ADPF 635
Este verbete trata sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, também conhecida como ADPF das Favelas, que trata da adoção de um plano para reduzir a quantidade de mortes resultantes das operações policiais no Estado do Rio de Janeiro.[1]
Autoria: Equipe do Dicionário de Favelas Marielle Franco a partir de outras fontes[1][2][3]
Sobre[editar | editar código-fonte]
A ADPF 635 aborda uma das questões mais alarmantes do Brasil: o alto índice de mortes em operações policiais nas favelas e periferias da cidade do Rio de Janeiro. A violência, impulsionada pela chamada “Guerra às Drogas”, tem deixado um rastro de mortes, dor e insegurança, afetando diretamente as populações mais vulneráveis dessas regiões.
Dentre os pedidos formulados na ADPF 635 e, deferido de forma unânime pelo STF no ano de 2022, encontra-se a elaboração e implementação, por parte do Estado, de um efetivo Plano de Redução da Letalidade Policial. Tal pedido possui lastro evidente na sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Favela Nova Brasília vs. Brasil, a qual condenou o Estado Brasileiro à elaboração do referido plano.
A ação foi proposta ao final do ano de 2019 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), e conduzida em conjunto com uma série de movimentos negros, de mães e familiares de vítimas da violência policial, de favelas, além de organizações da sociedade civil. Inicialmente inspirada na ação civil pública da Maré, proposta pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro para a adoção de protocolos que visassem a redução da letalidade policial durante as operações, a ADPF das Favelas mira a adoção de medidas estruturais que possam frear e reverter políticas de segurança pública historicamente pautadas no racismo e na violência contra territórios negros e favelados.[2]
Quem participa?[editar | editar código-fonte]
A ação é movida por diversas entidades, movimentos e coletivos na linha de frente da resistência contra a letalidade policial.
Como Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Educafro, Justiça Global, Redes da Maré, Conectas, Movimento Negro Unificado, ISER, Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial, Coletivo Papo Reto, Coletivo Fala Akari, Rede de Comunidades e Movimento contra a Violência, Mães de Manguinhos – e também o Observatório de Favelas, GENI/UFF, Maré Vive, Instituto Marielle Franco, Conselho Nacional de Direitos Humanos, o CESeC e o Movimento Mães de Maio.
Solicitações[editar | editar código-fonte]
Entendendo que as principais vítimas da violência policial no Rio de Janeiro são pessoas negras e pobres, a articulação envolvida na ação pede medidas concretas para reduzir a letalidade e garantir justiça às vítimas. Algumas das solicitações feitas foram:[1]
- A implementação e monitoramento de um plano de redução da letalidade policial com ampla participação da sociedade civil e instituições públicas comprometidas com a promoção dos direitos humanos.
- Absoluta excepcionalidade das operações policiais em perímetros em que estejam localizadas escolas, creches, hospitais e postos de saúde, e a elaboração de protocolos para atuação restrita em casos permitidos.
- Suspensão do sigilo de todos os protocolos de atuação policial e determinação da obrigatoriedade de elaborar, armazenar e disponibilizar relatórios detalhados sobre cada operação policial.
Pandemia[editar | editar código-fonte]
Na primeira liminar, em junho de 2020, Fachin determinou a suspensão de operações policiais em comunidades do estado durante a pandemia da covid-19. As operações deveriam ficar restritas a casos excepcionais e serem informadas previamente ao Ministério Público estadual para acompanhamento.
Câmeras e GPS[editar | editar código-fonte]
O relator também determinou a instalação de câmeras nas fardas e equipamentos de geolocalização (GPS) de policiais do Rio de Janeiro e a gravação em áudio e vídeo em viaturas, mesmo para equipes especializadas, como Bope e Core.
Helicópteros[editar | editar código-fonte]
Em agosto de 2020, foi confirmada nova liminar, dessa vez para restringir o uso de helicópteros nas comunidades ao casos de estrita necessidade, comprovada por relatório no final da operação. Segundo informações trazidas na ação, como um decreto estadual autoriza a utilização de helicópteros em confronto armado direto, as aeronaves estavam sendo utilizadas como plataforma de tiro.
Escolas e postos de saúde[editar | editar código-fonte]
Na mesma decisão ficou estabelecido que a realização de operações próximas de escolas, creches, hospitais ou postos de saúde é medida excepcional e deve ser justificada ao Ministério Público. Também foi proibida a utilização de escolas e postos de saúde como base operacional das polícias.
CNJ[editar | editar código-fonte]
Em abril deste ano, um grupo de trabalho do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), formado para acompanhar as ações para reduzir a letalidade policial no Rio de Janeiro, apresentou um relatório ao ministro Fachin. A conclusão foi de que a única forma de fiscalizar a atuação policial e preservar os direitos humanos é promover a transparência dos dados das investigações, ocorrências e operações policiais, sob a supervisão do Ministério Público, que tem o dever constitucional de executar o controle externo da atividade policial.
O que o Supremo Tribunal Federal decidiu até agora?[editar | editar código-fonte]
Em 2020, por conta da pandemia de covid-19, as entidades que participam do caso como amicus curiae solicitaram a suspensão liminar de todas as operações policiais não essenciais.
O STF também vetou o uso de helicópteros como plataforma de tiro, restringiu operações policiais em perímetros escolares e hospitalares, determinou a preservação dos vestígios da cena do crime e evitar remoções de corpos para a realização de perícia. No entanto, os ministros não formaram maioria para obrigar o estado do Rio de Janeiro a elaborar um plano de redução de letalidade policial e de controle de violações de direitos pelas forças de segurança fluminense.
Julgamento[editar | editar código-fonte]
O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar no dia 13 de novembro de 2024, o mérito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, que trata da adoção de um plano para reduzir a quantidade de mortes resultantes das operações policiais no Estado do Rio de Janeiro.
No julgamento, o STF irá se manifestar sobre as alegações do PSB de que a política de segurança pública do Rio de Janeiro viola princípios constitucionais como o da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais à vida, à igualdade, à segurança, à inviolabilidade do domicílio e à absoluta prioridade na garantia dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes.
Desde que a ação foi apresentada, em 2019, o STF fez diversas determinações em decisões liminares. Também foi determinado que o governo estadual elaborasse um plano para reduzir a letalidade policial.[1]
O que pode ser decidido nesse julgamento?[editar | editar código-fonte]
- Medidas de Transparência e Controle: O STF pode exigir a implementação de medidas para garantir maior transparência nas ações policiais, confirmando a obrigatoriedade de uso de câmeras, dispositivos de gravação de áudio, bem como a presença de socorristas durante as operações, dentre outras medidas já concedidas durante o julgamento das medidas cautelares nesta ação;
- Responsabilização e Investigação: Os ministros podem determinar diretrizes para investigações mais rigorosas sobre abusos e mortes em operações policiais, incluindo a obrigatoriedade de investigação independente para evitar impunidade, com especial atenção para a independência dos órgãos periciais e preservação da cadeia de custódia da prova
- Criação de Políticas Públicas Alternativas: O STF também pode instar o Estado a desenvolver políticas públicas de segurança alternativas e integradas, voltadas para a redução da violência e para ações de prevenção em vez de intervenções repressivas;
- Proteção de Grupos Vulneráveis: Como parte da decisão, o STF pode incluir medidas específicas para proteger crianças, adolescentes e outros grupos vulneráveis que frequentemente são afetados pela violência policial, incluindo a preservação de perímetros escolares e a priorização de investigações cujas vítimas sejam crianças e adolescentes;
- A obrigatoriedade de adoção, pelo Estado do Rio de Janeiro, de um plano efetivo para a redução da letalidade policial, que contemple metas específicas para esta redução. A coalizão da ADPF 635 apresentou ao Supremo Tribunal Federal diferentes parâmetros, que levariam a uma obrigatoriedade de redução da letalidade, em média, de 70%.
- A criação de mecanismos de monitoramento do plano de redução da letalidade policial e das demais políticas voltadas à garantia dos direitos humanos nas favelas, tanto no âmbito do STF quanto por meio de uma Comissão Independente de Supervisão da Atividade Policial, a ser instituída no âmbito do Conselho Nacional de Direitos Humanos
- A decisão pode ter implicações de longo alcance para o policiamento em favelas, estabelecendo um novo parâmetro para operações policiais em áreas densamente povoadas e com histórico de violência. Uma decisão favorável às limitações poderá significar uma reestruturação no modelo de segurança pública, com foco maior na proteção dos direitos humanos e na redução da letalidade policial.
Vídeos[editar | editar código-fonte]
Alguns trechos de audiências públicas ou conteúdo explicativo sobre a ADPF das Favelas:
#ADPFdasFavelas
Joel Luiz Costa
Rachel Barros
Bruna da Silva
Gizele Martins
Fransérgio Goulart
Juliana Farias
Renata Trajano
Daniel Hirata
Links externos[editar | editar código-fonte]
- ADPF das favelas: autores da ação pedem que STF rejeite plano do RJ de redução da letalidade policial
- Mesmo com ADPF das Favelas, Rio registra 61 chacinas em 2021, aponta relatório
- Em um ano de ADPF das Favelas, número de mortes e tiroteios cai no RJ, mas padrão de violência policial não muda, diz relatório