Fiocruz.

Participantes[editar | editar código-fonte]

The event ‘Marielle Lives On! Favelas Rebuilding Brazil.’ Opening panel (Sonia Fleury presents). Photo: Priscila Silva
Evento Marielle Vive! Favelas na reconstrução do país. Mesa de abertura (fala de Sonia Fleury). Foto: Priscila Silva

Sonia Fleury iniciou sua fala refletindo sobre a importância do Dicionário de Favelas e destacando as razões que levaram à sua criação.

“Foi pensado como um espaço de conhecimento sobre a favela, seja ele produzido nas universidades ou nos espaços culturais, sejam eles os saberes populares, as histórias e lutas das lideranças das favelas, para que essas informações pudessem circular e chegar ao conhecimento dos jovens que estão nos coletivos, para que eles possam acessar a história que a História não quis contar, mas que nós nos comprometemos a contar. Quando Marielle, que apoiava e era colaboradora do Dicionário, foi brutalmente silenciada por seu assassinato, nós também nos comprometemos a assumir todas as suas bandeiras, e difundi-las na luta pela democracia, contra as opressões e os assassinatos que se perpetuam constantemente nas favelas.” —  Sonia Fleury

Rodrigo Murtinho evidenciou sobre esse ter sido o primeiro evento público que o ICICT realizou em retomada das atividades presenciais desde a pandemia. Além disso, também fez questão de destacar a potência deste encontro e a presença de Renata Souza, Mônica Francisco e Monica Cunha, consideradas sementes de Marielle. Para ele, o assassinato de Marielle e o motorista Anderson Gomes significou o contrário do que desejavam os mandantes do crime.

“Vivemos um momento de reconstrução deste país e essa retomada tem tudo a ver com Marielle.” — Rodrigo Murtinho

Cláudia Rose falou sobre a importância do engajamento pessoal e coletivo. Segundo ela, devemos seguir os passos dessa mulher negra mareense. Ela torce para que a favela se posicione cada vez mais, como tem feito, disputando os lugares de poder.

“Esse país é nosso!… Desistir não faz parte da nossa proposta de vida. Se pararmos em algum momento é para ganhar força para continuar na nossa caminhada de transformação e coragem.” — Cláudia Rose

The event ‘Marielle Lives On! Favelas Rebuilding Brazil’ opening panel (Cláudia Rose presents). Photo: Priscila Silva
Evento Marielle Vive! Favelas na reconstrução do país. Mesa de abertura (fala de Cláudia Rose). Foto: Priscila Silva

Após essa sessão de falas e reflexões importantes, deu-se início à segunda mesa do dia: Da Favela ao Parlamento: Reconstruindo o Brasil. Dela participaram as parlamentares que representam o legado de Marielle no cenário político: a Deputada Estadual Renata Souza; a Vereadora Monica Cunha; e a ex-Deputada Estadual Mônica Francisco. Também compôs a mesa Saulo Benicio, presidente do PSOL-Nilópolis, cidade da Baixada Fluminense, representando a Deputada Estadual Dani Monteiro.

Renata Souza, que, assim como Marielle, é cria da Complexo da Maré, na Zona Norte da cidade, iniciou sua fala evidenciando o racismo linguístico que sofrem os moradores de favelas quando se utilizam da linguagem cotidiana dos territórios. Encarados como menos cultos, são acusados de não saber falar. Nesse cenário, ela destacou a importância do Dicionário de Favelas, que traz a linguagem deste povo preto e da periferia à dicionarização. Segundo ela, isso ajuda a quebrar os paradigmas do preconceito linguístico na nossa sociedade.

Ao refletir sobre “linguagem, narrativa e criação de discurso”, a deputada estadual reafirmou que o termo que cunhou, feminicídio político, continua sendo o melhor para caracterizar o assassinato brutal de sua amiga de longa data Marielle Franco. Renata destacou o poder de nomear as coisas.

“Nós precisamos dizer o que aconteceu com Marielle e, no campo do Direito, aquilo que não se nomeia, aquilo que não se caracteriza, nem se categoriza, não existe! Precisamos dizer que feminicídio político existe!” — Renata Souza

Ela exemplificou sua tese citando casos emblemáticos de mulheres cujos assassinatos estão diretamente relacionados às suas convicções ideológicas e atuações políticas, trazendo à tona os nomes de mulheres que desafiaram os poderes estabelecidos com sua luta por transformação social e justiça. Um exemplo foi Dorothy Stang, missionária e ativista ambiental, morta a tiros no Pará, outro foi a Juíza Patrícia Acioli, que “operou contra as milícias e foi morta pela bala do Estado, por agentes do Estado”, disse Renata. Já se encaminhando para o fim de sua fala, Renata Souza ponderou sobre a importância da construção de narrativas e de como se faz fundamental que a favela e seus comunicadores populares ocupem os espaços de produção de comunicação. Ela refletiu sobre o quanto perder o controle da produção das narrativas e dos discursos sobre nós custou caro ao nosso povo nos últimos anos, com o uso intensivo das fake news como ferramenta de engajamento online, de violência política de gênero, criminalização da pobreza e de racismo.

“A informação liberta, mas a desinformação aprisiona. E foi isso que aconteceu nos últimos cinco anos nesse país. Precisamos ter os nossos instrumentos. Eu venho da comunicação comunitária, trabalhei no jornal O Cidadão, da Maré. E para falar sobre um elemento tão sensível como é a comunicação, é fundamental dizer que, quando estamos disputando narrativas e discursos, precisamos ter instrumentos.” — Renata Souza

Com muitas homenagens e falas importantes no decorrer do evento, já perto do fim, Mônica Francisco refletiu sobre a representatividade de Marielle e sobre a importância da mulher negra de favela na reconstrução do Brasil. Ela pediu a todos que pesquisem as produções das mulheres negras nos parlamentos. Enquanto concluía sua fala, foi às lágrimas lembrando sua amiga, Marielle Franco, o que emocionou todos os presentes.

“Marielle desafiou os poderosos quando se tornou representação e voz dos invisíveis. Todos os dias eles produzem nossa inexistência. Nós trouxemos a experiência da favela para dentro do parlamento, a nossa capacidade de lidar com o melhor e com o pior. As mulheres negras são uma instituição nesse país.” — Mônica Francisco

Monica Cunha também emocionou os presentes quando afirmou que, se ela teve como referência de vida Angela Davis, mulher negra, filósofa e ativista estadunidense, no futuro, no livro e na memória da geração dos netos dela, ela própria, Monica Cunha, estará ocupando esse lugar de referência e estampando as páginas dos livros como ativista, parlamentar negra, cria do Riachuelo, subúrbio da Zona Norte, e mãe de vítima de violência do Estado. E conclui:

“Nossa função é não deixar a nossa memória e a nossa história ficar esquecida. Temos que contar nossa história, mas contar do nosso jeito!” — Monica Cunha

Cultural performance by poet Deley de Acari at ‘Marielle Lives On!’ Photo:Priscila Silva
Performance Cultural do poeta, Deley de Acari, no Evento Marielle Vive!. Foto: Priscila Silva

Em conversa com o RioOnWatch, Monica Cunha afirmou que, para ela, a memória de Marielle se concretiza na luta, como já fazem todos os dias as mulheres negras. Ela traçou um paralelo entre Marielle e seu filho, assassinado pelo Estado, Rafael da Silva Cunha. A vereadora destacou, ainda, a importância desse evento ter sido realizado na Fiocruz, em um território que está posto entre Manguinhos e o Complexo da Maré, território de Marielle, e em uma instituição de renome internacional como a Fundação Oswaldo Cruz.

“Não deixar a memória de Marielle morrer é fazer do luto luta, como fazemos nós, mulheres negras e familiares de vítimas da violência do Estado. Fazer a memória de Marielle é fazer a memória de meu filho Rafael da Silva Cunha, é dizer a todo momento que essas pessoas existiram… e ter uma instituição com esse alcance legitimando a narrativa que diz que a favela importa, que essas lutas que Marielle carregava importam, é muito importante para dar ainda mais credibilidade ao discurso que a gente sempre ecoou [sobre direitos humanos].” — Monica Cunha

Final do evento[editar | editar código-fonte]

Ontem, hoje e sempre, o grito Marielle Vive! ecoa pelas ruas do Brasil, em uma luta que busca perpetuar o legado legislativo da socióloga do Complexo da Maré. Esse grito representa movimento e renovação da esperança, apesar de serem #5AnosSemResposta e sem #JustiçaPorMarielleEAnderson, completados em 2023.

Através desse ataque frontal à democracia, os feminicidas e os mandantes do crime acreditavam que silenciariam Marielle. No entanto, não imaginavam que a vereadora se tornaria símbolo internacional, que seu legado continuaria vivo e germinando a partir de suas sementes, que se enraizaram no poder legislativo e estão florescendo na forma de políticas públicas.

Assista à gravação de Marielle Vive! Favelas na Reconstrução do País, aqui:[editar | editar código-fonte]

Dicionário de Favelas Marielle Franco convida: Marielle Vive! Favelas na Reconstrução do País

Repercussão e principais notícias[editar | editar código-fonte]

ICICT FIOCRUZ

Observatório das Metrópoles

Brasil de Fato

Portal Fiocruz

Agência Fiocruz

Outras Palavras

ANF

Agência Brasil

Diário de Pernambuco

Brasil 247

CGN Notícias

YAHOO

TV Atitude Popular

TERRA

Informa Araguaia

Estação Livre

Minuto MT

Outras Palavras

Jornal o Cidadão

CEE

Rio On Watch

Cortes TVT

Referências[editar | editar código-fonte]

Rio On Watch